Pais questionam atendimento da Prefeitura de BH a autistas
Reunião retoma debate sobre autismo, iniciado no dia 14/4, na Comissão de Defesa da Pessoa com Deficiência.
28/04/2015 - 20:39Apesar de contar com uma rede de serviços na saúde mental, que pode servir como modelo para outras cidades do País, Belo Horizonte apresenta ainda muitas falhas no atendimento aos usuários, especialmente quando se trata de pessoas com transtorno do espectro autista (TEA). Essa foi a principal conclusão da audiência pública que a Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizou nesta terça-feira (28/4/15). A reunião, solicitada pelo presidente da comissão, deputado Duarte Bechir (PSD), deu prosseguimento a outra, no dia 14 de abril, que iniciou o debate sobre a necessidade de conscientização sobre os TEAs e de ampliação das políticas públicas para esse público.
Depois de ouvir o relato de servidoras da Prefeitura sobre o atendimento às pessoas com TEA, Marcela Bracarense, mãe de uma criança com o transtorno, disse que nada do que foi mostrado funcionou no caso dela. Ela afirmou que o serviço de saúde municipal não conseguiu diagnosticar o transtorno do seu filho. “Até os dois anos de idade do meu filho, eu frequentava o posto de saúde, mas eles não detectaram nada”, criticou, acrescentando que foi obrigada a procurar a rede particular, para então conseguir o diagnóstico correto para a criança, que hoje tem 4 anos e meio.
No caso dele, a síndrome se manifestou de três formas: com atraso no aprendizado da fala, dificuldade de relações interpessoais e alergia alimentar. “As funcionárias da Prefeitura disseram que hoje existe o diagnóstico a tempo. A tempo de que? Onde está meu filho nessa rede?”, questionou Marcela.
Situação pior viveu Gisele Silva, mãe de uma menina com TEA e usuária do Centro de Saúde da regional Pampulha. Diferentemente de Marcela Bracarense, ela salientou que não tinha e não tem condições de pagar pelo atendimento médico e depende totalmente do sistema público de saúde. Segundo ela, o diagnóstico do transtorno foi tardio, porque o atendimento especializado da PBH é muito falho. Complementou que no posto onde sua filha é atendida o espaço é mínimo, correspondendo ao tamanho do banheiro da sua casa.
Diagnóstico precoce - O presidente do Instituto Superação e vice-presidente da Associação Brasileira para Ação por Direitos das Pessoas com Autismo (Abraça), Maurício da Silva Júnior, arrematou as críticas. Ele lembrou que o diagnóstico precoce do autismo é um direito garantido pela Lei Federal 12.764, de 2012, e por lei municipal de Belo Horizonte. Mesmo com essa garantia legal, não é o que acontece na prática, ponderou.
Pai de dois filhos com autismo, Maurício Júnior registrou que o diagnóstico correto dos dois só foi feito na rede particular, na qual também é realizado o tratamento. Ele relata que a abordagem adequada do problema de seu filho Maxwell propiciou uma grande evolução no desempenho dele. “Hoje, meu filho se comunica perfeitamente, estuda em escola regular”, comemorou.
O dirigente reconheceu o esforço da PBH no atendimento a esse público, mas reforçou que falta qualificar melhor as equipes. Também defendeu a ampliação da rede de saúde mental.“A rede é boa, o problema é que o serviço não chega”, criticou. Nesse ponto, ele sugeriu a adesão ao projeto federal Viver sem Limite, que permitiria a ampliação de pontos de atendimento. Outro problema apontado foi a descontinuidade dos serviços. “O serviço terceirizado nós não queremos. Precisamos do serviço público, permanente”, diagnosticou.
PBH apresenta sua rede voltada para a saúde mental
Na primeira parte da audiência, profissionais da PBH apresentaram a rede de atendimento a saúde mental. Janete dos Reis Coimbra, coordenadora de reabilitação da Pessoa com Deficiência da Secretaria Municipal de Saúde, disse que toda a concepção de atendimento leva em conta a inclusão social das pessoas com deficiência mental e também daquelas com TEAs. E toda a política pública da área tem como carro-chefe o centro de saúde, a partir do qual operam as equipes de saúde da família. De acordo com ela, as equipes do PSF é que têm conhecimento da realidade das famílias e, quando julgam necessário, acionam outras áreas.
Janete Coimbra enfatizou que no caso da Capital, 83% da população usa os centros de saúde. Atualmente, o município conta com 587 equipes do PSF, incluindo médico, enfermeiro, auxiliar de enfermagem e agente comunitário de saúde. Há ainda 58 equipes nos núcleos de apoio a saúde da família com 400 profissionais das áreas de terapia ocupacional, fonoaudiologia, fisioterapia, psicologia, assistência social, nutrição, farmácia e educação física. E também nove equipes complementares de atenção a saúde mental da criança e do adolescente (uma equipe por distrito, cada uma com psiquiatra, terapeuta ocupacional e fonoaudiólogo).
A coordenadora destaca que no centro de saúde, quando é detectado algum caso suspeito ou diagnóstico de TEA, o paciente é encaminhado para atendimento pela equipe complementar de saúde mental ou para equipes de reabilitação. E para os serviços de suporte a esse público, a PBH oferece oito centros de referência em saúde mental (Cersams), um Cersami (que é um Cersam infantil) e três centros de reabilitação especializados (Creab).
Sobre o diagnóstico a tempo, a servidora afirmou que, quando são observados em bebês sinais de sofrimento psíquico, dificuldades de laço com semelhantes, dentre outras características, o centro de saúde já faz o encaminhamento da criança para atendimento especializado. “O objetivo é intervir o mais cedo possível, minimizando os efeitos de quadros graves como autismo e psicose infantil”, concluiu.
Resposta às críticas - Em relação às críticas, Janete disse que Belo Horizonte tem 2,8 milhões de pessoas e provavelmente, há furos na política de saúde mental. Mas, pediu os nomes dos pais das crianças com autismo que participaram da reunião, para que possa encaminhar seus atendimentos no serviço de saúde.
Já a terapeuta ocupacional da equipe complementar de saúde mental da PBH, Cláudia Oliveira Messias, justificou que até há poucos anos havia grande desconhecimento quanto ao diagnóstico correto do autismo. Isso melhorou muito atualmente, segundo ela, apesar de observar que há critérios diferentes de diagnóstico. “Na verdade, são vários autismos, uns diferentes dos outros”, vaticinou. Outra questão diz respeito à reação ao tratamento pelos pacientes, com cada um reagindo de uma forma à abordagem ministrada, uns apresentando grandes avanços, outros menos.
A coordenadora de saúde mental da PBH, Patrícia Carla Gomes, concordou com a crítica de que não adianta ter um serviço especializado sem ter o profissional adequado. “Temos que qualificar mais a equipe atual, e ampliar a rede. De fato, há uma distância entre aquilo que está definido e o que chega à população”, consentiu. Quanto aos locais de atendimento, também assumiu que “há espaços que precisam ser melhorados e muito”.
Conferência municipal - Na conclusão da audiência, Duarte Bechir ofereceu o espaço da ALMG para que seja realizada a abertura da Conferência Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência, no dia 28 de maio. Para ele, seria uma forma de a comissão contribuir com as discussões e divulgá-las a todo o Estado. Bechir vai apresentar requerimento sobre o tema na próxima reunião da comissão.
Foi também mostrado na reunião um vídeo abordando o trabalho do Centro Especializado Nossa Senhora D´Assumpção (Censa- Betim), que atende a autistas. O material foi trazido pela diretora da entidade, Natália Inês Costa.