Participantes da reunião falaram sobre o Polo Audiovisual da Zona da Mata, um programa de desenvolvimento baseado nas economias cultural e criativa
Será encaminhado à ALMG um projeto com nova lei de incentivo e fomento à cultura

Cataguases se destaca nacionalmente em produção audiovisual

Arquitetura modernista e expressões literárias pioneiras também estão em evidência na área cultural da cidade.

02/05/2016 - 16:34 - Atualizado em 02/05/2016 - 18:08

Considerada o berço do cinema nacional e palco de relevantes iniciativas literárias do início do século passado, a região da Zona da Mata recebeu, nesta segunda-feira (2/5/16), o décimo encontro do Fórum Técnico Plano Estadual de Cultura, que está sendo realizado pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), para aprimorar, em parceria com a sociedade, o Projeto de Lei (PL) 2.805/15, do governador, que contém o Plano Estadual de Cultura. O evento foi realizado em Cataguases, cidade que acolheu o cineasta Humberto Mauro, e que até hoje se destaca por uma intensa produção audiovisual.

Com cerca de R$ 30 milhões em investimentos em filmes nos últimos anos, que geraram um impacto de mais de R$ 62 milhões na economia da região, além da geração de 800 postos diretos e indiretos de trabalho, o Polo Audiovisual da Zona da Mata é um programa de desenvolvimento baseado na economia da cultura e na economia criativa do audiovisual, que aproveita o potencial da região.

Segundo o seu diretor executivo, César Piva, o Polo é uma iniciativa que existe oficialmente desde 2010 e que foca o seu trabalho na formação, pesquisa, experimentação, produção cinematográfica e de televisão, animação, entre outros. Embora tenha uma base forte na cidade de Cataguases, em virtude da própria história cultural do município, o Polo Audiovisual da Zona da Mata trabalha com toda a cadeia produtiva do audiovisual na região.

“Somos a região do interior do Brasil que mais realiza produções de maneira sistemática”, afirmou Piva. Ele informou que o Polo Audiovisual já está em seu 12° grande filme, sendo que alguns dos projetos alcançaram projeção nacional, como O menino no Espelho e Meu Pé de Laranja Lima.

Piva também é gestor da Fábrica do Futuro. A iniciativa está inserida no âmbito do Polo Audiovisual da Zona da Mata, e é anterior a ele, atua como base de formação, sobretudo para os jovens da região que querem trabalhar com audiovisual. De acordo com ele, a Fábrica do Futuro prepara o ambiente, articula as instituições, experimenta linguagens, constituindo-se como um momento de formação e incubamento cultural.

Desenvolvimento regional – No que se refere ao Plano Estadual de Cultura, César Piva disse que o que se espera é a descentralização dos recursos da área, concentrados hoje na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), e, a partir daí, o desenvolvimento cultural regional. ”Em um Estado como o nosso, é preciso ter uma força direcionada para fortalecer e valorizar as potências do interior, que são reais. O plano tem que revelar isso, reforçar esse desconcentração de recursos, fortalecendo os territórios”, disse.

O prefeito de Cataguases, José César Samor, disse que a cidade participa do fórum com expectativas, especialmente no que se refere ao repasse de recursos que possam financiar a procução cultural da região. Ele afirmou que a maioria das prefeituras não consegue atender satisfatoriamente a demanda da produção cultural e que não há como investir de forma sistêmica e estruturada na área, especialmente no momento que o Pais vive. Nesse contexto, ele pontuou que a situação de Cataguases não é diferente e que a cidade não tem conseguido pagar em dia os projetos culturais. “Cataguases respira cultura e destaca-se também como berço da arquitetura modernista de Minas. Temos bons projetos e criatividade, mas isso só se transforma em realidade se tivermos recursos”, disse.

O secretário municipal de Cultura, José Ricardo Martins Junqueira, também se mostrou preocupado com a queda de recursos destinados à cultura. Ele também defendeu como fundamental para reconhecer e valorizar a área a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 150, que tramita na Câmara dos Deputados desde 2003, e propõe que a União aplique anualmente um mínimo de 2% de sua receita na preservação do patrimônio cultural brasileiro e na produção e difusão da cultura nacional. O percentual de Estado e municípios proposto pelo projeto seria de 1,5% e 1%, respectivamente.

Arquitetura modernista - Não é apenas pelas produções audiovisuais que Cataguases se destaca no âmbito cultural. A arquitetura também se mostra como um ponto forte do patrimônio cultural municipal, com uma notável influência modernista. Um exemplo é o Santuário de Santa Rita de Cássia, de 1968, localizada na praça que leva o mesmo nome. De acordo com o secretário José Junqueira, a igreja tem o formato de um avião e sua fachada é decorada com um painel de azulejos feito pela pintora Djanira da Motta e Silva. Além disso, a área no entorno da igreja é tombada como patrimônio pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), segundo o secretário.

Outra obra importante é o Educandário Dom Silvério, cuja fachada de azulejo, datada de 1954, também adota um estilo modernista. O local abriga a pintura em óleo sobre a parede “A Criação do Mundo”, feita em 1956, pelo pintor e muralista romeno, naturalizado brasileiro, Emeric Marcier.

Plano significará política permanente de Estado

“Na área da cultura, se queremos sair da indigência, precisamos da sistematização”, disse o secretário de Estado de Cultura, Angelo Oswaldo, ao falar sobre o Plano Estadual de Cultura. O secretário destacou as iniciativas culturais presentes em Cataguases que, na sua opinião, é uma cidade compromissada com a área. “Cataguases é uma cidade especial, mais representativa do século 20 porque soube reunir contribuições da literatura, com o Movimento Verde (movimento surgido na década de 20 e que originou uma publicação modernista conhecida como Revista Verde), até o cinema, com Humberto Mauro, que se fixou aqui”, lembrou.

Nesse sentido, ele destacou a inauguração, no último fim de semana, de dois cineclubes na cidade. Ele relatou que, no evento, foram exibidos dois curtas-metragens, que seriam, para ele, trabalhos capazes de vencer qualquer festival internacional na sua categoria, devido à alta qualidade. O secretário ainda lembrou que a cidade de Cataguases abrigou o painel Tiradentes, do pintor Candido Portinari, feito originalmente para o Colégio Cataguases, projetado por Oscar Niemeyer. A obra, entretanto, foi comprada em 1975 pelo governo do Estado de São Paulo e, atualmente, o colégio mantém uma réplica da obra.

A concentração de recursos também foi apontada pelo secretário Angelo Oswaldo como um ponto a ser corrigido na área cultural. “Percebemos que, de 1999 a 2015, o Estado abriu mão de R$ 600 milhões pela lei de incentivo. Desse total, 80% ficou na RMBH. Há uma concentração grande. Verificamos também que 20 empresas são responsáveis por 80% do patrocínio cultural do Estado”, disse.

O secretário ainda lembrou que será encaminhado à ALMG um projeto com uma nova lei de incentivo e fomento à cultura. Ele afirmou que a atual Lei Estadual de Incentivo à Cultura, que é de 1998, alcançou grandes resultados naquele momento inicial, sendo que alguns deles foram colhidos na região da Zona da Mata, através da criação de polos e centros culturais de atuação.

Momento histórico – O deputado Bosco (PTdoB) lembrou que Minas Gerais é o único Estado que ainda não conta com o plano. Ao pontuar que Minas é muito rica culturalmente, o parlamentar disse que instituir o plano, em parceria com o governo, e discutir com os agentes que fazem acontecer a cultura constitui-se um momento ímpar. O deputado ainda destacou que o plano será um ponto de partida para nortear a questão cultural e que, através dele, espera-se que os segmentos da área, sobretudo no interior, possam ser valorizados.

O deputado Wander Borges (PSB) lembrou que a ideia do fórum é ampliar a discussão e receber propostas sobre o plano. Ele pontuou que as leis de incentivo à cultura já estão ultrapassadas e beneficiam geralmente um pequeno conjunto de atores culturais.

Na parte da tarde, os participantes do fórum se dividiram em três grupos de trabalho para discutir as propostas do Executivo contidas no PL 2.805/15 – e reorganizadas pela ALMG – para os temas Garantia de direitos culturais, Sistema Estadual de Cultura e Sistema de financiamento à cultura.

No total, 23 novas propostas foram aprovadas e priorizadas nos grupos de trabalho. Entre elas, estão a criação de novos estímulos aos proprietários de bens tombados no Estado, tendo em vista que muitas vezes faltam incentivos para manter aquele bem; a ampliação da abrangência do sinal do canal da Rede Minas nos municípios do Estado, bem como o aperfeiçoamento colaborativo da emissora; a realização de estudos para utilização dos recursos da Loteria Mineira para compor o Fundo Estadual de Cultura; e a criação de fundo de pesquisa para estudo e estímulo à economia criativa no setor cultural, com recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e da Fundação João Pinheiro (FJP).