Durante a reunião, foram feitos inúmeros relatos sobre as dificuldades que as famílias beneficiárias passaram a enfrentar desde que a bolsa Caade foi suspensa
Segundo Leonardo Nader (à direita), a bolsa Caade contempla pouco mais de 270 pessoas no Estado
Bertolo Oliveira sugeriu vincular o pagamento da bolsa a um programa social já em curso

Mães querem retomada imediata de bolsa para alunos especiais

Suspensão de auxílio educacional concedido a pessoas com necessidades especiais motiva audiência pública.

29/06/2015 - 20:12 - Atualizado em 30/06/2015 - 15:57

Em busca de soluções para o impasse criado com a interrupção da bolsa Caade – auxílio educacional concedido a pessoas com necessidades especiais –, mães e responsáveis pelos beneficiários lotaram o Auditório da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) na tarde desta segunda-feira (29/6/15). Eles participaram de audiência pública conjunta das Comissões de Assuntos Municipais e Regionalização e de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência e cobraram do Governo do Estado a imediata retomada do pagamento do benefício.

Durante a reunião, foram feitos inúmeros relatos sobre as dificuldades que as famílias beneficiárias passaram a enfrentar desde que a bolsa foi suspensa, em janeiro deste ano. Muitas famílias carentes estariam se endividando, pois teriam assumido a educação especial com seus próprios recursos, sem condições de arcar com tais despesas.

O valor da bolsa, criada há quase 20 anos, varia conforme o grau de deficiência do aluno. Os representantes do Governo do Estado, contudo, esclareceram que a intenção não é cortar o pagamento, mas fazer um estudo minucioso da situação, estabelecendo critérios que beneficiem um maior número de famílias e atendam ao Estado como um todo.

Atualmente, o benefício contempla pouco mais de 270 pessoas, a maioria (79%) concentradas em Belo Horizonte, segundo informou o subsecretário de Estado de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, Leonardo Soares Nader. “Somando o município de Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), que recebe cerca de 10% dos recursos, esse índice chega a quase 90%”, observou o subsecretário, que também é pai de uma criança de dois anos com síndrome de Down.

Para ele, não é justo que, num Estado com 853 municípios, apenas uma parcela pequena da população, concentrada na Capital, seja contemplada com a bolsa Caade, assim chamada por ser concedida, com recursos da Loteria Mineira, por meio da Coordenadoria Especial de Apoio e Assistência à Pessoa com Deficiência (Caade). Soares também denunciou que a prática adotada durante muito tempo para a concessão das bolsas seria por meio da interferência de “agentes políticos” (por indicação). A proposta agora, explicou, é definir critérios mais inclusivos, a partir da constituição de um grupo de estudos.

Segundo ele, o atual governo já quitou as parcelas referentes ao ano de 2014, que totalizavam um valor superior a R$ 380 mil. Nader afirmou ainda que já está sendo elaborada, junto ao secretário de Estado de Direitos Humanos, Nilmário Miranda, a constituição de um grupo técnico de trabalho para estudar um possível formato e estrutura legal do benefício de auxílio financeiro.

Outro que falou em nome do governo foi Ronaldo José Senna Camargo, superintendente de Políticas de Assistência Social da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese). Ele lembrou que no governo anterior a bolsa Caade era vinculada à Sedese. Com a reforma administrativa, o benefício foi transferido à recém-criada Secretaria de Direitos Humanos.

Contudo, Ronaldo garantiu que a assistência social não está omissa. “O que não podemos é limitar o atendimento apenas a 270 famílias, pois políticas públicas não podem ser feitas para poucos, mas devem abranger o maior número possível de pessoas. O que o governo quer não é suspender a bolsa, mas ampliar o número de atendimentos”, assegurou, acrescentando que a Sedese está à disposição para colaborar com a Secretaria de Direitos Humanos e dialogar com os pais e responsáveis pelos alunos especiais, em busca de uma solução.

Procurador diz que há um “vácuo legal”

Para o coordenador das Promotorias de Defesa das Pessoas com Deficiência e Pessoas Idosas, procurador Bertolo Mateus Oliveira Filho, desde que foi criada, há quase 20 anos, a bolsa Caade convive com um “vácuo legislativo, porque jamais se vinculou a qualquer lei”. Ele explicou que o Ministério Público não proibiu ao Estado o pagamento da bolsa, mas disse que é dever do órgão empenhar-se pela legalização dos repasses. Segundo ele, a falta de regulamentação legal preocupa o Estado e levou ao atraso no pagamento.

“A situação terá que ser equacionada politicamente”, disse o procurador, que, entretanto, admitiu a importância de solucionar a questão dos pagamentos aos antigos beneficiários, garantindo a inclusão de novos. Em termos legais, ele não acha difícil equacionar o problema, bastando vincular o pagamento da bolsa a um programa social já em curso. Defendeu, por isso, uma discussão política entre o Governo do Estado e a Assembleia Legislativa.

Deputados se solidarizam com pais

O presidente da Comissão de Defesa das Pessoas com Deficiência, deputado Duarte Bechir (PSD), leu carta endereçada à comissão, escrita por Márcia Brandão Magalhães, mãe de um aluno especial, em que a remetente cobra providências urgentes do governo, alegando as dificuldades por que vêm passando as famílias que, de uma hora para outra, deixaram de receber o benefício.

Ele se solidarizou com a luta dos pais e responsáveis e lembrou que em outra audiência pública, realizada em 21 de maio, a comissão pediu ajuda ao secretário de Direitos Humanos, Nilmário Miranda, para solucionar o problema o mais rápido possível, mas, até aquele momento, o impasse permanecia.

O presidente da Comissão de Assuntos Municipais, deputado Fred Costa (PEN), que, juntamente com o deputado Duarte Bechir, assinou o requerimento da audiência, disse que a bolsa não é uma benesse do Estado, mas uma conquista dos pais, mães e responsáveis pelos alunos especiais. “Sabemos que não dá para atender a todas as famílias, mas é fato que 95% dos que são atendidos hoje têm total necessidade de receberem esse auxílio. É a necessidade que faz com que essas famílias procurem o amparo do poder público, que não faz mais que a sua obrigação”, frisou.

Também presente à reunião, o deputado Antônio Carlos Arantes (PSDB), disse que a retomada do benefício é uma questão de prioridade. Na sua opinião, atualmente há uma inversão de valores. "O governo deveria fazer o seu papel e o voluntariado completar, e não o contrário”, disse.

Pais e familiares cobram agilidade do governo

Um dos fundadores da Associação de Pais e Amigos de Pessoas Especiais (Apape), Rogério de Araújo Souza, defendeu a urgente necessidade de estabelecer critérios que regularizem a concessão dos auxílios financeiros a famílias que possuem pessoas com deficiência. Ele lembrou algumas reuniões já promovidas pelo Conselho Estadual de Defesa dos Portadores de Deficiência (Conped), destacando a baixa participação do Governo do Estado à época.

"Em dezembro do ano passado, nos reunimos para discutir a questão e a área governamental não compareceu. Foi um boicote, para não dar quórum à reunião", acusou.

Rogério Souza ainda chamou a atenção do poder público acerca dos problemas que o corte do subsídio poderia acarretar. "É necessário realizar um estudo para avaliar as consequências da retirada da bolsa para as vidas das pessoas. Dessa forma, elas poderiam comprovar a necessidade de receber o auxílio e reivindicá-lo junto ao Ministério Público", afirmou.

Assim como Rogério Souza, Márcia Brandão Magalhães, mãe de um jovem com transtorno do espectro autista, apontou dificuldades relacionadas à questão financeira. "Devido à precariedade de escolas municipais e estaduais especializadas, temos que recorrer a instituições privadas. Com o corte das bolsas, muitas famílias se endividaram", lamentou.

Mãe de uma jovem com necessidades especiais, Cláudia Viana Bhering apresentou documentos que certificavam os auxílios recebidos por órgãos como a Loteria Mineira e a Caade. "Há 17 anos recebo o recurso. Nos contratos, há rubricas e assinaturas do governo e da Sedese. Como o Ministério Público pode afirmar então que existe um vácuo legal?", questionou.

A diretora da Associação Família Down, Luzia Zolini, criticou o projeto Atendimento Educacional Especializado. Segundo ela, as pessoas com deficiência necessitam de auxílio escolar por um maior período de tempo, não só na infância e juventude.

Já Norma Duarte Gonçalves, também mãe de aluno especial, defendeu o governo atual e indagou por que os presentes não questionaram a legalização da bolsa nos 20 anos anteriores.

Moradora de Ibirité (Região Metropolitana de Belo Horizonte), Maria Aparecida de Faria Quaresma, mãe de uma criança autista, declarou estar passando por grandes dificuldades devido à falta de repasse dos pagamentos devidos. Segundo ela, para continuar o atendimento ao filho em escola especial, os recursos têm saído do salário do marido, que é cobrador.

Jane Geralda de Almeida, mãe de aluna com deficiência física e autismo, beneficiária da bolsa Caade desde 2000, admitiu que só conseguiu o benefício graças à intervenção de um deputado, confirmando o que já tinha sido mencionado pelo subsecretário Leonardo Nader.

Márcia Gontijo pediu a intervenção dos deputados na elaboração de lei capaz de levar o governo a resolver o problema.

Deputados vão cobrar providências

No encerramento da reunião, o deputado Duarte Bechir apresentou, entre outras propostas, a realização de uma visita conjunta das duas comissões à Secretaria de Direitos Humanos, com a participação de um representante de pais e alunos, a fim de cobrar agilidade na retomada dos pagamentos.

Também disse que vai encaminhar ofício à Coordenadoria de Defesa dos Direitos da Família e ao Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa dos Direitos dos Idosos e das Pessoas com Deficiência, para que se manifestem sobre o atraso e cobrem o pagamento por parte do governo. As comissões vão apreciar os requerimentos nas próximas reuniões.

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