Comissão de Cultura debateu as ações de interiorização da política cultural no Estado
Participantes defenderam incremento no Fundo Estadual de Cultura

Classe artística reivindica interiorização de ação cultural

Comissão faz audiência na ALMG para tratar do tema e Poder Executivo apresenta ações já concretizadas.

20/03/2014 - 15:10 - Atualizado em 20/03/2014 - 16:21

A necessidade de aumento de recursos do Fundo Estadual de Cultura e de capacitação dos gestores públicos municipais foi apontada durante audiência pública da Comissão de Cultura da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). A reunião, realizada na manhã desta quinta-feira (20/3/14), tinha como objetivo debater as ações de interiorização da política cultural em Minas Gerais.

O incremento do Fundo Estadual de Cultura foi uma das ações defendidas pelo presidente da Associação dos Produtores Culturais de Uberlândia (Triângulo Mineiro), Rubem Silveira dos Reis. De acordo com ele, a verba desse fundo, destinada diretamente aos projetos culturais, não chegaria hoje nem a 10% do que é destinado à renúncia fiscal a partir das leis de incentivo. Ele afirmou que essas leis, que ligam os projetos às marcas das empresas, geram muitas distorções e dificultam a descentralização das ações.

Reis defendeu, ainda, a criação de mecanismos para que os projetos apresentados por grupos do interior fiquem mais baratos e, assim, mais atraentes para as empresas. Ele também falou sobre a necessidade de criação de programas estruturadores que apoiem todas as áreas, como teatro e literatura. “Somos percebidos pelas outras áreas como pessoas que chegam de pires nas mãos para pedir dinheiro. Precisamos mudar esse paradigma para sermos vistos como geradores de desenvolvimento humano e, consequentemente, econômico”, disse.

Gestores municipais precisam ser capacitados

A presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões de Minas Gerais, Maria Magdalena Rodrigues da Silva, disse que é importante o envolvimento de todos e afirmou que é necessário capacitar os secretários municipais de cultura, que muitas vezes não sabem como incentivar o trabalho em suas cidades. “Não estamos desmerecendo ninguém, mas muitos desses gestores não sabem como avaliar as necessidades dos grupos culturais dos seus municípios”, disse.

Silva afirmou, ainda, que é preciso reavaliar as formas de se incentivar a frequência em eventos culturais. Ela disse que não adianta dar dinheiro para garantir o acesso, como é proposto pelo Vale Cultura, se as pessoas não conhecem a importância e o valor das ações culturais. “Ninguém vai ao teatro se não sabe o que é teatro. A pessoa vai preferir assistir televisão, já que não precisa nem sair de casa”, avaliou.

O deputado Elismar Prado (PT) destacou que, dos mais de R$ 400 milhões anunciados pelo Governo do Estado para a Rede de Identidade Mineira, menos de R$ 100 milhões seriam destinados a investimentos no interior. O programa abarca três projetos, dois deles concentrados na Capital. São eles a Estação da Cultura Presidente Itamar Franco, que deve sediar a Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, a TV Minas e a Rádio Inconfidência; e o Circuito Cultural Praça da Liberdade, que está transformando prédios históricos utilizados anteriormente para abrigar secretarias de Estado em aparelhos culturais.

O projeto Minas Patrimônio seria o único que destina verba para o interior, de acordo com o deputado Elismar Prado. Ele disse que reconhece a importância de todos esses projetos, mas reafirmou que é preciso descentralizar mais as ações e levar mais verba para o setor de cultura no interior do Estado.

Secretaria de Cultura apresenta avanços dos últimos anos

Para a superintendente de interiorização e ação cultural da Secretaria de Estado de Cultura, Janaína Cunha Melo, os projetos da Rede de Identidade Mineira atendem todo o Estado a partir do momento em que são frequentados por moradores do interior. A TV Minas e a Rádio Inconfidência, por sua vez, são importantes na interiorização da cultura, já que transmitem conteúdo para todo o Estado.

Muitos dos presentes criticaram esse posicionamento e lembraram que as políticas de interiorização devem significar não apenas a emissão de conteúdo da Capital para o interior, mas também o incentivo à produção cultural em todas as regiões.

Também esteve presente como representante da Secretaria de Cultura a diretora de interiorização, Manuella Machado. Ela apresentou um breve histórico da descentralização das ações culturais do Estado desde 2007, quando foi criada a Superintendência de Interiorização, que recentemente foi incorporada à Superintendência de Ação Cultural.

Ela salientou a criação da rede de articuladores, formada por parceiros de várias regiões de Minas que devem ajudar na discussão das políticas públicas do setor e na mobilização social. Ela disse, ainda, que foram realizadas 35 oficinas em dois meses no interior para a implantação do projeto federal Pontos de Cultura. “Foi um sucesso, e o resultado foi a criação de pontos de cultura em 71 municípios”, disse.

Machado destacou também o programa Minas Território da Cultura, criado em 2012 para levar ações culturais para as diversas regiões do Estado. “O programa teve resultados surpreendentes e nos permitiu sair de Belo Horizonte e ver de perto as carências e potencialidades dos municípios”, afirmou. Ela ressaltou também a criação de cinco núcleos regionais, que são braços da Secretaria de Cultura no interior, porém, disse que o processo de interiorização não está concluído e ainda há muito o que se fazer.

Artistas se mostram pessimistas

Muitos dos presentes pediram a palavra e a maioria se mostrou pessimista quanto às perspectivas de interiorização da política cultural e à efetividade das ações já concretizadas. A atriz e cientista política Weslaine Gomes, por exemplo, disse que está desenvolvendo uma pesquisa de mestrado sobre o processo de descentralização da cultura e vem constatando grande lacuna no interior do Estado.

Ela visitou núcleos regionais da Secretaria de Cultura em Governador Valadares (Vale do Rio Doce) e Araçuaí (Vale do Jequitinhonha), e contou que se deparou com ausência de infraestrutura e de recursos. Reclamou também dos dados disponibilizados pelo portal da transparência da Secretaria, ressaltando que a maioria dos dados de que precisou só foram conseguidos no portal do Ministério da Cultura. Gomes salientou também que apenas 192 dos mais de 800 municípios mineiros contam com teatros e, portanto, a maioria das cidades não têm nem mesmo espaços para apresentações culturais.

A dificuldade de acesso a financiamentos públicos também foi apontada como problema. Agniná Canicrã, da Rede de Apoio ao Circo, queixou-se do excesso de burocracia do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG). Segundo ele, mesmo depois de o governo liberar uma linha de crédito aos pequenos circenses, o excesso de exigências do banco praticamente impede a conclusão desses empréstimos. Ele ainda reclamou da falta de espaços para apresentações de espetáculos no interior do Estado, destacando que, embora existam bons auditórios em escolas públicas, uma portaria da Secretaria de Educação impediria as pequenas companhias teatrais e circenses de utilizá-los, em razão da cobrança de ingressos.

Secretaria de Cultura rebate críticas

Janaína Cunha Melo respondeu aos questionamentos e afirmou que o Plano Estadual de Cultura está em construção e visa a atender a todos os segmentos da forma mais consensual e abrangente possível. A respeito da queixa relacionada ao sistema de informações da Secretaria de Cultura, ela garantiu que há um novo modelo em fase de teste, que possivelmente estará disponível no portal da pasta em cerca de 30 dias.

Manuella Machado, também da Secretaria de Cultura, aproveitou para destacar que já estão programados dois cursos de qualificação para os gestores culturais dos municípios - um deles a ser realizado em Belo Horizonte em parceria com a Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg) e outro com o Instituto Itaú Cultural, que será oferecido em cinco regiões de Minas Gerais. Com relação aos núcleos regionais, Manuella salientou que são pontos de apoio, facilitadores das ações, e não podem ser vistos como uma mini-secretaria.

Outra preocupação apontada pelos presentes foi a união das superintendências de Interiorização e de Ação Cultural. De acordo com Janaína Melo, a união não significou cortes de verba nem eliminação de projetos. Para ela, a decisão não enfraqueceu as ações, e sim as fortaleceu, ao colocar juntas duas superintendências que sempre foram interdependentes.

Deputados defendem mais recursos para a cultura

“Em qualquer nível da federação, os recursos para a cultura não passam de 1% do orçamento”, afirmou a deputada Luzia Ferreira (PPS). Ela acredita que é preciso aumentar essa verba, já que, na sua opinião, o poder público deve se responsabilizar pela criação de condições de acesso à cultura para a ampla maioria dos cidadãos. “A gente anda por todos os municípios e sabe que as prefeituras têm poucas condições de ofertar ações culturais relevantes”, afirmou, salientando a importância do incentivo governamental a essas ações.

O deputado Luiz Henrique (PSDB) concordou que é preciso lutar por mais recursos, mas afirmou que a atual gestão alcançou avanços significativos no setor.

Requerimento – Durante a reunião, foi aprovado requerimento do deputado Tadeu Martins Leite (PMDB) para realização de audiência pública em Montes Claros (Norte de Minas). A reunião deve discutir a situação do Conservatório Estadual de Música, situado no município, com ênfase nos problemas de conservação do prédio e nas mudanças ocorridas na direção e no quadro administrativo da instituição.

Consulte o resultado da reunião.