Agentes culturais se reuniram na ALMG a fim de definir o planejamento do setor em Minas para os próximos dez anos
Rubem Reis ressaltou proposta de ampliação de recursos do orçamento para a área

Plano de cultura é oportunidade para revitalizar o setor

Definição das diretrizes culturais para os próximos dez anos, em Minas, acontece em meio a polêmica política.

09/06/2016 - 14:48 - Atualizado em 09/06/2016 - 19:03

Em tempos de morte e ressurreição do Ministério da Cultura (MinC), agentes culturais de todo o Estado se reuniram nesta quinta-feira (9/6/16), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), para definir o planejamento do setor em Minas para os próximos dez anos. É o Fórum Técnico Plano Estadual da Cultura, que debate propostas populares de alteração ao Projeto de Lei (PL) 2.805/15, do Poder Executivo, que deverá ser votado posteriormente no Plenário da ALMG. Ao longo de todo o dia, e seguindo pela noite, os participantes se reuniram em grupos de trabalho para apresentar sugestões.

Entre eles estava o vice-presidente do Conselho Estadual da Cultura de Minas Gerais, o produtor cultural Rubem dos Reis. Segundo ele, o plano estadual pode tornar-se o instrumento para mostrar a todos que o fortalecimento da área é necessário para beneficiar a população, não os artistas. E desta forma, reverter uma onda contrária ao setor que se fortaleceu na sociedade, em função do momento político.

“A forma como o governo Temer se instituiu foi ruim, assim como a extinção do Ministério. Mas tudo isso obrigou a classe a se reorganizar e pode se transformar em uma oportunidade”, afirmou Reis. Um dos sinais positivos do fortalecimento da classe foi a ocupação da Fundação Nacional de Artes (Funarte), em Belo Horizonte e outras capitais, desde maio. O movimento reivindicava a recriação do MinC, o que acabou conseguindo, mas continuou como um projeto cultural, que combina entretenimento e conscientização política.

Participantes querem triplicar orçamento

Entre as centenas de propostas discutidas na Assembleia, Rubem Reis destaca a que propõe ampliar os recursos do orçamento do Estado para o Sistema Estadual de Cultura. A diretriz aprovada nos grupos de discussão que se reuniram nesta quinta (9) é que a fatia da cultura no orçamento de Minas passe de 0,5% para 1,5%, até o fim do primeiro ano de vigência deste plano.

O vice-presidente do Conselho Estadual admite que a proposta de triplicar o orçamento da área é ambiciosa, mas não um delírio. “O plano é para dez anos, mas traçar essa meta logo para o primeiro ano é uma forma de indicar a necessidade de priorização”, argumenta Rubem Reis. De qualquer forma, assim como as demais sugestões aprovadas pelos grupos de trabalho nesta quinta, ela ainda precisa ser confirmada na plenária final desta sexta (10), no encerramento do fórum, e depois endossada pelos parlamentares na votação do PL 2.805/15.

Na área do financiamento, outra proposta aprovada pelos grupos de trabalho é a efetivação de uma parceria com o BDMG para a criação de um fundo que avalize empréstimos a artistas, técnicos e produtores.

O grupo que discutiu o Sistema Estadual aprovou ainda o estímulo à criação de cursos para formação de mão de obra no setor, em especial na restauração de bens móveis. Além disso, procurou priorizar a formação de gestores em toda a cadeia produtiva da área, por meio de convênios com o Sistema S e com o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), em todos os territórios de desenvolvimento.

A interiorização também foi uma diretriz forte no grupo que debateu a garantia de direitos. Entre as propostas aprovadas está a regionalização da atuação dos órgãos e entidades culturais, em especial no que se refere a eventos e ações, definindo-se percentuais mínimos de investimento em cada região. Outra sugestão é o ensino obrigatório de artes e de educação patrimonial em todos os anos da educação básica.

Deputados - Nesta quinta, o presidente da Comissão de Cultura, deputado Bosco (PTdoB), visitou os grupos de trabalho, agradecendo a colaboração dos agentes. “Aqui vocês vão discutir de forma mais profunda e detalhada essas propostas, mostrando que estamos no caminho correto, o caminho da participação”, afirmou o parlamentar. O deputado Wander Borges (PSB), que o acompanhou na visita, disse esperar que as sugestões sejam aproveitadas na íntegra pelo conjunto dos deputados, na tramitação posterior ao fórum.

A plenária final do fórum acontece a partir das 9 horas, nesta sexta (10). Além de votar as propostas finais, os participantes também elegem uma comissão de representação que continuará a acompanhar a deliberação parlamentar e também a execução das diretrizes pelo governo. O documento com as propostas finais será entregue ao presidente da ALMG, deputado Adalclever Lopes (PMDB), também nesta sexta, ao final dos trabalhos.

Delegados mostram otimismo na discussão das propostas

Álvaro Rodrigues de Abreu está entre as dezenas de representantes da sociedade eleitos em suas regiões para participar da etapa final do fórum. Professor da educação básica, ele percorreu os 580 quilômetros que separam sua cidade, Pedras de Maria da Cruz (Norte de Minas), de Belo Horizonte (RMBH), acreditando que será possível alcançar o objetivo do evento, de colher sugestôes para aprimorar o plano estadual.

“Quero alavancar esse processo de discussão e coloco meu nome à disposição para ser um sujeito da história de Minas Gerais. Se não for o meu nome, o importante é que o barco tem que navegar”. Foi assim como ele se apresentou ao grupo 1, sobre o Sistema Estadual de Cultura, ao se candidatar a relator dos trabalhos. 

Ele revelou que dá aulas na disciplina Conhecimentos das Artes, da Cultura e da Linguística. Ganhou a relatoria por larga diferença, de nomes vindos de Ubá e Cataguases, na Zona da Mata. Foi aplaudido num clima de descontração inicial, mas de fortes expectativas ao longo das discussões, como manifestado por delegados como Telma Valéria de Resende, técnica da área administrativa da Universidade Federal de São João del-Rei (Região Central).

“Esse tem sido um trabalho grande, que gera expectativa e um grande investimento de todos. Viemos de longe e esperamos que as propostas aprovadas andem internamente”, afirmou Telma quanto à tramitação na ALMG do projeto que contém o plano. Atuando no grupo 3, sobre sistemas de financiamento à cultura, ela antecipou o desejo de que o documento final aprovado contemple financiamento que atenda “à imensidão de Minas Gerais e seus vários segmentos da cultura”.

No mesmo grupo e vindo da mesma região, o diretor de teatro Juliano Mendes, que atua em Ouro Preto (Região Central do Estado), também ressaltou a importância dos desdobramentos do trabalho. “Estamos nos propondo a uma tarefa grande demais e cansativa, que a meu ver tem como ganho maior formar gestores civis das políticas públicas”, refletiu.

Participação precisa ir além do Fórum

Para Juliano Mendes, votar propostas durante o fórum pode gerar uma “ilusão” de participação se não houver uma ação em sequência por parte dos representantes da sociedade, com mobilização também junto aos parlamentares e vigilância sobre o cumprimento das propostas pelo governo. “ É preciso continuar acompanhando o processo e que cada um da sua região se engaje pessoalmente nisso”, defendeu ele, atento a discussões do grupo em torno de questões como a desoneração tributária para segmentos da área cultural.

Num intervalo do grupo, o diretor de teatro disse que via esse ponto como polêmico. No seu entendimento, diante das carências e das demandas de segmentos hoje em disputa no País, a “desoneração social” é que estaria em jogo. Ele manifestou, ainda, incômodo ao dizer que o Estado está sem uma lei de incentivo à cultura sem que isso gere mobilizações amplas, que ultrapassem os meio artísticos. Nesse sentido, disse esperar que o fórum desperte mais envolvimento da sociedade em questões como esta.

Atriz e produtora cultural de Governador Valadares (Rio Doce), Nazza Maral manifestou expectativa semelhante. “Está sendo bastante rico poder repensar as ideais e valorizar outras opiniões, vamos ficar até mais tarde se precisar”, acrescentou ela, delegada no grupo 1, sobre garantias de direitos culturais. Atenta aos detalhes, Nazza contou que votou a favor de mudanças em propostas de forma a incluir termos como “garantir” e especificar segmentos culturais para que algumas das ações sugeridas não ficassem genéricas.

Ela votou a favor, por exemplo, da inclusão de manifestações culturais urbanas, tradicionais, afro-brasileiras e indígenas entre aquelas que deverão ser contempladas em conteúdos de produção dos veículos públicos de comunicação. “Se não tiver o garantir em várias propostas, outro governo tira. E deixando claro os vários segmentos que deverão ser atendidos não se fecha a proposta com um grupinho único”, explicou.