Individualidade do aluno é essencial na educação inclusiva
Autoridades e especialistas defendem convivência entre escolas regulares e especiais.
17/09/2015 - 15:10Uma postura mais proativa por parte do Estado na estruturação das escolas e na capacitação de profissionais foi defendida, durante audiência da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), como uma forma de garantir efetivamente a educação inclusiva às pessoas com deficiência. O debate, que aconteceu na manhã desta quinta-feira (17/9/15) com a presença de autoridades e especialistas na área, ainda levantou questões como a coexistência entre as escolas regulares e de educação especial e a necessidade de individualização dos alunos e suas necessidades nos espaços de ensino.
De acordo com a diretora de Educação Especial da Superintendência de Modalidade e Temática Especiais de Ensino da Secretaria de Estado de Educação, Ana Regina de Carvalho, Minas Gerais conta com 34 escolas especializadas, oito delas localizadas em Belo Horizonte. De acordo com a diretora, além dessas unidades, o Estado mantém matrículas para as pessoas com deficiência em 3.200 escolas da rede estadual de ensino, que realizam 1.200 atendimentos educacionais especializados.
No que se refere ao processo de matrícula do aluno, Ana Regina explicou que a orientação do Estado é de que os pais façam o cadastro escolar do estudante. A primeira indicação, segundo ela, é direcionar o aluno para uma escola regular. Caso a instituição de ensino não atenda as necessidades do aluno, há a possibilidade de buscar uma segunda opção.
A diretora ainda explicou que, para que a escola tenha acesso a recursos específicos e a capacitação de profissionais para atender o aluno com deficiência, é preciso fazer uma solicitação à Secretaria de Educação. “Como cada aluno vai demandar determinado tipo de apoio, não temos como, de maneira centralizada, determinar o que vai ser colocado em cada escola. A estrutura da escola não pode ser pensada previamente no atendimento educacional especializado”, explicou.
Sobre essa questão, o deputado Gilberto Abramo (PRB), autor do requerimento para a audiência, questionou a capacitação profissional somente após a demanda da escola diante da matrícula de um aluno com deficiência. “Isso é um erro que vem acontecendo ao longo dos anos e não podemos permitir que se passe mais um governo sem que as necessidades, de fato, venham a ser supridas. Se eu sei que há pessoas com deficiência, para que vou esperar uma solicitação e ter que enfrentar uma burocracia?”, questionou. O parlamentar ainda disse que vai sugerir a criação de uma frente parlamentar em defesa da pessoa com deficiência.
Os deputados Ivair Nogueira (PMDB), Duarte Bechir (PSD), Douglas Melo (PSC) e Paulo Lamac (PT) também reforçaram a importância desse debate. “Temos que chamar a atenção de todos os segmentos da sociedade, para que haja uma participação cada vez mais efetiva sobre o tema”, disse o deputado Ivair Nogueira.
Especificidades do aluno devem ser consideradas no processo de ensino
Ana Regina de Carvalho também disse que a Secretaria de Educação trabalha com um plano de atendimento anual, identificando os estudantes com necessidades especiais já matriculados, bem como os novatos. Ela falou que a legislação impõe às escolas a elaboração de planos de desenvolvimento individualizado para o aluno, a partir do momento em que ele chega à escola.
Segundo a diretora, quando se fala em educação inclusiva, não é possível estabelecer padrões de atendimento. “O cotidiano com o aluno é que vai dar dimensão das adaptações que devem ser feitas para que o atendimento seja o mais adequado possível”, disse.
Ainda de acordo com a diretora, a estrutura da educação inclusiva no Estado tende a responder melhor as demandas que surgem e tem possibilitado a interlocução com as escolas, os profissionais da educação e as famílias. Sob o aspecto legal, ela explicou que a Constituição Federal e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação preveem como pressuposto a matrícula de todos os estudantes com deficiência nas redes de ensino. “Escola não pode negar a guarda a esse estudante. Essa vaga deve ser ofertada o mais próximo à residência do aluno, favorecendo a logística da frequência na escola”, explicou.
Ana Regina ainda disse que a Secretaria de Educação mantém um sistema por meio do qual as escolas podem acionar diretamente a pasta para fazer solicitações de recursos humanos, equipamentos e tecnologias. No entanto, a diretora ponderou que a gestão é complexa, uma vez que a rede de ensino é grande e os municípios do Estado são muitos.
Escolas especiais e regulares devem coexistir
A coexistência entre os modelos educacionais de ensino representados pela escola regular e pela escola especializada foi defendida pelo representante da Comissão de Acessibilidade da PUC Minas Barreiro, Thiago Helton Ribeiro. Para ele, o atendimento educacional especializado é visto como segregacionista, embora, na sua avaliação, os dois modelos tenham a sua função social.
Ele também defendeu que a escolha pela modalidade que melhor atende o aluno com deficiência deve ficar a cargo dos pais e da família. “Só posso garantir a plenitude educacional da pessoa com deficiência se eu permitir que a família participe disso”, afirmou.
O tratamento individualizado a cada aluno dentro da escola, de acordo com sua deficiência e necessidades específicas, também foi defendido por Ribeiro. “Existem tipos de deficiência que não podem ser tratados de forma homogênea. Isso seria violar os direitos das pessoas com deficiência”, completou.
Nesse mesmo sentido, o coordenador especial de Apoio e Assistência à Pessoa com Deficiência da Secretaria de Estado de Direitos Humanos, Participação Social e Cidadania, Romerito Costa Nascimento, disse que as políticas públicas não podem considerar as pessoas com deficiência como um público único. “Precisamos construir uma política da pessoa com deficiência que expresse as necessidades desse público, que apresente as várias realidades e contextos nos quais essas pessoas estão”, avaliou.
O coordenador ainda apontou como desafios a formação de professores que atuam com esse público e a situação de municípios pequenos, que precisam de apoio constante para que seus profissionais sejam capacitados e tenham uma estrutura mínima de trabalho.
Mãe propõe centros de convivência para pessoas com deficiência
A integração entre as duas modalidades de ensino - especial e regular - também foi defendida pela representante das mães e famílias de pessoas com deficiência, Denise Martins Ferreira. “Por que pessoas que não têm deficiência não podem frequentar escolas especiais?”, provocou. Ela também defendeu a existência de centros de convivência, que não seriam substitutos da escola especial, mas sim espaços de acesso à cultura, esporte e lazer.
Denise Martins também considera um problema o fato de as pessoas com deficiência, depois de completarem 17 anos, não terem mais direito à educação formal. Na sua avaliação, esse parâmetro não leva em consideração as pessoas que apresentam, por exemplo, deficiência intelectual. Nesse sentido, ela defendeu que, pelas próprias especificidades que apresentam, essas pessoas tenham direito à educação ao longo de toda a sua vida.
A psicopedagoga especialista em educação inclusiva Cristina Beatriz Monteiro Silveira também defendeu mudanças mais concretas com relação à capacitação profissional nas escolas, para atendimento de alunos com deficiência. “A Secretaria de Educação fala que só oferece capacitação e recursos mediante demanda instalada, na matrícula. Sabemos pela prática que várias crianças chegam sem diagnóstico e é a própria escola e os professores que levantam a demanda”, ponderou a especialista.
Por isso, ela cobrou providências do Estado para que os profissionais de educação estejam preparados para fazer o reconhecimento e o encaminhamento do aluno com deficiência. Cristina Beatriz também sugeriu que se passe a fazer uma avaliação dos profissionais da área, de forma a atrelar o seu desempenho e o trabalho feito junto aos alunos com deficiência a uma remuneração extra. Na sua avaliação, isso poderia ser uma solução para o fato de muitos professores não se interessarem pelas turmas de educação especial.
Requerimentos - Durante a reunião foram aprovados dois requerimentos: do deputado Rogério Correia (PT), para debater a aplicação da Lei 21.710, de 2015, que trata da política remuneratória dos servidores da educação; e dos deputados Paulo Lamac e Celinho do Sinttrocel (PCdoB), para discutir em audiência conjunta com a Comissão do Trabalho, da Previdência e da Ação Social as propostas para o funcionamento regular do Colégio Angélica, em Coronel Fabriciano (Vale do Aço).