Moradores relatam violência policial em desocupação em BH
Bombas e balas de borracha foram usadas no último domingo (18) em operação que teria sido realizada sem ordem judicial.
21/09/2016 - 15:40Restos de balas de borracha e de bombas de gás lacrimogênio e de pimenta, que teriam sido usados em ação policial no último domingo, foram apresentados nesta quarta-feira (21/9/16) por moradores da ocupação Temer Jamais, no Barreiro, em Belo Horizonte.
Junto com representantes do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), eles denunciaram, em audiência da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), que a ação de reitegração de posse da área, realizada no final de semana, foi feita sem ordem judicial e marcada pela truculência por parte da Polícia Militar (PM).
Todos os presentes criticaram o Governo do Estado pela violência da polícia e reivindicaram políticas habitacionais para a população de baixa renda. Iniciada na semana passada, a ocupação Temer Jamais, segundo os relatos feitos na reunião, foi feita por cerca de 300 famílias em terreno abandonado, que pertenceria à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH).
O coordenador nacional do MLB, Leonardo Péricles Roque, contou que um helicóptero da PM acompanhou a operação e fez voos rasantes junto à ocupação, levantando poeira e fazendo barulho para intimidar as pessoas.
O representante do movimento reclamou do que chamou de "covardia" do prefeito de Belo Horizonte pela ação e dos rumos dados ao programa federal Minha Casa, Minha Vida. "O programa já não estava tão bom, mas era praticamente o único do Brasil e agora sofreu cortes. E como ele existia, a prefeitura abandonou sua política própria", analisou o coordenador.
Leonardo relatou, ainda, que houve tortura psicológica, feita por policiais junto a moradores para levantar a ficha daqueles que se manifestaram contrários à desocupação, e que a ação em Temer Jamais repercutiu em outras ocupações localizadas nas imediações, como a Paulo Freire, que teria sido cercada pela polícia no domingo (18).
Repressão vai piorar situação
"Não é com repressão que será resolvido esse problema gravíssimo da moradia popular na cidade. Pelo contrário, isso só vai piorar", afirmou o coordenador da Comissão Pastoral da Terra (CPT), frei Gilvander Luis Moreira, pedindo "sensatez" às autoridades.
O frei explicou que a PBH não seria de fato a legítima proprietária da área, a qual faria parte de um terreno maior, composto por terras devolutas que pertenceram ao Estado. Parte dessas terras, complementou frei Gilvander, teria sido vendida à Codemig.
O advogado do MLB, Thales Viote, acrescentou que se trata de grilagem de terras que pertenciam ao Estado e que hoje, depois de anos de abandono, vêm tendo a posse reivindicada por três ou mais pessoas.
A respeito da violência policial, Thales afirmou que, pelo regulamento válido para operações do tipo, deveria ter sido assegurada a presença, durante a ação, de ambulância e de veículos do Corpo de Bombeiros, além do Conselho Tutelar, o que não teria ocorrido.
O advogado frisou que as denúncias formalizadas na audiência serão levadas também às Promotorias de Direitos Humanos e da Infância e Adolescência, à Corregedoria da PM e à Corte Interamericana de Direitos Humanos.
“Foi usado um aparato policial de guerra civil”, avaliou o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas (OAB-MG), William dos Santos, que registrou, ainda, a recusa de policiais presentes à operação em conversar, durante a ação, com representante da Promotoria de Controle Externo da Atividade Policial.
Vaias - Durante a reunião, os moradores vaiaram as ausências anunciadas: de representantes da PM, da Secretaria de Estado de Direitos Humanos e da PBH. Também foi exibido um vídeo postado na página do Facebook do deputado Rogério Correia (PT), autor do requerimento, com cenas da operação policial, que tinha barulhos de tiro, corre-corre, gritos e pessoas passando mal.
Militante do MLB, Monah Karina Elkadri declarou estar "indignada" com a operação e a situação dos sem-casa, especialmente com as crianças das ocupações, algumas delas presentes à audiência, e defendeu uma reforma urbana.
Deputado anuncia providências
Defendendo a participação do MLB em ato na Praça da Estação, em BH, nesta quinta (22), em defesa da democracia e da liberdade, o deputado Rogério Correia (PT) anunciou que pretende tomar providências por meio de requerimentos da comissão.
O parlamentar quer que o comando da PM informe os militares envolvidos na retirada das famílias da ocupação e o custo da operação, além de devolver os bens e pertences das pessoas retiradas. Ele também vai solicitar à PBH que cadastre as famílias sem moradia na cidade e vai pedir a realização de uma reunião com o presidente da ALMG, deputado Adalclever Lopes (PMDB).
O objetivo desse encontro com Adalclever Lopes é solicitar a tramitação do Projeto de Lei 3.562/16, de autoria de Rogério Correia, que dispõe sobre a elaboração do Plano Estadual de Mediação de Conflitos Coletivos Socioambientais e Fundiários Rurais e Urbanos e de Manutenção e Reintegração de Posse Coletiva.