Gastos com segurança trazem dificuldades para municípios
Representantes municipais relatam sobrecarga provocada por convênios com órgãos do sistema de defesa social do Estado.
22/05/2014 - 18:15A sobrecarga de municípios mineiros com o sistema de defesa social foi a principal questão abordada em audiência pública da Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizada nesta quinta-feira (22/5/14). Um dos exemplos foi dado pelo município de Ribeirão das Neves, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), considerada a terceira cidade do País em vulnerabilidade socioeconômica por pesquisa de 2013 do Fundo Nacional de Prefeitos.
Em entrevista, o secretário municipal de Segurança, Trânsito e Transporte de Ribeirão das Neves, Luiz Carlos Godinho, relatou que a Secretaria despende cerca de 80% de seu orçamento anual para arcar com convênios com órgãos do sistema de defesa social estadual. Pela Constituição Federal, a segurança pública é responsabilidade de cada Estado.
O secretário municipal citou compromissos anuais de R$ 330 mil com a Polícia Militar, R$ 630 mil com a Polícia Civil, R$ 96 mil com os Bombeiros, R$ 1,3 milhão com atendimento a presos e R$ 172 mil com o Centro de Prevenção à Criminalidade. “Investindo nesse sistema, deixamos de investir em áreas como saúde, educação e também na nossa guarda municipal”, enfatizou.
O prefeito de Florestal (RMBH), Herbert Fernando Martins de Oliveira, contou que a prefeitura paga combustível, cede funcionários e compra insumos para a polícia local. Oliveira enfatizou que, atualmente, a prefeitura investe na implantação de câmeras na cidade. Ele fez um apelo à Polícia Militar para que intervenha na situação, pois o município de pouco mais de 6 mil habitantes não é mais pacato. “Hoje, a cidade é a segunda que mais cresce em violência no Estado”, relatou.
Já o prefeito de Prudente de Morais (Região Central do Estado), Padre José Roberto Filho, explicou o convênio entre a Polícia Militar e o município. Ele enfatizou que a prefeitura fornece o prédio para sediar o destacamento; arca com despesa com água, luz, telefone e internet; e cede servidores. “Isso onera cada vez mais a cidade”, enfatizou.
Para Padre José Roberto, a prefeitura poderia contribuir com a segurança, investindo em iluminação de locais com maior índice de crimes e com políticas públicas. “Não tem sido dadas à Polícia Militar as devidas condições para que exerçam bem seu trabalho”, concluiu. Ele disse ainda que tem sido constantemente procurado para firmar convênio com o Corpo de Bombeiros.
Demais lideranças municipais presentes ressaltaram a necessidade de revisão dos convênios entre cidades e o sistema de defesa social.
Deputados enfatizam necessidade do debate
O presidente da comissão, deputado Paulo Lamac (PT), que foi o autor do requerimento que deu origem à reunião, explicou que a comissão deve discutir a imensa carga atribuída aos municípios no sistema de segurança, responsabilidade do Estado. “Recentemente, as cidades tiveram que arcar com serviços que não são essencialmente de sua responsabilidade, como a manutenção da iluminação pública, entre outras questões”, salientou. Ele enfatizou que cada ente federado tem as suas responsabilidades e que deve se responsabilizar por elas, independentemente da questão partidária.
Para o deputado Cabo Júlio (PMDB), quase todas as prefeituras contam, atualmente, com poucos recursos e muitas responsabilidades. “A União faz pouco em relação à questão da segurança”, enfatizou. Ele também defendeu que o Estado avançou muito na questão da segurança nos últimos anos. “Temos que ampliar a discussão e entender que a saída é o trabalho conjunto entre município, Estado e União”.
Já o deputado Sargento Rodrigues (PDT) destacou a importância da discussão. Ele relembrou que, em 2006, a ALMG realizou o Seminário Legislativo Segurança para Todos, que abordou esse assunto. “Naquela ocasião, concluímos que não há como efetivamente colocar em prática todas as ideias para melhorar a segurança pública se não há orçamento vinculado e uma política duradoura”, colocou.
De acordo com o parlamentar, é fato que hoje muitos municípios ficam sobrecarregados com ações na área como compra de combustível, material de escritório e limpeza, conserto de viaturas e reforma de quartel. Para ele, se isso perdura por muito tempo, a força policial pode ficar submetida à gestão municipal.
O deputado Rogério Correia (PT) enfatizou a relevância do assunto. “Todo o lugar que visito, há relatos de aumento da violência, falta de efetivo da Polícia Militar e de estrutura. Isso é um consenso. O Estado descarrega para o município a responsabilidade de investimento na segurança”, disse.
O deputado Adelmo Carneiro Leão (PT) afirmou que Minas Gerais tem se posicionado contra a concentração tributária em benefício da União e, também por isso, não poderia submeter as prefeituras. “As relações são onerosas também em outras áreas, como educação, como transporte escolar, como a saúde, uma vez que não se aplica o mínimo na área”, enfatizou.
Representante da PMMG destaca importância de convênios
Para o tenente coronel Antônio Marcel Alves, que representou o Comando da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG), ninguém faz segurança pública sem orçamento. “Se todos os municípios que cooperam com a segurança tirarem esse aporte, como vamos fazer? É uma questão orçamentária”, questionou.
Ele ainda acrescentou que essa situação não é imposta aos municípios, mas que se trata de um convênio de cooperação mútua. “Quando o prefeito disser que não pode manter o convênio, a polícia vai arcar com isso para que não haja prejuízo para a população”. Alves relatou que a dependência em relação às cidades tem diminuído ao longo dos anos. Uma ideia para compensar os municípios, segundo o tenente, seria o Estado atribuir algo às cidades que corresponda ao que foi investido em segurança.
Comandante-geral do Rio Grande do Sul relata experiência do Estado
O comandante-geral da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, coronel Fábio Duarte Fernandes, discorreu sobre a experiência do Estado nesse sentido. Fernandes explicou que o Rio Grande do Sul tem 497 municípios, com 26 mil policiais na ativa para uma população de 11 milhões. Ele explicou que não há nenhum convênio no estado do Rio Grande do Sul para custeio das brigadas que ficam nas cidades. “Abastecimento de combustível é feito a partir de um cartão. O estado tem o seu planejamento. Há uma cota e cada batalhão abastece. Quando ultrapassa a cota, é licitado e o governo paga”, contou.
Fernandes disse que, desde 2011, são desenvolvidas duas ações que dão importante resultado. Uma delas é o policiamento comunitário, que foi implementado em 120 cidades. Trata-se de um convênio entre município e Estado, pelo qual são identificados os bairros com maior índice de violência. Um policial da brigada passa a residir no local e isso é custeado pela prefeitura, o que fica entre R$ 600 e R$ 800.
Segundo eles, alguns municípios também pagam o valor de uma bolsa para esse policial, o que não é uma exigência da brigada. Para o comandante, isso permite que o policial conheça as vulnerabilidades do local. Outra ação é o videomonitoramento regionalizado, o que tem diminuído os índices de criminalidade.
Requerimento – O deputado Paulo Lamac disse que vai encaminhar pedido de informações sobre quais municípios têm convênios com o sistema de defesa social do Estado e os valores desses convênios.