Mulheres negras sofrem mais violência que brancas
A conclusão é de participantes de audiência, que cobraram melhor acolhimento das vítimas e interiorização de políticas.
14/09/2016 - 11:56 - Atualizado em 14/09/2016 - 17:15Houve avanços em relação ao enfrentamento da violência contra a mulher desde a promulgação da Lei Maria da Penha, na última década, mas ainda é preciso melhorar o acolhimento das vítimas, a comunicação entre os órgãos envolvidos e, principalmente, a capilarização das políticas, que acabam concentradas na Capital. Essas foram as constatações de participantes de reunião realizada nesta quarta-feira (14/9/16) pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Na audiência também foi destacada a maior vulnerabilidade das mulheres negras. De acordo com a representante da Secretaria de Estado de Direitos Humanos, Participação Social e Cidadania (Sedpac), Isabel Cristina Lisboa, enquanto o feminicídio entre mulheres brancas teve redução de 10%, nos últimos dez anos, o número cresceu 54% entre as negras.
Isabel apresentou uma série de dados e afirmou ainda que, em Minas Gerais, os números são parecidos com as estatísticas nacionais. Segundo ela, no Estado:
- A principal faixa etária das atingidas é entre 25 e 34 anos;
- Os agressores são, em sua maioria, os companheiros (40%), seguidos pelos ex-companheiros (30%) e depois pelos filhos, enteados e pais.
Os equipamentos disponíveis para coibir esse e outros tipos de violência, como estupro e assédio, ainda são insuficientes em Minas, na opinião da representante da Sedpac. São 16 centros de referência, 75 conselhos da mulher, quatro varas especializadas (todas em Belo Horizonte) e oito núcleos especializados da Defensoria Pública.
Isabel explicou que a secretaria tem cinco eixos de ação e estão sendo construídas estruturas como cadeia de custódia do material genético de agressores sexuais, além do plano estadual de atendimento às mulheres em situação de privação de liberdade.
Rede de atendimento - A necessidade de ampliar a rede de atendimento também foi destacada pela defensora pública Samantha Vilarinho.
De acordo com ela, apenas oito municípios mineiros contam com Núcleo Especial de Defesa dos Direitos da Mulher (Nudem) na Defensoria. Em Belo Horizonte, são oito vagas para o núcleo e apenas quatro estão preenchidas. “Dessa forma, não conseguimos atuar em tudo. Não temos pernas, por exemplo, para atuar nas ações penais e ficamos só nas extrajudiciais”, criticou.
Em relação ao processamento das denúncias, Samantha acredita que é necessário fazer ajustes no Poder Judiciário. As varas especializadas contam, como determinado por lei, com competência híbrida, cível e criminal. A cível, porém, estaria restrita à concessão de medidas protetivas de urgência.
“É lógico que isso é importante, mas as mulheres em situação de violência têm outras demandas. Elas querem se divorciar, querem resolver a guarda dos filhos, a divisão de bens. Isso tudo acaba em outras varas, a mulher é revitimizada ao contar toda a história de novo e fica submetida a decisões de pessoas sem a especialização necessária para esses casos especiais”, esclareceu Samantha.
Necessidade de otimizar medidas protetivas
A defensora pública Samantha Vilarinho destacou os principais impedimentos para melhorar a eficiência das medidas protetivas. Samantha relatou que, em Belo Horizonte, os juízes têm concedido a medida com eficiência e velocidade, mas há dificuldades para que os agressores sejam informados do ato, já que os oficiais de justiça não conseguem encontrá-los. Sem a notificação oficial, não se pode exigir o cumprimento da determinação.
Além disso, acrescentou a defensora, na cadeia, quando o agressor descumpre a medida já notificada, coloca-se a tornozeleira, que deve apitar caso ele se aproxime da vítima. O problema é que, nesse ponto, a Polícia Militar deveria ir imediatamente ao local, mas nem sempre isso acontece, conforme descreveu Samantha.
Já a chefe da Delegacia de Mulheres, Idosos e Pessoas com Deficiência da Polícia Civil, Danúbia Quadros, relatou que a delegacia atende cerca de 40 mulheres vítimas de violência a cada turno de 12 horas de trabalho.
A delegada contou que são produzidos cerca de 600 a 700 requerimentos de medidas protetivas por mês. Entretanto, segundo ela, a comunicação com o Judiciário é inexistente e, quando a mulher volta à delegacia para denunciar que o agressor descumpriu a medida, não é possível saber se o juiz já deferiu o requerimento ou se o oficial de justiça notificou a pessoa – ou seja, se houve, de fato, o descumprimento da medida.
Muitas vezes, a delegacia é o primeiro local ao qual a mulher recorre, à procura de ajuda, mas os profissionais são treinados para repressão, e não acolhimento, conforme explicou a delegada. Então, seria necessária uma equipe com, por exemplo, psicólogos e assistentes sociais.
O deputado Cristiano Silveira (PT), que preside a comissão, fez um resumo dos esforços que devem ser direcionados e destacou, para curto prazo, a interiorização das políticas e garantia de bolsa transitória para as mulheres que têm dependência financeira dos agressores.