O Auditório ficou lotado por estudantes da 5ª série da Escola Estadual Pandiá Calógeras, de Belo Horizonte
O juiz Marcelo de Paula defendeu a igualdade entre as pessoas, independentemente do gênero

Discussão sobre violência doméstica motiva estudantes

Comissão debate avanços da Lei Maria da Penha e convidados conversam sobre o tema com alunos de escola pública.

08/08/2017 - 19:36

Durante comemoração dos 11 anos da Lei Maria da Penha (Lei Federal 11.340, de 2006), estudantes da 5ª série da Escola Estadual Pandiá Calógeras, da Capital, foram brindados com uma verdadeira aula sobre como se conscientizar sobre a importância do combate à violência contra a mulher.

A oportunidade foi oferecida pela Comissão Extraordinária das Mulheres da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), em audiência pública realizada nesta terça-feira (8/8/17).

Num auditório lotado de crianças e mulheres, o juiz Marcelo Gonçalves de Paula, da 13ª Vara Criminal, especializada em violência doméstica, sensibilizou a garotada ao tratar do assunto de forma acessível e de fácil compreensão.

Na sequência, a militante Thais Mátia, coordenadora da Casa de Referência Tina Martins, do Movimento de Mulheres Olga Benário, manteve a atenção dos estudantes ao dar um testemunho pessoal sobre violência doméstica.

A audiência debateu a situação do atendimento às vítimas de violência no contexto da Lei Maria da Penha, que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. A reunião foi solicitada pelas deputadas Marília Campos (PT), Geisa Teixeira (PT) e Celise Laviola (PMDB) e pelos deputados Elismar Prado (PDT), Tadeu Martins Leite (PMDB) e Rogério Correia (PT).

De maneira informal e bem-humorada, com exemplos simples do cotidiano, o juiz Marcelo de Paula defendeu a igualdade entre as pessoas, independentemente do gênero, com os mesmos direitos e deveres.

“Por que a Marta não pode receber o mesmo que Neymar?”, questionou o juiz. “Uma pergunta para os meninos: quem tem boneca em casa? Quem arruma a própria cama, lava louça e ajuda nos trabalhos de casa? E entre as meninas, quem aí joga bola?”. Perguntas como essas mobilizaram a jovem plateia, que reagiu de forma favorável ao que o magistrado chamou de “provocação”.

“Temos que fazer essa revolução dentro de nós. Temos que repensar o nosso comportamento”, disse. “Meninas: não se intimidem, não achem que vocês têm menos força do que os homens. Ainda precisamos evoluir muito”, concluiu.

A militante Thais Mátia também explicou, em linguagem simples, a importância da luta contra a violência doméstica e disse que a educação é fundamental. Em tom didático, falou sobre o 8 de março, Dia Internacional da Mulher. Ela disse que, se hoje se discute mais esse assunto, é porque antes, em sua maioria, elas sequer tinham consciência de que eram vítimas de crime.

Defensora propõe juizado com competência híbrida

A defensora pública Samantha Vilarinho Mello Alves, do Núcleo de Defesa dos Direitos da Mulher em Situação de Violência, ressaltou a necessidade de se estruturar um juizado com “competência híbrida”.

Segundo ela, da forma fracionada como funciona o atendimento atualmente, a vítima acaba desistindo. “São muitas as demandas. A vítima tem que fazer queixa numa delegacia, exame de corpo de delito em outra, recorrer a varas de família, numa verdadeira via crucis”, ilustrou.

A promotora Patrícia Habkouk, da 18ª Promotoria de Justiça de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, afirmou que, apesar dos dados oficiais registrarem uma redução de mais de 2% no índice de violência contra mulheres, não se percebe essa diminuição. “Precisamos avançar. Os desafios são muitos e passam, sobretudo, pela questão da violência contra a mulher negra”, disse.

Subnotificação - Defendendo a educação como caminho para a conscientização da sociedade, a delegada-chefe da Divisão Especializada de Atendimento à Mulher, Danúbia Helena Soares Quadros, disse que os números da violência doméstica não correspondem à realidade, dada a subnotificação.

Danúbia ainda destacou que a Lei Maria da Penha é a terceira mais avançada do mundo sobre o tema, só perdendo para a Espanha e o Chile, mas é necessário avançar na prevenção.

A tenente Nathália Batista Ramos, da seção de Direitos Humanos da Diretoria de Apoio Operacional da Polícia Militar, avaliou que o medo que a vítima tem de retaliação por parte do agressor ou de não ter para onde ir pode estar na origem da subnotificação. No primeiro semestre deste ano, segundo ela, 259 vítimas recusaram o atendimento do programa de proteção às mulheres.

Deputada aponta avanços e retrocessos

A presidente da comissão, deputada Marília Campos, comemorou a revogação de recomendação do Ministério Público, de 2014, e de uma portaria da Vara Cível da Infância e Juventude de Belo Horizonte, de 2016.

Essas normas obrigavam as maternidades a notificarem ao Tribunal de Justiça o atendimento a mulheres em situação de vulnerabilidade, com o consequente encaminhamento dos bebês para acolhimento institucional ou entrega a parentes.

A medida não exigiria a constatação de situações de violência ou de abandono material pela mãe, o que estaria em desacordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Ao final, a deputada também criticou as reformas trabalhista e da Previdência, alegando que elas contribuirão para “empobrecer e impactar ainda mais as mulheres, sobretudo as pobres e negras”.

Consulte o resultado da reunião.