Comissão vai pedir para revogar cessão de imóvel da Fhemig
Destino projetado para casarão é a implantação do Memorial JK, mas representantes de movimento cultural pedem outro uso.
06/11/2013 - 15:12Um requerimento para pedir ao Governo do Estado que seja revogado termo de cessão de imóvel da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) à Fundação Educacional Lucas Machado (Feluma) para a criação do Memorial JK. Esse encaminhamento será apresentado na próxima reunião da Comissão de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Foi o que anunciou o deputado André Quintão (PT) durante audiência pública dessa comissão, nesta quarta-feira (6/11/13), para debater a destinação do casarão situado na Rua Manaus, 348, no bairro Santa Efigênia, em Belo Horizonte.
Representantes do Espaço Comum Luiz Estrela, que estão no local desde 26 de outubro, onde desenvolvem atividades culturais, reivindicam uma nova utilização do espaço. Para o presidente da comissão, André Quintão, é preciso se atentar sobre qual o melhor uso para o local. “Esse movimento é muito mais identificado com a história do local. As manifestações de junho mostraram muito para o País sobre a participação e os novos significados. Devemos pedir a revogação desse termo para que a discussão parta de algo possível de ser feito”, disse.
Outros requerimentos de pedido de providências que o parlamentar pretende apresentar na próxima reunião são: para o comando da Polícia Militar, solicitando que não efetive a reintegração de posse do espaço até que terminem as negociações; para a Cemig e a Copasa, solicitando acesso à água e garantia de energia no imóvel; e para o Governo do Estado e Fhemig, solicitando que sejam realizadas obras emergenciais. Outros requerimentos anunciados são para envio de notas taquigráficas da reunião para a 26ª Vara Cível e o comando da PM, informando sobre as negociações.
O representante do espaço, Joviano Mayer, contou que, apesar de o governo ter demonstrado abertura para o diálogo, não assumiu compromisso de atender a demanda do movimento. “O imóvel está abandonado há mais de 20 anos, está deteriorado e é passado à iniciativa privada de modo ilegal”, afirmou.
Essa ilegalidade, segundo ele, diz respeito ao requisito da competitividade. “Não houve processo licitatório e temos conhecimento de vários interessados pelo uso no local, como a Fundação Clóvis Salgado e a Escola Guignard. Isso por si só tornaria obrigatória a licitação”, disse. Para Mayer, o poder público foi omisso por não preservar o local.
História - Também representante do espaço, Rafael Barros recordou a história do imóvel. O espaço, que é tombado, foi construído em 1913 para abrigar o Hospital Militar. Depois, foi destinado a um hospital de neuropsiquiatria infantil, entre 1947 e 1977, onde, segundo ele, houve torturas. Ele contou que descobriram no porão compartimentos prisionais. “É um espaço que carrega dor e sofrimento. Se não tivéssemos entrado no local, talvez não seriam reveladas essas histórias”, contou.
Rafael Barros apresentou uma proposta para o local: “Queremos que o espaço abrigue atividades de formação artística em atenção às crianças portadoras de sofrimento mental, em respeito à história do local, e que a comunidade possa usar o imóvel, que seja um espaço cultural vivo, aberto à comunidade, que recupere a história do lugar e faça autogestão”, completou.
Patrimônio - A superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Michele Abreu Arroyo, destacou que a ação desse grupo é extremamente importante do ponto de vista cultural. “A gestão do patrimônio não deve caber só ao gestor da área. Há poucos momentos em que a sociedade se organiza para proteger o patrimônio da cidade”, falou. Michele também acrescentou que é urgente a restauração do espaço, pela sua importância e também pelo risco que pode representar por estar abandonado há tanto tempo.
Representante do governo destaca abertura para diálogo
O assessor-chefe da Assessoria de Articulação, Parceria e Participação Social da Governadoria do Estado de Minas Gerais, Ronaldo Araújo Pedron, reafirmou a posição do governo de encaminhar para uma solução participativa. “O canal de diálogo está aberto”, afirmou. Pedron contou que, como foi combinado, o governo aguarda prazo para que o grupo apresente uma proposta mais consolidada da utilização do espaço. Ele justificou que todo o processo foi feito de modo legal, acompanhado pelo Ministério Público.
O procurador-chefe da Fhemig, Júlio César Pinto, destacou que o imóvel não tem mais a finalidade de prestar assistência à saúde e que, há algum tempo, pensam sobre sua destinação. Em 2007, foi apresentado projeto que dependia de recurso da fundação. “Não tínhamos o valor para essa finalidade, que ia além da assistência, nossa atividade final”, disse. Em 2012, contou, o Ministério Público interveio para que a Fhemig encontrasse destinação para o local e a Feluma apresentou a ideia do Memorial JK. “A cessão do espaço está respaldada pela legislação sobre o tema. Pode haver divergência em relação ao uso, mas o processo é legal. Não foi necessário haver licitação porque até o momento não havia outros interessados”, concluiu.
Memorial JK - Já o superintendente-geral da Feluma, Evandro Pires Fernandes, relatou que a instituição tomou conhecimento da situação do prédio e resolveu apresentar um projeto para a utilização do espaço. “Isso foi ao encontro de um objetivo nosso que era homenagear o ex-presidente Juscelino Kubitschek, um dos fundadores da Faculdade de Ciências Médicas, da qual a Feluma é a mantenedora”, explicou. Ele ressaltou que um protocolo de intenções foi firmado em 2012 e que, em julho de 2013, foi assinado termo de cessão, a partir do qual estabeleceram compromisso de apresentar medidas emergenciais devido à condição do espaço. Ele disse que as medidas foram aprovadas, mas ainda não foram implantadas e que tudo corre dentro do prazo. “Tudo isso devidamente aprovado pelo Ministério Público”, reafirmou.
Autoridades apoiam movimento
O vereador de Belo Horizonte Arnaldo Godoy (PT) falou sobre a importância do espaço cultural. “É importante saber que a memória afetiva da cidade está mexendo com o grupo e com a comunidade. Isso provoca os envolvidos a tomarem providências. O uso desse espaço tem que ser construído”, enfatizou.
Também presentes no encontro, os vereadores da Capital Pedro Patrus e Adriano Ventura, ambos do PT, também demonstraram apoio ao movimento. “Que o Estado reflita sobre essa questão, porque essa proposta inovadora dá um novo sentido cultural e social para o espaço”, ressaltou Patrus.
Luiz Estrela – O nome atribuído ao espaço cultural homenageia o morador de rua Luiz Otávio da Silva, assassinado em junho deste ano. Segundo representantes do movimento, ele era um artista, além de militante nas questões de gênero e de saúde mental.