O Debate Público Base Nacional Comum Curricular foi realizado no Plenário, pela Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da ALMG
Segundo Arroyo, historicamente, o poder público no Brasil oferece ao povo simples e carente apenas o mínimo
Lucíola não concorda que a BNCC melhoraria a competitividade do País internacionalmente
Gláucia informou que a Secretaria de Educação atua na perspectiva da superação das desigualdades

Palestrantes fazem críticas à Base Nacional Comum Curricular

Em debate público na ALMG, professores e gestores reprovam proposta federal pelo caráter excludente e visão mercantil.

30/05/2016 - 20:04 - Atualizado em 31/05/2016 - 12:09

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) apresenta um diagnóstico negativo das escolas públicas e de seus profissionais. Essa foi a conclusão dos palestrantes do painel da tarde do Debate Público Base Nacional Comum Curricular: Em Busca da Qualidade e da Equidade na Educação, realizado nesta segunda-feira (30/5/16), no Plenário, pela Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

Os palestrantes reprovaram a proposta de criação da BNCC. As críticas mais contundentes partiram do professor titular emérito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Miguel González Arroyo. Na visão dele, a base comum não reconhece os esforços dos profissionais da educação e, se o objetivo do governo fosse realmente melhorar a educação, deveria ter começado pelo diagnóstico feito pelos próprios profissionais da educação.

Arroyo avalia que a BNCC desvaloriza o trabalho das entidades docentes autônomas e qualquer iniciativa de criatividade dos profissionais da educação. “Vocês serão meros entregadores da marmita da base nacional”, indignou-se, dirigindo-se aos professores presentes.

O professor também considerou excludente a base nacional curricular: “Ela não é para todos e tem endereço certo: os pobres deste País. Você acha que os diretores de escolas privadas leram a base nacional? Claro que não!”, observou. E acrescentou que, com a chamada política de letramento na idade certa, o Brasil retrocede à política educacional do império. “Historicamente, o poder público no Brasil oferece ao povo simples e carente apenas o mínimo, o essencial”, exclamou.

Aliado a esse aspecto, o professor ainda considerou que o projeto federal não atende ao que está determinado na Constituição Federal e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). “O direito à formação humana plena está previsto na LDB”, reforçou.

Para Arroyo, a BNCC está estruturada em um tripé, no qual se insere o que deve ser aprendido, ensinado e avaliado. Ele acredita que as avaliações internacionais, como o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), vão balizar o trabalho do professor, que perderia seu poder de avaliação.

Para professora, BNCC tem visão economicista da educação

Também crítica da proposta, a professora da UFMG Lucíola de Castro Santos considerou que a BNCC é uma demanda dos empresários e apresenta uma visão economicista da educação, ligada apenas ao desenvolvimento econômico. "A proposta não pensa a educação como meio de formar cidadãos aptos a participar da vida pública. A quem interessa e quem levanta a bandeira da Base Nacional Curricular Comum?”, questionou.

Ela foi cética em relação ao discurso empresarial de que a BNCC melhoraria a competitividade, com o País se saindo melhor em testes internacionais. “Na verdade, temos países com bons resultados nos testes que não têm base nacional e outros que têm”, disse.

Lucíola completou que é necessário que haja ainda uma estrutura adequada e que os professores sejam estimulados. "Se não houver melhor distribuição de renda no Brasil, não haverá boa educação", completou, acrescentando que as políticas educacionais devem estar articuladas com as outras políticas sociais.

A professora lembrou que a introdução em outros países de currículos nacionais e testes para ranquear escolas buscou introduzir um elemento mercadológico importante: a competição, fazendo as instituições brigarem umas com outras, com a ideia de que isso melhoraria a produtividade.

Base nacional deveria considerar a diversidade

A docente Lucíola Santos apresentou argumentos contrários à base nacional, que ficaria fechada em certas concepções, impedindo que experiências inovadoras pudessem enriquecer a educação. "As experiências que o aluno tem na escola precisam ser ricas, fazendo com que ele se interesse pelo conhecimento. Para isso, a escola tem que ser acolhedora e trabalhar a diversidade", apregoou.

A professora da UFMG Analise de Jesus da Silva também considera que a Base Nacional Curricular Comum não pode ser elaborada sem se levar em conta a diversidade, na perspectiva daqueles que são excluídos no Brasil. "Não se pode partir de uma compreensão somente técnica. Tem que haver a defesa da participação popular e do dever do Estado para com os sujeitos", postulou.

Analise citou os públicos que a base comum deveria englobar: pessoas em situação de rua, indígenas, com deficiência, com orientações sexuais, culturas e ideologias diferentes, vítimas de violência, não alfabetizadas, moradoras de ocupações urbanas ou rurais, entre outros.

Já a diretora do Sindicato Único dos Trabalhadores da Educação (Sind-Ute), Mônica Maria de Souza, lamentou o fato de “o debate acontecer num momento de golpe”. Para ela, “o 'governo golpista' trouxe uma proposta para a educação de terra arrasada”. Isso incluiria, por exemplo, acabar com o Piso Nacional dos Professores e retirar a obrigatoriedade de aplicação de recursos orçamentários na educação.

Secretaria de Estado de Educação (SEE) - A coordenadora da Política de Formação Profissional da Secretaria de Estado de Educação, Gláucia Vieira, concordou com as falas que a precederam. Ela completou que a SEE, sob a gestão de Macaé Evaristo, tem atuado na perspectiva da equidade e da superação das desigualdades.

Gláucia informou que, em Minas Gerais, 2,17 milhões de pessoas são atendidas pela rede estadual de educação. Outros 1,78 milhão pela municipal, 754 mil pelo ensino privado e 33 mil por escolas federais. Apesar disso, um dado preocupa a SEE: de 1 milhão de adolescentes (15 a 17 anos) no Estado, 15% estão fora da escola e 200 mil sem concluir o ensino fundamental.

A fim de reverter o quadro, foi feita a mobilização “Virada Educação Minas Gerais”, para fazer com que o jovem volte à escola. Com a campanha, segundo Gláucia, houve um aumento de 114 mil matrículas no ensino médio.

O deputado Paulo Lamac (Rede), presidente da Comissão de Educação da ALMG, disse que o debate sobre a base nacional não se encerra com o evento na ALMG, pois a proposta está sendo debatida em todos os Estados, com seminários para tratar do tema. “Cabe a nós participar dessa discussão, para melhorar o plano. Sem isso, corremos o risco de ser atropelados por ele, sem poder fazer as ponderações necessárias”, concluiu.