Entidades defendem atenção especial para reabilitados
Audiência debate projeto em tramitação na ALMG que prevê inserção laboral de dependentes químicos em recuperação.
22/03/2016 - 20:17Representantes de entidades civis e do Executivo demonstraram preocupação com o ambiente proporcionado pelas empresas para dependentes químicos que tenham concluído seu processo de reabilitação e estejam aptos a ingressar no mercado de trabalho. O debate surgiu em audiência pública da Comissão de Prevenção e Combate ao Crack e Outras Drogas da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizada nesta terça-feira (22/3/16). A audiência teve como objetivo a discussão do Projeto de Lei (PL) 2.277/15, de autoria do deputado Cabo Júlio (PMDB), que autoriza o Governo do Estado a criar um programa de inserção laboral para os usuários de drogas em recuperação.
A superintendente de Prevenção da Subsecretaria de Políticas Sobre Drogas, Fabiane Rodrigues Oliveira, ponderou que a matéria é muito importante, pois não existem políticas desse tipo. No entanto, manifestou preocupação com o dia a dia desses empregados. “Eles possuem suas peculiaridades e precisam ser pensados como um todo. O trabalho, claro, é parte essencial disso. Mas eles não podem ser só inseridos, também têm de ter um ambiente que favoreça a permanência. É preciso que o trabalho faça parte de uma trajetória, como um todo, satisfatória”, avaliou.
A presidente do Conselho Municipal de Políticas sobre Drogas de Belo Horizonte, Soraya Romina Santos, reforçou a importância da política pública proposta e disse que diversas empresas privadas, verificando o sucesso da proposta, seguirão o exemplo, o que é fundamental. “Nós sabemos que o preconceito nas seleções das empresas existe e que, se a pessoa vem da rua ou já foi presa, ninguém contrata. Imagine então o usuário de drogas? Mas me preocupo também com algum tipo de diálogo com as áreas de recursos humanos. É preciso pensar não só na ocupação, mas na vivência nessas empresas”, ponderou.
O agente da Polícia Federal e coordenador Estadual do Programa Maçonaria a Favor da Vida - Contra as Drogas, Danilo Emanuel de Oliveira Santos de Treminio Salas, pediu que o PL incluísse menores aprendizes e adolescentes, que são muito impactados pelo consumo das drogas, na política pública proposta. “E que eles tivessem acesso não apenas a conteúdos profissionais, mas também de cidadania, para que sejam pessoas de liderança em suas comunidades”, acrescentou.
O autor do requerimento para a realização da reunião e da matéria em debate, deputado Cabo Júlio, explicou que isso não seria possível tendo em vista que menores não podem ser contratados porque a legislação não permite. Ele reforçou que os contratados seriam egressos de tratamentos que passariam por sérias avaliações médicas e psicológicas. “O recomeço dessas pessoas é muito difícil, elas precisam de uma oportunidade”, disse.
Projeto - Além da criação do programa, o PL obriga o governo a reservar a esses usuários reabilitados 2% do total de vagas de trabalho geradas em cada contrato de obras públicas ou de serviços contratados. Tendo isso em vista, o advogado da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Gustavo Lemos Ferreira da Silva, chamou a proposta de “inconstitucional” e disse que ela estaria violando o artigo 22 da Constituição Federal, já que caberia apenas à União legislar sobre os direitos do trabalho.
“Essa é mais uma cota, que soma-se às destinadas a deficientes e trabalhadores aprendizes e só vai penalizar ainda mais as empresas. Eu creio que isso seja inviável. As empresas já são multadas por não cumprirem as cotas que já existem, porque não há pessoas capacitadas”, justificou. Ele disse ainda que a inserção de usuários reabilitados não deveria ser regida por legislação, mas ser feita voluntariamente, “contando com a boa fé das empresas”.
A deputada Ione Pinheiro (DEM) defendeu que a matéria estabeleça, sim, um percentual porque “quando as coisas ficam muito livres na legislação, não acontecem”. Ela ponderou também que a Secretaria de Estado de Saúde seja ouvida sobre se poderá assumir, já tendo tantas responsabilidades, a seleção e emissão de certificados de aptidão para essas pessoas.
Relator diz que empresas podem ter algum poder de veto
O presidente da Comissão e relator do projeto de lei, deputado Antônio Jorge (PPS), disse que o PL 2.277/15 trata de empresas que participarão de licitações com o Executivo. Portanto, já cientes de que essa reserva de vagas seria um pré-requisito do contrato, o que diferenciará a futura lei das demais cotas citadas pelo advogado. O parlamentar ponderou ainda que as empresas deverão ter algum tipo de capacidade de veto caso constem incapacidade dos contratados de cumprir as funções necessárias.
O presidente do Conselho Estadual de Políticas Sobre Drogas (Conead), Aloísio Antônio Andrade de Freitas, afirmou que o trabalho ideal para o perfil do ex-dependente químico seria ajudar na recuperação de outros dependentes, chamando isso de “vocação natural”. "É nisso que deveríamos pensar, pois essas pessoas possuem um vazio existencial e o vício não é algo de cura definitiva, demandando cuidados especiais sempre. Como proteger essas pessoas de recaídas? E o álcool, por exemplo, é algo presente no cotidiano de muitas empresas”, analisou.
Requerimentos – Antes da reunião, quatro requerimentos de autoria do presidente da Comissão, Antônio Jorge, foram aprovados. O primeiro deles é para realização de: visita a Brasília, na quarta-feira da próxima semana (30/3), com o objetivo de participar da assembleia geral para a constituição da Associação Nacional pela Restrição da Propaganda de Bebidas Alcoólicas. Outro requerimento prevê audiência pública para debater, em Itajubá (Sul de Minas), o consumo de drogas, bem como a violência decorrente do uso de substâncias psicoativas no município.
Outro requerimento pede audiência para debater o atendimento à saúde prestado aos usuários de drogas que se encontram no Sistema Prisional no Estado, bem como a reformulação do Plano Operativo Estadual de Atenção à Saúde no Sistema Prisional. Por fim, também foi aprovado requerimento para debate sobre a atual política sobre drogas e as diversas abordagens no tratamento do usuário de álcool e drogas.