Setor moveleiro da região é o primeiro no Estado e um dos mais importantes do País, com 600 empresas e geração de cerca de 16 mil empregos
José Carlos dos Reis contou que os direitos mais básicos estão sendo desrespeitados

Sindicatos denunciam mutilações no polo moveleiro de Ubá

Situação precária dos trabalhadores foi relatada em audiência pública da Comissão de Participação Popular.

16/10/2017 - 17:55

As mutilações de 16 trabalhadores desde o início do ano são apenas a ponta de um iceberg de desrespeito aos direitos trabalhistas no polo moveleiro da região de Ubá (Zona da Mata), o primeiro do setor no Estado e um dos mais importantes do País. Esse foi o cenário apresentado nesta segunda-feira (16/10/17), em audiência pública da Comissão de Participação Popular, atendendo a requerimento do deputado Rogério Correia (PT), 1º-secretário da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

Segundo o relato dos participantes da reunião, o problema das amputações, que já era rotina no setor, ganhou contornos de epidemia, com o crescimento superior a 166%, já que em todo o ano passado seis trabalhadores perderam algum membro em acidentes de trabalho nas indústrias moveleiras da região de Ubá.

Durante a audiência foram exibidas diversas fotos com dedos, mãos e braços amputados, que constam de um dossiê feito pelo Sindicato dos Marceneiros de Ubá com trabalhadores do polo, que engloba, além dessa cidade, outros sete municípios vizinhos, totalizando mais de 600 empresas e cerca de 16 mil empregos.

Segundo o coordenador do Setor de Saúde e Segurança desse sindicato, Maximiliano Camilo Batista, as vítimas não tinham recebido nenhum tipo de treinamento e algumas estavam, mesmo no primeiro dia de trabalho, operando máquinas periogosas como a serra circular e a tupia sem nenhum equipamento ou dispositivo de segurança.

Ainda de acordo com ele, além das mutilações, neste ano já foram registrados mais de 300 atendimentos por doença ocupacional no Setor de Saúde do sindicato. No caso dos mutilados, já há inclusive relatos de abusos de drogas e risco de suicídio em função da depressão pela perda da capacidade laboral.

Abusos - No outro lado da equação estão, segundo os representantes dos dois sindicatos que representam os trabalhadores da região — além do Sindicato dos Marceneiros de Ubá, há ainda o Sindicato dos Oficiais Marceneiros de Belo Horizonte e Região —, uma série de violações de direitos que vão desde a falta de registro na carteira de trabalho e fraudes nas relações financeiras com o trabalhador, passando por subnotificação dos acidentes e até a conivência da Poder Judiciário local.

Essa “lista” de abusos foi reforçada pela presidente regiobal da Central Única dos Trabalhadores (CUT-MG), Beatriz da Silva Cerqueira, para quem é preciso mostrar as fotos dos trabalhadores mutilados para tirá-los da invisibilidade, chocar a sociedade e fazê-la acordar para o cenário preocupante que se desenha.

“Nós estamos diante da barbárie total nas relações trabalhistas. O que a reforma trabalhista fará a partir de agora é colocar como regra as situações já vividas pelos trabalhadores de Ubá”, alertou Beatriz.

Sindicalistas denunciam intimidação

O presidente do Sindicato dos Marceneiros de Ubá, José Carlos dos Reis Pereira, definiu a desigualdade na relação entre trabalhadores e empresários na região como uma questão de direitos humanos, já que, segundo ele, estão sendo desrespeitados os direitos mais básicos. Esse desrespeito, de acordo com ele, é visível tanto nas mutilações quanto, mais recentemente, no episódio de um incêndio em uma empresa em que oito trabalhadores sofreram ferimentos graves. “Até quando vamos aceitar isso em nossa cidade?”, questionou.

A intimidação dos representantes sindicais também é rotina na região, conforme relatou Luís Antônio Ferreira, da subsede de São Geraldo, município vizinho a Ubá, do Sindicato dos Oficiais Marceneiros de Belo Horizonte e Região. “Quem se filia é demitido e os diretores são perseguidos o tempo todo, inclusive com ações na Justiça comum. Temos vários relatos de assédio moral e sexual, acidentes de trabalho, mas na Justiça não temos nenhum respaldo para lutar pelo trabalhador”, lamentou.

“Nós já denunciamos situações de empresas atestadas em fiscalização pelo Ministério Público, mas o juiz decidiu contra o trabalhador. Será que alguém acredita que esse trabalhador quis mesmo enfiar a mão na máquina para cortá-la? A Justiça na região é totalmente patronal”, denunciou o secretário-geral do mesmo sindicato, Alberto Raphael Braga Neto.

Comissão vai cobrar providências

Os deputados da Comissão de Participação Popular devem fazer em breve uma visita a Ubá para verificar a situação relatada pelos sindicalistas. É o que prevê um dos requerimentos apresentados pelo deputado Rogério Correia, que comandou a reunião, a ser aprovado na próxima reunião da comissão. Os parlamentares também pretendem apoiar uma estratégia de ação conjunta a ser definida pelos dois sindicatos que atuam no polo moveleiro, inclusive para contestar algumas decisões da Justiça desfavoráveis aos trabalhadores.

De acordo com o deputado Rogério Correia, a situação dos trabalhadores na região de Ubá é reflexo de um contexto maior de perda de direitos patrocinada pelo governo do presidente Michel Temer. “Essa nefasta política de ajuste fiscal, que muitas vezes parece distante da nossa realidade, traz consequências diretas na rotina dos municípios e na vida das pessoas”, disse.

Consulte o resultado da reunião.