Moradores de favelas cobram maior presença do poder público
Debate público da Comissão de Direitos Humanos marca comemoração do Dia Estadual da Favela.
08/09/2014 - 13:13 - Atualizado em 08/09/2014 - 14:28O estímulo para a geração de emprego, renda e empreendedorismo e a presença do poder público nas favelas foram a principais reivindicações dos moradores dos aglomerados urbanos no Debate Público Sou Favela Uai, promovido pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) na manhã desta segunda-feira (8/9/14). O evento, solicitado pelo presidente da comissão, deputado Durval Ângelo (PT), teve como objetivo marcar a comemoração do Dia Estadual da Favela, a ser celebrado no dia 4 de novembro.
O deputado Durval Ângelo é autor do projeto que originou a Lei 20.808, de 2013, que criou essa data comemorativa. Na abertura dos debates, ele destacou que a favela é uma realidade que se consolidou nos centros urbanos brasileiros após a abolição da escravatura. Segundo ele, aos negros foram reservados espaços isolados, de opressão e exclusão, que hoje são locais com regras próprias e rica produção cultural. “A Lei 20.808 valoriza o sonho de ser feliz daqueles a quem a sociedade tudo negou. E é isso que vemos também nos acampamentos de sem-terra e sem-teto e nos quilombos por todo o Estado”, disse.
O presidente da Central Única das Favelas (Cufa), Francisco José Pereira de Lima, acrescentou que a abolição da escravatura foi um despejo institucional de pessoas que, excluídas, foram formar as favelas. Para ele, hoje a favela procura sair de sua invisibilidade social para pautar as políticas públicas. “Nos últimos dez anos esses locais vêm interferindo diretamente na economia do País. Geramos um gasto anual de R$ 64 bilhões no mercado de consumo, o que reforça nossa importância e nos credencia a participar cada vez mais das decisões”, salientou.
De acordo com coordenador regional da Cufa, Francislei Henrique Santos, em Minas Gerais 600 mil pessoas vivem em favelas, sendo que em Belo Horizonte está mais da metade dessa população. “Estamos planejando ações artístico-culturais e de empreendedorismo para celebrar o Dia da Favela, com a intenção de se criar uma imagem positiva e transformadora”, informou.
Exclusão e preconceito ainda são realidade nas favelas
O defensor público Hélio da Gama e Silva lembrou o estudo “O Mapa do Fim da Fome”, feito pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), que revelou que os moradores das favelas trabalham mais e têm menos escolaridade que os que vivem em outros bairros das grandes cidades. Segundo ele, esse levantamento também constatou que os habitantes das favelas pagam os mesmos impostos que outros moradores das cidades, mas não têm o mesmo retorno do Estado em serviços de infraestrutura. “Quem mora no morro paga imposto para beneficiar quem mora no asfalto”, alertou. Para o defensor, há uma dívida do poder público com essa população, e por isso, ele defendeu a criação de uma lei que obrigue, por exemplo, a presença da Defensoria Pública nas favelas.
O conselheiro da Cufa Celso Athayde destacou que a favela sempre foi considerada local de anonalias e vista com preconceito pela sociedade. Segundo ele, hoje são 14 milhões de pessoas vivendo nas favelas brasileiras. “Precisamos de oportunidades para democratizar as riquezas e criar políticas públicas para as favelas. As pessoas estão entendendo que os moradores das favelas têm potencial de consumo, o que cria um novo olhar sobre esses locais. Há empresas indo para dentro das favelas com a contrapartida da geração de emprego, renda e oportunidades”, explicou.
Falta estímulo para o empreendedorismo
O sócio da Favela Holding, Elias Tergilene, exaltou a importância da favela como fonte de empreendedores e pessoas que buscam mudar a realidade. Para ele, a legislação não favorece esses empresários e potenciais profissionais autônomos que vivem nos aglomerados urbanos. “Por meio do empreendedorismo, é possível reduzir as desigualdades sociais. Para isso, no entanto, é preciso estimular e regularizar as pessoas que querem empreender”, completou.
A líder comunitária da Pedreira Prado Lopes, Valéria Borges Ferreira, disse que o Dia da Favela não pode ser apenas de comemoração, sem a devida reflexão sobre os problemas e a exclusão social das pessoas que vivem ali. Segundo ela, o Estado afirma que educa e oferece direitos, mas a realidade é diferente. “A gente tem voz, mas não tem vez. Temos que tomar posse dos nossos direitos. Estou feliz pela lei, mas queremos que todas as normas sejam cumpridas”, pediu.
Ao final da reunião, o fundador da Rádio Favela, Misael Avelino dos Santos, lamentou o preconceito que os moradores das favelas sofrem em todo o País e a ausência de políticas públicas do Estado nesses locais.
Providências – O deputado Durval Ângelo anunciou que pretende aprovar requerimentos na Comissão de Direitos Humanos relativos à participação da ALMG em ações e projetos de estímulo ao empreendedorismo nas favelas e à criação de lei que obrigue a existência de uma defensoria permanente nas favelas.
Ele também pretende pedir à Polícia Militar a retomada das audiências públicas sobre abordagem policiais nas favelas; à Secretaria de Estado de Saúde, a instalação de unidades de pronto-atendimento no Aglomerado da Serra, em Belo Horizonte; e à Prefeitura de Belo Horizonte, que sejam feitas obras de pavimentação nas favelas da Capital.