Comissão faz diagnóstico para diminuir população de pombos
Maior presença dos animais nas cidades, com risco de doenças, tem preocupado especialistas.
27/08/2015 - 19:46Abrigo, acesso e alimento. Esses são os três pilares do controle ambiental responsável da população de pombos que habitam os perímetros urbanos, conforme apontou o biólogo Carlos Frederico Loiola, membro do Conselho Regional de Biologia. O problema foi tema da audiência pública realizada nesta quinta-feira (27/8/15) pela Comissão Extraordinária de Proteção dos Animais da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
O objetivo dos deputados foi debater metodologias e ações para o enfrentamento responsável do fenômeno, evitando-se com isso a matança desses animais, que podem transportar agentes patológicos. O debate atendeu a requerimento assinado pelos deputados Noraldino Júnior (PSC), presidente da comissão; Geraldo Pimenta (PCdoB), Wander Borges (PSB), João Alberto (PMDB), Ricardo Faria (PCdoB) e pela deputada Ione Pinheiro (DEM).
A disseminação descontrolada de pombos é classificado em muitos países como um grave problema urbano. Além do desequilíbrio ambiental em virtude da competição com outras espécies de aves, suas fezes ameaçam monumentos e edifícios históricos e podem transmitir dezenas de doenças. É o caso, por exemplo, da criptocose, que pode evoluir para meningite; a histoplasmose, que ataca os pulmões; e a salmonelose, com distúrbios gastrointestinais. Por todos esses motivos, se há alguns anos eles eram até tolerados em áreas urbanas, sobretudo como uma atração em praças e jardins, aos poucos têm despertado uma atenção maior das autoridades.
“O problema não são os pombos; são as nossas edificações, que favorecem essas espécies oportunistas. Basta ver a proliferação de ratos e baratas. No caso dos pombos, eles gostam de locais altos, como prédios e igrejas, mas também são veiculadores dos agentes da doença. Mas é preciso esclarecer que não são eles que provocam diretamente as doenças, e controle é diferente de eliminação”, esclareceu Carlos Loiola.
O especialista defendeu a implementação sobretudo de programas educativos e estratégicos para alertar a sociedade sobre as intervenções possíveis. “Existem soluções de fácil implementação, mas na maioria das vezes falta vontade. Elas podem ser barreiras físicas, repelentes ou até mesmo gerador de campo eletromagnético. Também temos dificuldades, por exemplo, com o trabalho em alturas e no uso de ferramentas não agressivas”, completou Carlos Loiola.
Deputados vão cobrar providências
O deputado Noraldino Júnior destacou a importância da discussão e o papel da comissão de cobrar ações do poder público. “Muitos podem achar o tema de pouca importância, mas com a criação desta comissão, recebemos inúmeras solicitações para temas a serem abordados. A questão dos pombos foi um dos mais citados. Também temos recebido pedidos de vários prefeitos, da Secretaria de Educação e até do Ipsemg sobre o mesmo problema em prédios públicos como escolas e hospitais por todo o Estado”, informou.
“É fato que falta informação. Até mesmo as autoridades não sabem bem o que fazer e pediram que as conclusões da comissão sejam enviadas, com sugestões de metodologia para abordar tecnicamente o tema”, alertou o deputado Noraldino Júnior. Segundo o parlamentar, as informações levantadas nesta e em outras audiências futuras darão origem a um diagnóstico e requerimentos de ações do Poder Executivo.
Já a deputada Ione Pinheiro reforçou a necessidade de uma ação em conjunto. “Essa ave simboliza a paz, tem até um apelo religioso, mas também é uma questão de saúde pública. Precisamos coordenar os esforços das áreas de saúde e educação, entre outras esferas da administração pública, pois a maioria das pessoas não têm conhecimento das doenças que podem ser transmitidas. Mas ninguém quer também que eles sejam simplesmente exterminados”, destacou a parlamentar.
Efeito bumerangue - O extermínio dos animais, aliás, é a pior alternativa entre as disponíveis, segundo a presidente do Instituto Vivendi, a médica veterinária Flávia Quadros Campos Ferreira. “A matança não é uma opção, não é eficiente e não é ética. Os que ficaram vão se reproduzir mais e melhor, pois vão contar com mais oferta de alimento e abrigo. Esse efeito bumerangue já é conhecido com ratos na Inglaterra desde o século XIX”, apontou.
A médica veterinária citou uma cartilha de manejo de pombos urbanos preparada pela Prefeitura de São Paulo que poderia ser adotada nas cidades mineiras. Nelas são sugeridas medidas desde a instalação de espantalhos, na forma de predadores naturais dos pombos, até uma maior angulação dos telhados, o que atrapalha o pouso dessa espécie. No caso de aeroportos, por exemplo, em que a disseminação de pombos representa um risco para aeronaves, empregam-se até aves de rapina, treinadas para capturar os animais. O fundamental, segundo ela, é não culpar unicamente os animais.
“Ao se falar de zoonoses, não existe algoz e vítima. As zoonoses não são doenças transmitidas ao homem pelos animais, mas doenças em que ambos sofrem. O controle ambiental é a solução, enquanto alternativas como a contracepção são caras e a dose efetiva é próxima da letal, atingindo não só os pombos, mas outras espécies. Temos que atuar no ambiente. Em escolas, por exemplo, há abundância de alimentos, o que precisa ser resolvido”, advertiu a médica veterinária.
Pesquisa - O chefe do Departamento de Medicina Veterinária da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Adolfo Firmino da Silva Neto, ressaltou que o problema é complexo e, portanto, não há solução fácil e imediata. “Em Juiz de Fora também sofremos com isso. A universidade pode contribuir na busca de informações para dimensionar o problema. Reuniões como essa também podem ajudar nesse diagnóstico”, afirmou.
O diretor-presidente do Movimento de Ação Política e Social, Jairo Hudson, lamentou que o problema esteja se agravando em Belo Horizonte, em áreas como a Região Hospitalar, onde a ameaça é ainda maior em virtude do contato de animais com o lixo hospitalar.
Po fim, o presidente da Comissão de Direitos dos Animais da OAB-MG, Edna Cardozo Dias, ao lembrar do uso do pombo no envio de mensagens e em matanças por esporte, ponderou que a humanidade tem uma “dívida histórica e ética” com esses animais.
Ibirité pede ajuda para solucionar problema
Apesar das dificuldades, a Prefeitura de Ibirité (RMBH) tem priorizado ações de educação e de mobilização social no controle de espécies oportunistas, como é o caso dos pombos. O coordenador de Vigilância em Saúde da Secretaria Municipal de Saúde de Ibirité (RMBH), José Catulino Versiani Neto, cobrou que a Assembleia de Minas também atue no sentido de dar mais recursos e condições técnicas aos municípios.
“Precisamos instrumentalizar os municípios, pois a responsabilidade maior sempre vai cair nas costas deles. O cidadão quer se ver livre do problema e sempre vai cobrar primeiro as prefeituras quanto a isso. As ações precisam ser normatizadas para que possamos atuar com mais eficiência”, ponderou.
Segundo José Versiani, a disseminação dos pombos é um problema diário enfrentado pela Prefeitura de Ibirité. “Temos controle das reclamações e das ações, mas falta uma rotina do Ministério da Saúde. Falta sistematizar essas intervenções”, reclamou. Entre as intervenções já feitas em Ibirité está, por exemplo, a instalação de telas e o enchimento de vigas ocas, sobretudo em escolas, que antes eram usadas como abrigos pelos pombos.
“Mas há questões maiores. A engenharia das escolas é favorável aos pombos e as pessoas gostam de alimentá-los. Eles se aproveitam inclusive de ração para cães, se o acesso for fácil. Um problema semelhante que enfrentamos é com relação aos morcegos, que estão tomando conta das cidades”, afirmou.
A diretora de Pesquisa e Proteção da Biodiversidade da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), Sônia Aparecida Cordebelle de Almeida, explicou que a atuação do órgão está limitada, legalmente, à fauna silvestre. É que, no caso dos pombos, o mais comum é a espécie urbana, originária da Europa, embora o tipo silvestre, devido à destruição do seu habitat, também esteja trocando as matas pelas cidades.
“A orientação que passamos a quem nos procura é o manejo ambiental. Existe mesmo uma carência de informações sobre o assunto e, legalmente, é ate permitido o extermínio, desde que sejam esgotadas todas as outras opções de manejo”, avaliou Sônia Cordebelle.
Governo tem ação limitada
A coordenadora de Zoonoses e Vigilância de Fatores de Risco Biológico da Secretaria de Estado de Saúde (SES), Mariana Gontijo de Brito, diz que a ação do órgão também está limitada pela falta de notificação compulsória de algumas doenças que podem estar associadas aos pombos. “A Secretaria age, na medida do possível, com ações de controle. Os agentes comunitários de saúde podem ser bastante úteis para transmitir essas informações, como já é feito com a questão da raiva, transmitida por cães e morcegos”, lembrou.
Já a referência técnica do Programa das Unidades de Vigilância de Zoonoses da SES, a médica veterinária Andrea Oliveira Dias Temponi, reconheceu que não há um programa específico para lidar com doenças que podem ser transmitidas pelos pombos, a não ser em casos de surtos, quando é possível isolar a causa. “Seria o caso de uma escola, por exemplo, em que o agente patológico é transportado pelo pombo. Nesse caso podemos começar uma ação integrada entre as secretarias e dar uma resposta rápida”, apontou.
“Temos 20 programas de controle de zoonoses, como dengue e leptospirose, que são doenças de notificação compulsória. Mas, às vezes, é preciso avaliar bem o risco porque o aumento da população de determinada espécie nem sempre representa um risco”, completou Andrea Temponi.
E a assessora da Secretaria de Estado de Educação (SEE), Nadélia Amaral Campos, reforçou o interesse do órgão de se unir ao esforço coordenado pela ALMG para resolver o problema. “O que, ao final das discussões, for decidido terá nosso empenho para ser implementado nas escolas, com o apoio das áreas de meio ambiente e saúde”, disse.