Segundo representante da SES, 18% dos imóveis mineiros ainda não foram visitados por impedimentos criados por seus proprietários
Segundo Rodrigo, em Minas tem um caso de zika confirmado em recém-nascido e 25 em investigação
Deputados falaram sobre as medidas que devem ser tomadas para combater essas doenças

Dificuldade de acesso a imóveis prejudica combate à dengue

Agentes de saúde são impedidos de atuar por proprietários, conforme denúncia feita em audiência na Comissão de Saúde.

02/03/2016 - 20:34

Cerca de um milhão de imóveis em Minas Gerais encontram-se atualmente fechados ou inacessíveis aos agentes de saúde para o controle da proliferação do mosquito Aedes aegypti, responsável pela disseminação da dengue, zika e chikungunya. O dado foi revelado nesta quarta-feira (2/3/16) pelo superintendente de Vigilância Epidemiológica, Ambiental e de Saúde do Trabalhador da Secretaria de Estado de Saúde (SES), Rodrigo Fabiano do Carmo Said, em reunião na Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

Segundo Rodrigo Said, essa estimativa corresponde a 18% dos imóveis mineiros, que ainda não foram visitados justamente por impedimentos criados por seus proprietários. O superintendente também relatou que 50% dos municípios ainda não receberam recursos nem realizaram concurso público para a contratação de agentes de controle de endemias, principalmente por erros administrativos. “As cidades precisam regularizar seus cadastros junto ao Ministério da Saúde. Isso é essencial”, afirmou.

O superintendente informou ainda que não há nenhum embasamento científico que confirme que o uso de inseticidas contribua de qualquer forma com a incidência da microcefalia entre recém-nascidos. “O uso ainda está em discussão, mas atende a critérios de segurança. Em Minas temos atualmente um caso de zika confirmado em recém-nascido e 25 em investigação. Temos um problema: a ausência de exames mais ágeis para confirmar a doença. A oferta desses exames no mundo é baixa, de modo que estamos priorizando os mais graves para serem analisados”, completou Rodrigo Said.

Rodrigo Said também informou que o Governo Federal se comprometeu com repasses adicionais a todos os municípios do País, num valor total de R$ 37 milhões, sendo que R$ 27 milhões já foram pagos. Em Minas, 563 municípios já estão usando essa verba para diversas ações de combate à dengue. “Esse recurso é independente de declarações de situação de emergência”, explicou. Até o momento, a secretaria trabalha com a projeção de casos prováveis para o ano de quase 130 mil no Estado. Conforme mapa apresentado na reunião, os municípios acima de 100 mil habitantes são os mais impactados pela doença.

O coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa da Saúde (CAO-Saúde), promotor Gilmar de Assis, disse que está trabalhando em ações judiciais que permitam aos agentes exercer poder de polícia para atuar em imóveis nos quais são impedidos de entrar pelos proprietários. Também declarou que o CAO-Saúde vai ajudar os municípios que ainda não conseguiram usufruir dos recursos adicionais. “Vivemos uma situação de emergência e é importante a mobilização social de todos”, apontou.

O presidente da Associação Médica de Minas Gerais (AMMG), Lincoln Lopes Ferreira, lembrou que ainda não há confirmação científica de que a zika e a microcefalia estejam correlacionadas, reforçando que o maior problema de saúde pública atualmente é mesmo a dengue, devido ao enorme número de casos. “A educação, o transporte e a segurança pública são pautas contínuas do poder público. A dengue precisa receber o mesmo nível de planejamento. Isso impacta até mesmo na carreira dos médicos e na sua capacitação para lidar com esse surto”, definiu.

Leishmaniose - O presidente do Comitê de Ética da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), Vitor Márcio Ribeiro, criticou o fato de as políticas públicas de saúde estarem constantemente “apagando incêndio”, alertando para o risco também de um surto de leishmaniose visceral e de leptospirose no Estado. “Matar os cães contaminados é fazer uma maquiagem. Isso efetivamente não resolve o problema. Não controlamos os vetores de maneira adequada. Temos uma população muito grande de cães de rua sem uma política permanente de controle. E a leishmaniose mata muito mais do que a dengue”, advertiu.

O professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Geraldo Cunha Cury, lembrou a importância de os doentes, ou aqueles que estejam com suspeita de dengue, se hidratarem bastante, o que ajuda a diminuir o impacto da doença no organismo. “As pessoas têm que ir para o Centro de Saúde já com a garrafinha na mão. Isso salva vidas. Acabar com a dengue só depende de medidas simples”, disse.

Deputados alertam para aumento de casos

Um dos autores do requerimento para a reunião, o deputado Carlos Pimenta (PDT) manifestou preocupação quanto ao crescimento no número de casos de dengue em Minas, já que o Estado concentra, conforme informações da imprensa nacional, um quarto das notificações do País. Ele também questionou os métodos que estão sendo usados no combate ao mosquito Aedes aegypti, como o “fumacê”, pois considera que pode haver risco de saúde para a população. “O foco deveria ser no combate às larvas, aos criadouros, visita aos lixões e nos locais que têm acumulado água”, receitou.

Também autor do requerimento, Fred Costa (PEN) criticou as subnotificações dos casos de dengue que são atendidos em hospitais particulares. “Já recebi uma centena de relatos de pessoas vítimas do descaso e irrresponsabilidade do poder público. Ouvi um relato de uma mulher que foi atendida em posto de saúde e informada de que o exame para a constatação da doença custa R$ 900. É um absurdo, pois quantos podem pagar por isso? É aí que temos as subnotificações”, criticou.

Antônio Jorge (PPS) disse que é preciso tomar medidas “obsessivas” no combate à dengue, tendo em vista que até junho a tendência é de aumentar o número de casos. “Todas as secretarias têm que estar envolvidas, com foco também na assistência aos pacientes. A água parada não é o único problema, precisamos cuidar dos nossos doentes. E percebo que as ações na questão assistencial estão tímidas", avaliou.

Ricardo Faria (PCdoB), também autor do requerimento, pediu maior apoio da SES aos municípios para aumentar o número de exames e notificações. “As cidades não possuem recursos e precisam ser apoiadas nesse momento. Acho inclusive que podíamos fazer a compra direta de remédios e insumos necessários por meio dos consórcios de saúde”, indicou.

Antônio Carlos Arantes (PSDB) teceu críticas aos governos federal e estadual. “Falta respeito ao cidadão. O governo perdeu o rumo”, pontuou. O parlamentar denunciou também a manipulação de números sobre incidência de dengue, zika e microcefalia. Em resposta, Doutor Jean Freire (PT), que também assinou o requerimento, lembrou que o governo brasileiro firmou convênio com instituições de pesquisa norte-americanas visando a desenvolver uma vacina contra a ação do vírus zika, além de estudos para o combate à dengue e outras doenças. “Não adianta ficar só criticando o governo se cada um não fizer a sua parte”, apontou.

Requerimentos – Antes da reunião, foram aprovados dois requerimentos para novas audiências públicas, ambos de autoria do presidente da comissão, deputado Arlen Santiago (PTB). O primeiro é para debater, com a presença do presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Antônio Júlio de Faria, a situação da saúde pública no Estado. O segundo é para discutir questões ligadas à saúde pública com representantes de todos os órgãos fiscalizadores do Estado.

Consulte o resultado da reunião.