Cultura do medo, perseguição à esquerda e direitos trabalhistas foram alguns dos assuntos abordados na audiência pública
Moradores da colônia Santa Fé protestaram conta a retirada de uma mulher grávida que morava no local

Dia Internacional da Democracia é celebrado em audiência

Participantes alertam para os riscos da ruptura democrática e pregam a resistência popular nas ruas.

15/09/2016 - 20:15

A data deveria ser de comemoração. Mas os participantes da audiência pública que lembrou o Dia Internacional da Democracia, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), lamentaram discutir o assunto na vigência do que consideram um “golpe” e pregaram a luta popular justamente para defender a democracia. A reunião, realizada nesta quinta-feira (15/9/16), pela Comissão de Direitos Humanos, teve ainda o lançamento do livro digital Resistência e Direitos Humanos, de Betinho Duarte.

A ex-secretária Especial de Políticas para as Mulheres no governo Dilma Rousseff, Eleonora Menicucci de Oliveira, destacou que o golpe continua em curso, com a instalação da cultura do medo, a perseguição à esquerda e a tentativa de tornar o ex-presidente Lula inelegível. Para ela, além de midiático e capitalista, o golpe tem também características racistas, misóginas e fundamentalistas, tornando as mulheres e as minorias mais vulneráveis.

“Para nossa geração, que lutou contra a ditadura, a situação atual é mais doída. Eu não imaginava viver para ver isso e ainda ser parte disso, de dentro do Executivo”, afirmou Eleonora, presa pelo regime militar instalado em 1964. Ela afirma, porém, que ao longo de seus 72 anos, teve apenas poucos momentos de desesperança na vida, suplantados pela luta. “A democracia pode ser ferida de morte. É momento de rua”, defendeu.

O pastor e membro da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, de São Paulo (SP), Ariovaldo Ramos, lamentou que o nome de Deus esteja sendo usado para justificar absurdos, como ocorreu durante a votação do impeachment. “A democracia é um valor caro para os cristãos e para a preservação da humanidade”, destacou. Ele disse falar por um grande número de evangélicos que não se sente representado pelos fundamentalistas no Congresso.

Citando passagens bíblicas sobre Tomé e Judas, Ariovaldo disse que a história dá poucas chances de arrependimento e que os evangélicos que foram a favor do golpe de 1964 – e ainda entregaram os que eram contrários ao regime – tiveram uma segunda oportunidade, mas não souberam rever a história. “Cresci sob a ditadura, tendo que dar as 'respostas certas' para preservar a vida do meu pai. Prometi às minhas filhas que lutaria para que elas não tivessem que viver isso”, reiterou.

Sindicalista aponta retirada de direitos trabalhistas

A retirada de direitos trabalhistas no cenário de crise do capitalismo está por trás do golpe, na visão de Beatriz da Silva Cerqueira, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT/MG). O discurso, segundo ela, é que os programas sociais e a valorização do salário mínimo quebraram o País e, por isso, precisam de ajustes. Mas o risco é de retrocesso.

A sindicalista também aponta interesses internacionais sobre o Brasil, principalmente em função do pré-sal e da destinação dos recursos de exploração para as áreas de saúde e educação. “Isso nos colocaria em outro patamar na disputa mundial”, salienta. Ela também defende a mobilização nas ruas. “O golpe é do legislativo, do judiciário e também das instituições. Então não podemos esperar outra reação a não ser das ruas”, justificou.

Ana Penido, subsecretária de Participação Social da Secretaria de Estado de Direitos Humanos, Participação Social e Cidadania, salientou que a democracia e a participação política servem, justamente para empoderar as pessoas. “O meios de participação no Brasil já não eram considerados suficientes. Agora teremos refluxos no que estava funcionando. Os vários conselhos no âmbito federal já estão paralisados e com recursos suspensos”, denunciou.

Livro traz documentos sobre a luta popular

Betinho Duarte, ex-presidente do Comitê Brasileiro pela Anistia – Seção Minas Gerais, lançou, durante a audiência, o livro digital Resistência e Direitos Humanos, que reúne milhares de fotos, documentos e notícias sobre eventos como o XXVIII Congresso da UNE, realizado há 50 anos, em Belo Horizonte. O Dia Internacional dos Desaparecidos Políticas e o Dia Internacional da Democracia são algumas das outras datas lembradas.

A obra também cita os 37 anos da anistia política, uma causa que, segundo Betinho, foi fundamental para o fim da ditadura. Ele salientou que as mulheres foram protagonistas nessa luta, a partir da procura pelos filhos, maridos e namorados nas cadeias. “Não conseguimos a punição para os torturadores, e eles estão aí. São homenageados”, afirmou

O deputado Rogério Correia (PT), autor do requerimento para a audiência, citou também a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal contra o ex-presidente Lula, no âmbito da Operação Lava-Jato. “Foi um espetáculo midiático e uma denúncia sem provas. A Corregedoria do MP deveria estar funcionando”, criticou.

Santa Fé – Durante a audiência, moradores da colônia de ex-hansenianos Santa Fé, localizada em Três Corações, no Sul de Minas, protestaram conta a retirada, pelo Governo do Estado, de uma mulher grávida que morava no local. Rogério Correia afirmou que a reivindicação para a volta da moradora já foi encaminhada ao governo.

Consulte o resultado da reunião.