No encontro em Ouro Preto, que abriu a série de reuniões regionais sobre o tema, foi anunciada a nova lei de incentivo à cultura - Arquivo/ALMG
Angelo Oswaldo informou que, entre 1999 e 2015, 80% dos recursos da área ficaram na RMBH
Em Paracatu, foi sugerida a integração entre as secretarias de Estado de Cultura e de Educação

Cultura mineira no centro dos debates

Após grande mobilização no interior, evento da ALMG fecha nesta sexta (10), no Plenário, propostas para plano estadual.

09/06/2016 - 16:37

Chega ao fim nesta sexta-feira (10/6/16) o Fórum Técnico Plano Estadual de Cultura, que discutiu, em uma parceria entre o poder público e a sociedade civil, as demandas e diretrizes que vão nortear as ações na área pelos próximos dez anos. A iniciativa comandada pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) percorreu doze cidades do interior do Estado nos últimos quatro meses para conhecer o cenário cultural de cada região, além de colher novas sugestões e discutir as propostas constantes no Projeto de Lei (PL) 2.805/15, que institui o Plano Estadual de Cultura, em tramitação na ALMG.

A plenária final do Fórum Técnico Plano Estadual de Cultura acontece durante todo o dia nesta sexta (10), a partir das 9 horas, no Plenário. Na programação está prevista a aprovação das propostas avaliadas nesta etapa final, que começou ainda na quarta (8), a eleição da Comissão de Representação que acompanhar os desdobramentos do evento e, finalmente, a entrega do documento de propostas ao presidente da ALMG, deputado Adalclever Lopes (PMDB).

O ponto de partida dessa longa caminhada foi o PL 2.805/15, recebido pela ALMG em agosto de 2015. Já em setembro começaram as reuniões preparatórias que definiram a dinâmica e o cronograma do evento, que entre os meses de fevereiro e maio percorreu os municípios de Ouro Preto (Região Central), Araxá (Alto Paranaíba), Paracatu (Noroeste), Divinópolis (Centro-Oeste), Governador Valadares (Rio Doce), Montes Claros (Norte), Araçuaí (Jequitinhonha/Mucuri), Alfenas (Sul de Minas), Uberlândia (Triângulo Mineiro), Cataguases (Zona da Mata), Santa Luzia (Região Metropolitana de Belo Horizonte) e Januária (Norte de Minas).

Os doze encontros realizados percorreram mais de 8,4 mil quilômetros e somaram um total de 1.328 participantes, marcando o caráter democrático do evento. Entre abril e maio, também foi aberta uma consulta pública pela internet para recolher contribuições para o texto do Plano Estadual de Cultura. Para a realização do fórum, as sugestões no projeto foram reorganizadas na Assembleia para serem discutidas em três grupos: Garantia dos diretos culturais; Sistema Estadual de Cultura; e Sistema de Financiamento à cultura, totalizando 157 propostas, com o objetivo de facilitar a apreciação popular.

Escassez de recursos preocupa cidades mineiras

Uma das reivindicações mais recorrentes nos encontros regionais foi quanto à necessidade de mais recursos para a área cultural, além da descentralização dos já disponíveis, para que eles possam contemplar mais iniciativas em todas as regiões do Estado. Sobre isso, o secretário de Estado de Cultura, Angelo Oswaldo, destacou nos encontros regionais que o Executivo pretende enviar à ALMG um projeto com uma nova lei de incentivo à cultura, de forma a priorizar o Fundo Estadual de Cultura.

Conforme afirmou no encontro de Ouro Preto, isso permitirá uma maior descentralização dos financiamentos no Estado e uma maior capilaridade entre todos os segmentos culturais que, atualmente, praticamente não têm acesso a patrocinadores.

Em Alfenas, o secretário informou aos participantes que, entre 1999 e 2015, 80% dos recursos da área ficaram na RMBH e apenas 20 empresas patrocinadoras são responsáveis por esse montante. Na sua avaliação, esse sistema de captação junto às empresas levou à concentração de recursos, mas a nova lei, ao privilegiar o Fundo Estadual de Cultura, projetos menores que nunca foram atendidos também poderão ser contemplados.

No âmbito do financiamento, algumas cidades defenderam a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 150/03, que tramita na Câmara dos Deputados, e propõe que a União aplique anualmente um mínimo de 2% de sua receita na preservação do patrimônio cultural brasileiro e na produção e difusão da cultura nacional. O percentual de Estados e municípios proposto pela proposição seria de 1,5% e 1%, respectivamente.

Outras propostas apresentadas e que pretendem angariar mais recursos para a área foram a destinação de um percentual do ICMS para Fundos Municipais de Cultura, como forma de estimular as artes desenvolvidas em cada cidade (Divinópolis); o estímulo à utilização de recursos do Fundo Estadual de Cultura e do ICMS Cultural para aquisição de bens tombados, visando sua preservação (Governador Valadares); e a realização de estudos para utilização dos recursos da Loteria Mineira para compor o Fundo Estadual de Cultura (Cataguases).

Também foi sugerido a criação de um fundo de aval a empréstimos de artistas, técnicos e produtores culturais, em parceria com o BDMG e a transferência de recursos do Fundo Estadual de Cultura (FEC) aos fundos municipais, sem contrapartida dos municípios (Araxá). Contudo, essa medida já constava no projeto elaborado originalmente pelo Executivo.

Participantes apresentam novas propostas

Fora a questão financeira, algumas das novas propostas oriundas dos encontros regionais contemplam lacunas do plano, como nas áreas de leitura e literatura e na fixação de intervalo para realização das conferências estaduais de cultura. Em Paracatu, por exemplo, uma das propostas apresentadas sugere ações de integração entre as secretarias de Estado de Cultura e de Educação para a implementação de projetos de incentivo à literatura e à leitura nas bibliotecas escolares.

Outras propostas tratam de temas variados, como a preservação e promoção do patrimônio cultural de segmentos específicos da população; identificação e registro de todas as manifestações da cultura afro-brasileira como bem cultural e imaterial; incentivo à cooperação intermunicipal para compartilhamento de espaços culturais, tendo como meta pelo menos um consórcio por território de desenvolvimento; o fortalecimento dos conselhos municipais de cultura, com a formação e apoio técnico de gestores; e o mapeamento e incentivo de iniciativas realizadas no interior, que promovam o intercâmbio de artistas mineiros por meio de apresentações e de formação sociocultural.

Diversidade - Os encontros regionais também afloraram a grande variedade de iniciativas e manifestações culturais presentes no Estado, como, por exemplo, grupos de Folias de Reis, associações de congado, corais, grupos de dança, artesanato, gastronomia, festas religiosas, desfiles de carros de boi, produções audiovisuais, arquitetura e espaços destinados à produção e à formação artística.

Para o pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e do Centro de Estudos Multidisciplinares em Cultura da Universidade Federal da Bahia, Antônio Albino Canelas Rubim, o desenvolvimento de um país está diretamente relacionado à sua riqueza cultural, que, por sua vez, é medida pela promoção da diversidade. “Cultura é progresso porque permite desenvolver as personalidades. Uma sociedade que não permite que o cidadão tenha a evolução de suas individualidades não pode ser considerada desenvolvida”, concluiu Rubim, que foi um dos palestrantes da manhã de quarta (8), durante a abertura da etapa final do fórum.

Raízes - Por meio do fórum também foi possível resgatar locais e importantes personalidades que compõem as raízes culturais do Estado: os escritores mineiros Guimarães Rosa e Adélia Prado, além da figura histórica de Dona Beja; o escultor Geraldo Teles de Oliveira e o cineasta Humberto Mauro; a cidade de Ouro Preto, a primeira no Brasil a ser reconhecida como Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco; a Igreja do Rosário do Brejo do Amparo, patrimônio de Januária (Norte de Minas), entre tantos outros.

Plano nacional é base para diretrizes estaduais

A Lei Federal 12.343, de 2010, que instituiu o Plano Nacional de Cultura (PNC) e passa, agora, por um processo de revisão, é a base para a construção do projeto estadual. De acordo com essa norma federal, os estados que aderirem ao PNC deverão elaborar seus planos decenais em até um ano após assinatura do termo de adesão voluntária, em consonância com as diretrizes, metas e estratégias previstas nacionalmente.

Assim, o Plano Estadual de Cultura, que formaliza um conjunto de metas e estratégias para a cultura no Estado, tem por finalidade o planejamento e a implementação de políticas culturais pelo prazo de dez anos, visando ao desenvolvimento de ações na área para o período de 2015 a 2025. Segundo informações do Governo do Estado, trata-se de um documento transversal e multissetorial baseado no entendimento de cultura como expressão simbólica, cidadã e econômica, e contemplando a diversidade cultural e regional do Estado.

Entre os princípios norteadores do planejamento de políticas culturais nesses dez anos estão a defesa dos direitos culturais; acesso aos bens culturais; valorização, promoção e proteção do patrimônio cultural mineiro; estímulo a criação, preservação, divulgação, produção, pesquisa, experimentação e capacitação artístico-cultural; descentralização e regionalização da política pública; e política para as artes que estimule as culturas popular, afro-brasileira, indígena e circense.

O PL 2.805/15 também prevê que o conjunto de ações e metas do plano será reavaliado a cada dois anos pelo Conselho Estadual de Política Cultural, coincidindo com a realização da Conferência Estadual de Cultura.

Encaminhamentos - Após o fim do evento nesta sexta (10), o Comitê de Representação eleito vai analisar e verificar os possíveis encaminhamentos que serão dados às propostas aprovadas. Na prática, essas propostas podem se concretizar, por exemplo, na forma de requerimentos, projetos de lei ou até alterações no texto do Plano Estadual de Cultura. A indicação dos possíveis encaminhamentos será entregue, posteriormente, à Comissão de Cultura da ALMG.

O presidente da Comissão de Cultura, deputado Bosco, salientou nos encontros regionais que o plano garante uma política cultural do Estado que vá além dos governos. “Cada região tem suas tradições e peculiaridades. Faltava, então, esse plano para que a cultura possa ser priorizada. Os governos são passageiros, e nem todos têm a cultura como prioridade”, afirmou, durante o encontro em Araçuaí.