Fundo de recuperação da Bacia do Rio Doce com o dinheiro de multas impostas aos responsáveis pelo desastre está entre as sugestões apresentadas na audiência
Segundo Róbinson Félix, o foco deve ser a garantia de retorno à turbidez da água
Segundo Felisberto Leite (à esquerda), cerca de 130 pescadores de Conselheiro Pena estão sem trabalho

Deputados ouvem sugestões para recuperar Bacia do Rio Doce

Diretor da Cenibra fala dos problemas da empresa com a contaminação da água e do temor em relação à barragem de Germano.

10/12/2015 - 15:10 - Atualizado em 10/12/2015 - 16:47

Criação de um fundo de recuperação da Bacia do Rio Doce com o dinheiro proveniente das multas, aumento da oferta hídrica por meio de recuperação de nascentes, manejo de solo e redução de carreamento (coleta, transporte e disposição) de resíduos no leito. Essas sugestões foram apresentadas como formas de amenizar os problemas hídricos causados pelo rompimento da barragem de rejeitos da mineradora Samarco, em Mariana (Região Central do Estado), durante audiência pública da Comissão Extraordinária das Barragens da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta quinta-feira (10/12/15).

Na oportunidade, o diretor industrial e técnico da empresa Celulose Nipo Brasileira (Cenibra), Róbinson Félix, alertou para os impactos negativos que a contaminação do Rio Doce têm causado à companhia e à comunidade de seu entorno, com perdas financeiras de cerca de R$ 30 milhões por mês, afetando toda a cadeia produtiva (fornecedores, transporte, colheita e produção) e atingido quase 30 mil pessoas, em 54 municípios, em 800 quilômetros de água a ser tratada. Róbinson Félix ainda informou que a Samarco e o Ministério Público já foram alertados sobre esse impacto socioambiental que o desastre causou à Cenibra e às comunidades diretamente ligadas à atividade da companhia.

Róbinson Félix frisou a urgência em garantir para a população que não há risco de rompimento da barragem de Germano e destacou a necessidade de uma proposta preliminar de recuperação e gestão das águas da bacia. Segundo o diretor, o foco deve ser a garantia de retorno à turbidez da água, mas antes é preciso conhecer qual é o material que está no rio e sua quantidade, para avaliar as medidas adequadas a serem tomadas.

O diretor também mostrou-se preocupado com o comportamento dos rejeitos no leito do rio, sobretudo em decorrência do período chuvoso. Por fim, apresentou algumas sugestões para ajudar a limpar a bacia, como, por exemplo, fechar as comportas da barragem de Candonga para usá-la como uma “porteira de contenção”; fazer transposição de alguns trechos e afluentes; construir barragens; e garantir aumento da oferta hídrica por meio de recuperação de nascentes, manejo de solo e mitigação de carreamento de resíduos. Róbinson Félix ainda sugeriu a criação de um fundo de recuperação da Bacia do Rio Doce com o dinheiro proveniente das multas impostas aos responsáveis pelo desastre.

Monitoramento - Segundo o professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Ângelo Márcio Leite Denadai, o Rio Doce, mesmo antes do desastre, já estava em um processo de mortificação. Além disso, de acordo com Ângelo Denadai, as matas ciliares estariam sendo destruídas e as estações de tratamento estariam em más condições e sem manutenção adequada.

“Não creio que a estrutura de todas as estações de tratamento tenha condições de ofertar água confiável. Diante do desastre, a composição química da água deveria ser monitorada diária ou, no mínimo, semanalmente, mas em Governador Valadares não há estrutura laboratorial para fazer os exames, e eles precisam ser realizados para garantir o bem-estar da comunidade”, alertou o professor.

Atingidos questionam falta de reparação

O conselheiro fiscal da Associação de Pescadores de Conselheiro Pena (Vale do Rio Doce), Felisberto de Almeida Nunes Leite, lamentou o fato de não ter mais o seu “ganha-pão”. Segundo ele, até o momento, a Samarco nem sequer esteve no município, onde cerca de 130 pescadores estão sem trabalho. Felisberto ressaltou que a única ajuda recebida foram 25 cestas básicas entregues pela Defesa Civil, que não atendem nem a um terço dos atingidos.

Para o dirigente do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Joceli Jaison José Andrioli, é preciso inserir os atingidos no processo que define a reparação das vítimas que, segundo ele, estaria nas mãos das empresas causadoras do desastre. “Não é a empresa sozinha que deveria definir como se dará essa reparação, é essencial a participação dos principais interessados, os próprios atingidos”, avaliou.

Na audiência, moradores de Resplendor (Vale do Rio Doce) e Bento Rodrigues, emocionados, lamentaram a falta de ações efetivas para reparar os danos, tanto por parte das empresas responsáveis, como do governo.

Deputados alertam para medidas judiciais e requerem providências

A deputada Rosângela Reis (Pros) e o deputado Rogério Correia (PT), que é relator da comissão, chamaram a atenção para as ações judiciais conjuntas de Minas Gerais e Espírito Santo com a União contra as empresas responsáveis, exigindo que sanem problemas ambientais e materiais. Rogério Correia ainda incentivou a participação dos municípios envolvidos, sugerindo que o relatório da comissão proponha ação conjunta também com as prefeituras.

O deputado Agostinho Patrus Filho (PV) lembrou que, em janeiro próximo, haverá uma reunião da comissão com os prefeitos das localidades atingidas. As deputadas Rosângela Reis e Celise Laviola (PMDB), assim como o deputado Gustavo Valadares (PSDB) demonstraram preocupação com o desamparo dos pescadores e de outros profissionais diretamente atingidos, e alertaram a necessidade de dar suporte às localidades que ainda não receberam apoio.

O deputado Bonifácio Mourão (PSDB), por sua vez, quer informações sobre as operações da barragem Minas-Rio, por meio de relatórios enviados à comissão pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, pela Prefeitura Conceição do Mato Dentro e pela própria empresa. O parlamentar quer realizar uma reunião sobre as demandas dos 44 municípios atingidos, com informações da Associação Mineira de Municípios (AMM) e da Frente Nacional dos Prefeitos.

Para Gustavo Valadares, a comissão não deve esperar o relatório final, mas tomar providências pontuais, na medida em que as demandas forem surgindo, como, por exemplo, oficiar as empresas e órgãos do poder público. Ele sugeriu ofício à Samarco/Vale para abordar a situação de desamparo dos pescadores. O relator, deputado Rogério Correia, propôs ofício para que a empresa solicite ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) que faça um levantamento de locais disponíveis no entorno de Bento Rodrigues para proceder à reconstrução do distrito.

Já o deputado Celinho do Sinttrocel (PCdoB) quer uma audiência pública para debater a unificação das ações do Judiciário em Minas Gerais e no Espírito Santo. E a deputada Ione Pinheiro (DEM) pede para que o Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea) participe dos processos de avaliação dos bens afetados pelo desastre.

Os membros da comissão ainda pedem providências da Samarco para que as demandas dos pescadores sejam atendidas e que a empresa apresente um plano emergencial para a limpeza dos rios afetados. Solicitam, ainda, que a Secretaria de Estado de Saúde faça outro plano para regiões afetadas e que a Cemig forneça informações sobre a Usina Risoleta Neves, localizada no município de Rio Doce, assim como requerem uma visita ao local.

Os parlamentares ainda requerem que a Secretaria de Meio Ambiente e a Samarco enviem relatórios da análise de rejeitos na barragem de Germano; que seja feita uma visita à barragem da Usina de Aimorés; que a Samarco apresente um estudo do Incra sobre um local para construção de novo povoado para Bento Rodrigues; e que seja realizada uma audiência pública com as associações comunitárias dos municípios atingidos.

Consulte o resultado da reunião.