Representantes de entidades de economia solidária reivindicam fundo para o setor
Rodrigo Vieira relembrou aprovação de lei considerada 1ª vitória do setor em Minas
Bianca Aparecida falou da necessidade de projetos estruturadores
Hélio Rabelo enumerou projetos em que o Executivo apoia o setor no Estado

Lideranças da economia solidária reivindicam fundo do setor

Debate na Comissão de Participação Popular lembra avanços, mas consenso é que falta apoio, sobretudo financeiro.

07/11/2013 - 20:12

As dificuldades enfrentadas pelas entidades de economia solidária em todo o País, especialmente em Minas Gerais, sobretudo no que diz respeito a criação de políticas públicas que garantam seu financiamento, foi a tônica da audiência pública promovida nesta quinta-feira (7/11/13) pela Comissão de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

Nesse sentido, foi consenso entre os participantes a necessidade de criação de um fundo estadual, já previsto em lei, e, de forma mais ampla, a implementação de uma política estadual de fomento à economia popular solidária, temas do encontro. Os participantes lembraram ainda os 10 anos do Fórum Brasileiro de Economia Popular Solidária. A reunião atendeu a requerimento do deputado André Quintão (PT), que coordenou os debates.

Diante do auditório da ALMG lotado, com muitas manifestações dos presentes, a audiência pública foi aberta por uma apresentação do assessor do Cáritas Brasileira, Regional Minas Gerais, e membro do Fórum Mineiro de Economia Solidária, Rodrigo Pires Vieira. Ele lembrou que a aprovação da Lei 15.028, em 2004, que trata do assunto, foi a primeira vitória do setor em Minas, mas alerta que é preciso retomar a mobilização de dez anos atrás, sob pena de retrocesso.

"Foram muitas realizações nesses dez anos, mas a economia solidária ainda enfrenta grandes dificuldades dentro do cenário das politicas públicas. Não somos mineração, não produzimos transgênicos, não estamos gerando aquecimento global. O que fazemos é gerar renda e dividi-la com justiça no final do mês. Realmente é difícil defender isso diante do capitalismo atual”, ironizou. “País rico não é país sem miséria, é um país sem ricos e também sem pobres, ou seja, sem concentração de renda”, completou.

Rodrigo Vieira citou o Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado (PMDI) e o Plano Plurianual de Ação Governamental (PPAG) ao lembrar, de forma prática, a necessidade urgente de garantir os recursos para duas ações (números 4173 e 4584) previstas no planejamento orçamentário do Executivo que, sistematicamente, são contingenciados. “É incrível, mas R$ 16 milhões acabam se transformando em R$ 5 mil, apesar de todo ano voltarmos à luta pelas emendas populares ao PPAG”, exemplificou. O cronograma de audiências de revisão do PPAG, que consta do Projeto de Lei 4.550/13, em tramitação na ALMG, foram encerradas na última quarta.

André Quintão elogiou as propostas apresentadas por Rodrigo Vieira, ressaltando que a criação do Fundo de Erradicação da Miséria pode embasar a criação de um fundo similar para a economia solidária. “Nesse fundo foram previstos 2% a mais de arrecadação do ICMS sobre os setores de produção de armas, bebidas e cigarros. Só isso representou uma arrecadação extra de R$ 170 milhões anuais. Nos últimos anos o Brasil avançou muito ao retirar 40 milhões de pessoas que estavam abaixo da linha da pobreza, mas podemos sonhar com algo mais e a economia solidária é um caminho para isso”, apontou.

Requerimento - Durante a audiência pública, o parlamentar conseguiu a aprovação de requerimento de sua autoria para que seja encaminhado à Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag) pedido de providências para que sejam liberados com urgência os recursos da emenda na ação 4173, no valor de R$ 505 mil, destinada ao apoio de feiras livres e pontos fixos de venda. O documento lembra o pregão, já em curso, para aluguel dos equipamentos para a execução das feiras regionais e dos serviços para realização das conferências regionais.

A vice-presidente da comissão, deputada Maria Tereza Lara (PT), lembrou que incentivar a economia solidária é também dar novas oportunidades de vida às mulheres, que são maioria no segmento. “Não é apenas uma questão de economia, mas de construção da cidadania. Somos apenas cinco mulheres em 77 parlamentares, mas felizmente temos aqui na Casa colegas sensíveis à luta por nossos direitos”, lembrou.

Professora da UFV elogia empenho da ALMG pelo tema

A professora do Departamento de Economia Rural da Universidade Federal de Viçosa (UFV) e coordenadora do projeto de extensão Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares da instituição, Bianca Aparecida Lima Costa, traçou uma defesa emocionada do modelo de economia solidária e elogiou o papel da Assembleia como legítimo canal de discussões do tema. “Não por acaso, dez anos depois, o tema volta a ser discutido aqui. Naquela época, realizamos um ciclo de debates e promovemos a primeira feira estadual, ali na Praça da Assembleia. A lei que saiu daqui foi um marco na luta pela economia popular e serviu de exemplo para outras leis semelhantes por todo o Brasil”, afirmou.

“E o que fazer daqui pra frente? Há milhares de pessoas em Minas vivendo da economia popular solidária, mas que ainda demandam apoio do poder público. Não é nada que o Governo de Minas já não faça a outros tipos de empreendimentos econômicos, pois não são demandas vazias. Necessitamos de projetos estruturadores, só para falar nos mesmos termos técnicos da burocracia estadual. Tudo é possível com apoio político e apoio de uma base social”, receitou.

Na mesma linha, Belmiro Alves de Freitas, representante do Conselho Estadual de Economia Popular Solidária, lembrou que a lei aprovada em 2004 previa a regulamentação do fundo no prazo de 120 dias, o que até hoje não aconteceu. “O trabalho é um direito de todos, que é ainda mais legítimo se lembrarmos que economia solidária diz respeito a uma prática de produção e consumo pautada na autogestão, que privilegia o desenvolvimento comunitário em vez do lucro. O ser humano é o centro de tudo”, ressaltou.

Outro depoimento emocionado foi dado pela representante da Cooperativa de Confecção e Arte de Minas Gerais (Coonarte-MG), Francisca Paulina da Silva. “Estamos falando de gente que escolheu um caminho honesto para sobreviver, a maioria mulheres, mães, que encontraram um novo rumo na vida. Digo a todos que tenho 16 anos, pois comecei na economia solidária aos 50, quando finalmente achei um jeito para conquistar minha cidadania e realizar meus sonhos. Os governantes precisam entender que não somos pedintes, nós somos a economia solidária, algo que cresce no mundo todo. Por que um empresário que instala uma nova fábrica consegue ficar dez anos sem pagar impostos e nós não podemos ter espaço para realizarmos nossas feiras?”, questionou.

Bahia - Em um contraponto à situação da economia solidária em Minas Gerais, a coordenadora de Formação e Divulgação da Superintendência de Economia Solidária da Secretaria de Estado de Trabalho, Emprego, Renda e Esporte da Bahia, Tatiana Araújo Reis, contou que é crescente o investimento na área naquele estado, tendo em vista os efeitos positivos no combate às desigualdades sociais. Em 2007, segundo ela, foram aplicados R$ 215 mil, contra mais de R$ 20 milhões no ano passado, o que tornou a Bahia uma referência no País em termos de economia solidária. "Estamos privilegiando um outro modelo de desenvolvimento, mais justo, mais solidário, conforme diz o nome, realmente capaz de transformar a vida das pessoas”, destacou.

Representante do Executivo enumera ações em andamento

Em resposta aos questionamentos feitos na reunião, o secretário-adjunto de Estado de Trabalho e Emprego, também presidente do Conselho de Economia Popular Solidária, Hélio Augusto Martins Rabelo, disse que, apesar das dificuldades burocráticas, há vontade política e ações concretas para dar o apoio necessário ao setor em Minas. Ele enumerou vários programas em que o Executivo já faz isso, mas por meio de contrapartidas a repasses federais. Entre os contemplados estão, por exemplo, comunidades quilombolas, indígenas e ribeirinhas que vivem de recursos da assistência social.

“Estamos criando alternativas de vida para aqueles que até agora não sabiam que podiam se sustentar de outra forma, sozinhos e com dignidade”, afirmou. Ele também citou a atuação do Governo do Estado no estímulo a reciclagem de resíduos sólidos. “Tais recursos são empregados para um público composto de 70% de não associados a qualquer entidade. São pessoas que estão progredindo e futuramente vão ser capazes de se associar à economia solidária”, analisou.

Já Paulo Jamim, especialista em Políticas Públicas da Seplag, alertou que a criação de um fundo, por si só, não garante os recursos necessários. “Pode até garantir uma maior visibilidade, mas temos estudos indicando que apenas 20% desses fundos têm execução satisfatória. Isso acontece por uma série de fatores, muitos deles que vão além da capacidade de gestão. Mas posso garantir, para todas as demandas apresentadas, que temos a disposição de articular e avançar”, pontuou.

Outros requerimentos – Outros dez requerimentos foram aprovados pela Comissão de Participação Popular, todos de autoria de André Quintão. Oito deles têm como tema o imóvel situado em Belo Horizonte e pertencente à Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), ocupado por integrantes do Espaço Comum Luiz Estrela. Entre as reivindicações estão a melhoraria das condições de vida no local e para que a Polícia Militar não intervenha até que esteja esgotada a negociação.

Outro requerimento solicita a realização de debate público pela Assembleia, em 2014, sobre os 50 anos do golpe militar no Brasil. Por fim, o parlamentar também requereu a realização de audiência pública da Comissão para debater a regularização fundiária e a titulação da comunidade quilombola em Minas Gerais.

Consulte o resultado da reunião.