Mineroduto no Norte de Minas gera controvérsia
Ambientalistas e representantes de mineradora discordam sobre os benefícios do empreendimento para a região.
09/04/2014 - 15:35 - Atualizado em 09/04/2014 - 16:10Os possíveis impactos ambientais e desapropriações relativas ao empreendimento Projeto Vale do Rio Pardo, no Norte de Minas, dividiram opiniões na manhã desta quarta-feira (9/4/14) durante audiência pública da Comissão de Meio Ambiente e de Desenvolvimento Sustentável da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). O projeto integrado da empresa Sul Americana de Metais (SAM) consiste em mina, usina de concentração e mineroduto, cujo objetivo é levar minério para Ilhéus, na Bahia. Em Minas, o mineroduto passará por nove municípios do Norte do Estado: Águas Vermelhas, Berizal, Curral de Dentro, Fruta de Leite, Grão Mogol, Novorizonte, Padre Carvalho, Salinas e Taiobeiras.
De um lado, representantes da empresa defenderam o empreendimento, sob a justificativa de que ele vai trazer desenvolvimento e emprego para a região; e, de outro, Ministério Público, ambientalistas e representantes da comunidade criticaram o mineroduto, questionando as condições do licenciamento ambiental e alegando desaprovação da população local.
Como parte do processo, em janeiro deste ano o Governo do Estado publicou o Decreto com Numeração Especial 30, que é de utilidade pública, para desapropriação de pleno domínio ou constituição de servidão de terrenos nos nove municípios afetados pelo empreendimento. O mineroduto terá a extensão de 482 km e atingirá 12 cidades na Bahia. Atualmente, o projeto está em fase de estudo de viabilidade ambiental.
O diretor de Relações Institucionais da SAM, Geraldo Magela Gomes, apresentou números de Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e de vulnerabilidade da pobreza dos municípios afetados pelo empreendimento. Ele mostrou que esses dados estão entre os piores do Estado e ponderou que o Projeto Vale do Rio Pardo trará desenvolvimento e melhorias para os municípios, entre eles a geração de 9 mil empregos indiretos e 2 mil diretos. “Nós estamos buscando o desenvolvimento do Norte de Minas”, afirmou.
Como exemplo de geração de riqueza do projeto, Geraldo Magela disse que os recursos arrecadados com impostos em Grão Mogol, por meio da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Mineira (Cfem), vão aumentar em R$ 65 milhões. Atualmente, essa arrecadação é de R$ 8 milhões.
O autor do requerimento para o debate, deputado Rogério Correia (PT), destacou a preocupação da população da região, principalmente por causa da publicação do Decreto 30, que pode desapropriar terras da região. Ele perguntou quem vai pagar essas desapropriações e quais serão os efeitos desse empreendimento para a região.
Em resposta, Geraldo Magela disse que não haverá desapropriação no mineroduto, e sim negociação do direito de passagem. Segundo ele, a SAM precisará de uma faixa de 30 metros de largura para construir o mineroduto. “O impacto é somente no período construtivo. A terra continua sendo do proprietário e ele vai receber um valor por permitir essa passagem”, explicou o diretor. Ainda segundo Geraldo Magela, as restrições posteriores serão naqueles 30 metros específicos, mas pasto e plantas de raízes baixas não atrapalham o mineroduto. No entanto, na área da mina haverá desapropriação.
Outorga do uso da água
O deputado Rogério Correia apresentou um estudo que solicitou para a Consultoria da ALMG, em que foi constatado que não existe um projeto da SAM para revitalização do Rio Jequitinhonha como contrapartida da outorga de suas águas, concedida pela Agência Nacional de Águas (ANA). “Estranho como a ANA deu uma outorga com um volume de água comparável a duas vezes o abastecimento de uma cidade como Montes Claros e não existe um projeto de revitalização do Jequitinhonha”, ironizou.
De acordo com Geraldo Magela, a SAM é sensível à questão e o projeto da empresa é fazer o uso racional de uma parcela da água do Rio Jequitinhonha, que deságua naturalmente na Bahia, e gerar atividade econômica. Ele disse ainda que a outorga concedeu 6.200 m³ de água por hora e que 76% desse volume vão ficar na região de Grão Mogol, pois apenas 24% serão usados para o mineroduto. Outro projeto da empresa, ainda em fase de estudo do impacto ambiental, é a construção da barragem do Rio Vacarias, nos municípios de Fruta de Leite e Padre Carvalho, e a irrigação de uma área de 950 hectares a ser definida pelo Estado.
Os impactos ambientais do empreendimento são motivo de preocupação para o promotor de Justiça Carlos Eduardo Ferreira Pinto. Segundo ele, o Ministério Público solicitou que o Ibama suspendesse o processo de licenciamento por entender que deve ser feito pelo órgão ambiental mais próximo da sociedade impactada, já que todos os entes federados são capacitados para licenciar. “No nosso entendimento é um grave equívoco o licenciamento ser feito pelo Ibama”, afirmou, ao lembrar que as compensações de órgãos federais não levam em conta a região impactada. Neste sentido, a gerente de Meio Ambiente da SAM, Cosette Xavier Silva, disse que a intenção da empresa é fazer a compensação ambiental em região próxima ao empreendimento.
O promotor também se mostrou preocupado com o fato de o licenciamento ambiental ser concedido por etapas do empreendimento, sem considerá-lo como um todo. “O licenciamento da ampliação é muito mais flexível que o projeto de licenciamento ambiental inicial”, ponderou. “Queremos que as informações sejam repassadas de forma clara para a sociedade local”, completou.
Ambientalistas criticam mineradoras
Os ambientalistas e representantes da comunidade do Norte de Minas criticaram o modelo de mineração adotado pelo Estado. O representante do distrito Vale das Cancelas, Adair Pereira de Almeida, onde estará o empreendimento, pediu a revogação do Decreto 30 que, em sua opinião, viola o direito constitucional da população local de permanecer em seus territórios e ter acesso aos recursos naturais. “Queremos que esta Casa peça à ANA que suspenda a outorga preventiva da ação, porque não existe um estudo profundo dos impactos para a região”, cobrou Adair Almeida.
O representante da Comissão Pastoral da Terra, Alexandre Gonçalves, também questionou o decreto. Já o representante do Movimento dos Atingidos por Barragem, Pablo Andrade Dias, questionou qual a utilidade pública de um decreto destinado para atender uma empresa específica.
Na opinião da representante do Movimento dos Atingidos de Conceição do Mato Dentro, Maria Teresa Viana Freitas, não existem impostos que compensem as perdas definitivas para o meio ambiente. Para ela, a mineração não traz desenvolvimento para o Estado e o governo não tem interesse em oferecer outras alternativas de desenvolvimento.
Parlamentares apresentam suas opiniões
O deputado Gil Pereira (PP) lembrou que estava no governo, como secretário de Estado, quando foi autorizado o empreendimento. Segundo o parlamentar, o ex-governador Antonio Anastasia concordou com o projeto principalmente por causa da construção da barragem do Rio Vacarias. Na sua opinião, o processo está sendo bem feito e o empreendimento é importante para a região, que é “carente, sofre com a seca e quer oportunidades de desenvolvimento e emprego”.
Já o deputado Paulo Guedes (PT) afirmou que todos reconhecem a importância de gerar oportunidades para o Norte de Minas, mas a viabilidade e os transtornos do empreendimento precisam ser discutidos com os movimentos sociais. Para ele, os investimentos precisam trazer soluções e respostas para as demandas sociais e ambientais.
Ao final da reunião, o deputado Rogério Correia disse estar mais preocupado porque, na sua avaliação, o modelo econômico atual não considera a população local.
A reunião foi comandada pelo presidente da comissão, deputado Célio Moreira (PSDB).