Assistência social acumula R$ 1,5 bilhão parado no País
Recursos não utilizados do Suas apontam necessidade de fortalecer apoio técnico aos municípios.
07/08/2015 - 14:40 - Atualizado em 07/08/2015 - 15:28Cerca de R$ 1,5 bilhão destinado à assistência social está parado nas contas dos municípios brasileiros - R$ 539 milhões, ou 36% desse total, estão concentrados na região Sudeste e, somente em Minas Gerais, esse saldo chega a R$ 192 milhões. Os dados foram apresentados pela secretária nacional de Assistência Social do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Ieda de Castro, e pelo secretário de Estado de Trabalho e Desenvolvimento Social, André Quintão, durante o Debate Público Qualifica Suas: Como utilizar os Saldos em Conta da Assistência Social nos Municípios, realizado nesta sexta-feira (7/8/15) pela Comissão do Trabalho, da Previdência e da Ação Social da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Durante o evento, o programa Qualifica Suas, do Governo do Estado, foi oficialmente lançado e foram assinados termos de parceria para a sua execução.
De acordo com o secretário André Quintão, esses recursos, parados nas contas dos municípios mineiros e oriundos do cofinanciamento federal e estadual, chegaram a R$ 201 milhões em dezembro de 2014. Segundo Quintão, essa realidade constatada pela Secretaria de Estado de Defesa Social (Sedese) apontou para a necessidade de fortalecer as ações de apoio e assessoramento técnico aos municípios.
Sobre o Qualifica Suas, o secretário explicou que o programa encontra-se estruturado em quatro eixos de ação. O primeiro deles, considerado neste momento como prioritário, refere-se a um Plano de Apoio Técnico para Indução Orientada dos Gastos e Aprimoramento da Gestão do Suas e visa a orientar os municípios sobre como gastar os recursos de transferências dos Governos Federal e Estadual para a assistência social.
Segundo André Quintão, 29 municípios mineiros respondem por 40% do montante de R$ 192 milhões que estão paralisados nas contas das prefeituras para a assistência social. Além disso, conforme mostrou o secretário, 287 municípios apresentam mais de dez parcelas dos repasses de saldo ou têm um valor superior a R$ 150 mil parados em conta. “Vamos começar a trabalhar por esses municípios, pelos maiores saldos”, afirmou.
Ao falar sobre a importância de uma melhor gestão dos recursos municipais, Quintão considerou que, diante desse montante de recursos parados, é difícil lutar pelo avanço e expansão do financiamento da assistência social. O secretário ainda disse que, apesar do grande montante de recursos parados, é importante considerar que há uma nítida diferença entre as realidades de cada município.
Qualificação - No que se refere ao segundo eixo de atuação do programa, que visa à capacitação de gestores, conselheiros e trabalhadores do Sistema Único de Assistência Social (Suas), Quintão afirmou que, de acordo com o Censo Suas de 2014, somente 54% dos trabalhadores municipais tiveram acesso a cursos de capacitação presencial. O secretário também disse que Minas Gerais está em 19° lugar na questão de pessoal, com 256 servidores da Sedese que atuam na assistência social, contra uma média nacional de 500.
O terceiro eixo do Qualifica Suas trata da criação do Núcleo de Educação Permanente, uma instância responsável pelo diagnóstico e planejamento de ações de capacitação e educação permanente. O último eixo de ação é a Supervisão Técnica aos Trabalhadores do Suas, que se refere às ações de capacitação em serviço para apoiar e acompanhar as equipes de trabalho no desenvolvimento das funções de gestão e provimento dos serviços e benefícios socioassistenciais.
André Quintão ainda afirmou que o Qualifica Suas é um programa de dimensão estratégica e permanente, que consiste em um conjunto de ações planejadas a partir da identificação das fragilidades da assistência social. Segundo ele, o programa vai absorver recursos remanescentes de R$ 6 milhões das contas do Estado, que vão ser aplicados na sua própria realização.
O secretário lembrou que Minas Gerais já está repassando em dia o piso mineiro da assistência social e que todas as regiões terão Centros de Referência Especializados de Assistência Social (Creas) regionais. “Decidimos fazer o repasse do piso para todos os municípios, independente da questão do saldo em conta”, justificou o secretário, que defendeu a decisão como uma maneira de criar a cultura da segurança do repasse.
Objetivos – O Qualifica Suas visa a promover a qualificação e a capacitação continuada dos gestores e trabalhadores; o apoio técnico aos municípios mineiros; a melhoria da infraestrutura das unidades de serviço; o fortalecimento do acompanhamento familiar realizado pelos serviços de proteção e o atendimento integral à família e a inclusão de populações prioritárias (indígenas, quilombolas, população rural e comunidades de assentamentos e ocupações); a melhoria da qualidade dos serviços e benefícios socioassistenciais ofertados à população em situação de vulnerabilidade social; o fortalecimento dos serviços de proteção social especial; o alcance das prioridades e metas de aprimoramento pactuadas entre Estado e municípios; a adequação da gestão e provimento de serviços e benefícios às normas do Suas; e a melhoria dos indicadores do Suas.
Secretária defende aplicação de recursos do Suas
A secretária nacional de Assistência Social do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Ieda de Castro, considerou que o Qualifica Suas é uma estratégia importante para o fortalecimento do pacto federativo no que se refere ao Suas, no sentido em que se recupera a competência de cada ente federado no âmbito da assistência social.
Segundo a secretária, essa descentralização implica que as transferências de recursos devem estar vinculadas à contraprestação de serviços. Ela explicou que essa lógica não pode ser compreendida como uma remuneração ao município, mas sim uma garantia de que o serviço está sendo ofertado. “Por isso, o saldo em conta dos municípios não deve existir. Se tem saldo, temos que refletir sobre a qualidade do serviço ofertado”, explicou.
Ao defender o fim da cultura de saldo na conta do Suas nos municípios, a secretária ainda pontuou como questões a serem analisadas o fato de a não utilização dos recursos do Governo Federal poder prejudicar o cofinanciamento do Suas e também como se justifica o aumento de recursos para a área da assistência social, uma vez que existem tantos recursos parados.
A secretária acredita que, assim como Minas Gerais identificou quantos municípios concentram maior volume de recursos e traçou um plano de ação, cada Estado deverá fazer um trabalho semelhante, de acordo com sua realidade.
Suspensão de repasses - Para otimizar a destinação do cofinanciamento e assegurar que os entes federados possam executar os recursos e continuem gozando do apoio, o Governo Federal faz um monitoramento da execução financeira dos municipios. Segundo Ieda de Castro, enquanto tiver saldo acumulado de 12 parcelas, o município tem a transferência suspensa, até conseguir gastar esse recurso. “Essa foi uma medida drástica, mas necessária. No momento em que o município consegue executar seu recurso, o repasse é restabelecido”, explicou.
Gestão municipal precisa ser fortalecida
Para a presidente do Colegiado de Gestores Municipais de Assistência Social (Cogemas-MG), Júlia Maria Muniz Restori, o saldo existente na conta dos municípios pode significar a fragilidade na gestão e a ausência de um gestor devidamente capacitado. “Se o recurso em conta significa fragilidade no serviço, estamos comprometendo nossa meta de ofertar serviços de qualidade, com atendimento digno. Precisamos resolver essa questão do saldo para avançar na busca de mais recursos para a área”, considerou. Ao defender o fortalecimento das gestões municipais, ela ainda disse que a importância da política de assistência social deve ser compreendida a partir da sua perpspectiva cidadã.
A presidente do Conselho Estadual de Assistência Social (Ceas), Maria Alves de Souza, considerou que o Quaifica Suas marca a história da assistência social no Estado. “Além da qualificação proposta, é um momento em que se constrói uma gestão com os municípios”, disse.
O presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Antônio Júlio, pontuou que, em um momento em que os municípios vivem dificuldades, é assustador saber que recursos na ordem de R$ 200 milhões encontram-se parados nas contas. Para ele, é importante chamar a atenção dos prefeitos para essa retenção de recursos e para a necessidade cada vez maior de ser competente na sua gestão.
O presidente da Comissão do Trabalho, deputado Celinho do Sinttrocel (PCdoB), lembrou que a política nacional de assistência social se insere nas políticas públicas que visam garantir a universalização de direitos, destinada a populações que se encontram em situação de risco social. Ele destacou que, com o Qualifica Suas, o Estado se aproxima dos municípios, que acumulam recursos de anos anteriores que se encontram parados. “O desemprego crescente é uma porta aberta ao empobrecimento da população e ampliação de mazelas sociais. Enquanto a crise é superada, politicas de mitigação são imprescindíveis, e uma delas envolve a proteção social básica”, destacou o parlamentar.
A deputada Geisa Teixeira (PT) lembrou que o Suas foi criado há dez anos, durante o governo Lula, e que, desde então, muitos avanços foram observados, como a inclusão social de milhões de pessoas que viviam abaixo da linha da miséria. Apesar disso, ela ressaltou a importânca de capacitar os profissionais da assistência social. “Como assistente social, é uma alegria ver que estamos hoje nos mobilizando em torno de uma causa nobre e justa, voltada para os municípios”, disse.