Durante a reunião, foram feitas diversas denúncias sobre a precariedade da estrutura operacional dos órgãos do MTE, o que dificulta a atuação dos fiscais no Norte de Minas
Para Eliane Conceição Cunha Meira, os 11 fiscais disponíveis não conseguem atender à crescente demanda
Participantes relataram problemas enfrentados na região

Sindicalistas denunciam descaso com Ministério do Trabalho

Aumento de acidentes e trabalho escravo seriam decorrentes da falta de investimentos na estrutura de fiscalização.

15/10/2013 - 16:33

Ocorrência de trabalho escravo e trabalho infantil; aumento do número de acidentes de trabalho, sobretudo na área de metalurgia e construção civil; demissões em massa; doenças ocupacionais; terceirização da mão de obra e desrespeito aos direitos básicos dos trabalhadores foram algumas das denúncias apontadas por sindicalistas durante audiência pública da Comissão do Trabalho, da Previdência e da Ação Social da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizada nesta terça-feira (15/10/13), em Montes Claros (Norte do Estado).

Convocada a requerimento do deputado Celinho do Sinttrocel (PCdoB), a reunião, que contou com representantes de 11 entidades sindicais, teve por objetivo debater a falta de infraestrutura e de investimentos nos órgãos do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), por parte do Governo Federal, na região.

Durante a audiência, foram feitas diversas denúncias sobre a precariedade da estrutura operacional dos órgãos do MTE, o que dificulta a atuação dos fiscais do trabalho no Norte de Minas, onde são frequentes os delitos relacionados a direitos trabalhistas. O deputado Celinho do Sinttrocel propôs reunir as denúncias e sugestões em um único documento, a Carta de Montes Claros, a ser encaminhado pelas entidades sindicais ao ministro do Trabalho, Manoel Dias, e à presidente da República, Dilma Rousseff, cobrando mais investimentos no órgão e abertura de novo concurso público para fiscais e servidores administrativos.

Os participantes sugeriram também a elaboração de uma moção de repúdio contra o Projeto de Lei Federal 4.330/04, do deputado Sandro Mabel (PMDB-GO), por incentivar a terceirização da mão de obra. O deputado Celinho do Sinttrocel lembrou que a ALMG já fez debate público sobre o assunto, pedindo que os parlamentares mineiros votem contra esse projeto no Congresso Nacional.

Comissão vai cobrar providências

Ao final do encontro, o deputado Celinho do Sinttrocel apresentou diversos requerimentos, a serem apreciados na próxima reunião da comissão, com a proposta de encaminhar ofícios a órgãos públicos federais e estaduais solicitando providências no sentido de fortalecer a estrutura do MTE em Minas Gerais, em especial no Norte de Minas, e abrir concursos públicos para reposição de vagas de fiscais do trabalho e demais servidores.

Outros requerimentos são de providências no sentido de erradicar o trabalho infantil, o trabalho escravo e o trabalho análogo ao escravo na região. Atendendo a sugestões de vários participantes da reunião, o parlamentar também se comprometeu a procurar entidades sindicais das demais regiões do Estado com a finalidade de realizar outras audiências públicas, para dar continuidade à discussão do tema.

O deputado leu um texto em que relata a série de denúncias que tem recebido do movimento sindical referente à violação de direitos dos trabalhadores no Norte de Minas e à falta de infraestrutura na Gerência Regional do Trabalho e Emprego. Ele disse que os problemas não estão restritos a Montes Claros, mas “se espalham por todos os cantos de Minas e do País”.

Trechos - “O Ministério do Trabalho tem hoje um funcionamento precário e muito aquém das necessidades da sociedade e do Estado brasileiro”, afirmou o parlamentar. “A falta de infraestrutura e de valorização dos servidores e as péssimas condições de trabalho comprometem suas atividades e o atendimento aos trabalhadores nas ações de homologação, negociação, documentação e fiscalização", continuou. Em decorrência dessa situação, acrescentou, aumentam os acidentes com mortes e invalidez permanente, que se somam a outros graves problemas como o trabalho escravo e o trabalho infantil, "a vergonha do trabalho imigrante e a falta de registro em carteira”, entre outras violações de direitos.

Segundo o parlamentar, estudo do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea) deixou claro que, para o Ministério do Trabalho exercer suas atribuições legais com eficácia e eficiência, precisaria de mais 5.800 auditores fiscais, além dos 3 mil existentes. Ele lembrou que muitos desses servidores que estão hoje em atividade já estão próximos da aposentadoria.

Ministério do Trabalho sofre com sucateamento

Como exemplo do crescente sucateamento do Ministério do Trabalho, o deputado Celinho do Sinttrocel citou a verba destinada à fiscalização em Minas Gerais. Segundo ele, esse valor diminuiu de R$ 1,3 milhão, entre 2009 e 2012, para R$ 900 mil atualmente. Além disso, de acordo com o parlamentar, as diárias estão congeladas e as 20 gerências do Estado têm em torno de 300 fiscais. Destes, 11 estão alocados na gerência de Montes Claros, com o dever de atender, aproximadamente, um milhão de pessoas.

As denúncias foram confirmadas pela gerente regional do MTE em Montes Claros, Eliane Conceição Cunha Meira, para quem os 11 fiscais disponíveis não conseguem atender à crescente demanda. O quadro, segundo ela, deve piorar no ano que vem, quando quatro fiscais vão se aposentar. A gerência, disse, dispõe de 38 funcionários, contando com os 11 fiscais, para atender a 94 municípios. Em março, o prazo do último concurso público venceu e as vagas abertas não foram repostas.

Sindicalistas presentes à audiência pública, como Antônio da Costa Miranda, presidente da Nova Central Sindical de Minas Gerais; Cláudio de Jesus Ferreira, da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria (CNTI); e Antônio Roberto Guedes, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rodoviários de Montes Claros, destacaram a importância do debate, reforçando que a discussão não diz respeito somente ao Norte de Minas ou a Minas Gerais, mas ao País inteiro.

Concurso - Segundo o presidente da Nova Central, o concurso público realizado não repõe nem sequer 10% dos auditores fiscais que já se aposentaram. Oriundo do segmento do vestuário, Cláudio de Jesus Ferreira, da CNTI, também reforçou que o problema é recorrente e que é solidário com os servidores do MTE. Ele solicitou a realização de mais audiências públicas para tratar do mesmo assunto em outros municípios do Estado, como Varginha, Juiz de Fora e Pouso Alegre.

Antônio Roberto Guedes, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rodoviários de Montes Claros, denunciou que em outras cidades da região, como Januária e São Francisco, muitas empresas não cumprem os acordos coletivos, aproveitando-se da carência de pessoal do MTE na fiscalização. Por isso, ele disse que é preciso pressionar o governo. “Dinheiro para investimentos tem, o que falta é vontade política”, disse, lembrando a arrecadação recorde de impostos, este ano, em torno de R$ 1,2 trilhão.

Aumentam acidentes de trabalho e doenças ocupacionais

Na fase de debates, Clara Montana, diretora do Sintel, sindicato que reúne trabalhadores em empresas de telecomunicações (telemarketing e teleatendimento), disse que o Norte de Minas é um Estado dentro de outro Estado, com mais de 90 municípios. “Isso tem que ser levado em conta com relação à estrutura do MTE. Nossa luta pela melhoria do órgão é também em solidariedade aos seus servidores”, afirmou. Ela pediu uma atenção maior aos trabalhadores de call centers, denunciando que os empregados desse segmento sofrem com doenças ocupacionais, como infecção urinária, por serem impedidos de ir ao banheiro quando necessitam.

Valdeir Ferreira Veloso, representante dos motoristas auxiliares de táxi, denunciou que, em Montes Claros, motoristas com mais de 35 anos de trabalho não contam com qualquer amparo legal, sendo obrigados a cumprir jornadas excessivas e sem contrato de trabalho. “Não podemos sequer concorrer nas licitações, porque não temos como competir com os barões de táxi de Montes Claros”, disse. “Reivindicamos apenas jornada de trabalho digna e direitos trabalhistas”, acrescentou.

Representando os trabalhadores da construção civil, Augusto Ferreira Fraga disse que já foi até ameaçado com arma de fogo, durante fiscalização de que participou ao lado de fiscais do MTE. Nem assim, reclamou, conseguiram apoio da Polícia Militar. Segundo ele, ameaças de morte e discriminação racial são delitos comuns por parte de alguns patrões da região.

Demissões - Dilson de Oliveira Silva, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Pirapora, denunciou o crescente número de demissões no setor. Segundo ele, empresas que até 2009 trabalhavam com 12 trabalhadores por turno hoje exigem produção ainda maior com apenas quatro por turno. Como exemplo, citou o caso da empresa Iasa, que há quatro meses demitiu 200 trabalhadores num universo de 600. “O ritmo acelerado de produção aumenta a possibilidade e a incidência de acidentes de trabalho”, denunciou.

Ao abrir a audiência, o deputado Celinho do Sinttrocel também fez menção aos acidentes de trabalho, dedicando a reunião às vítimas desses acidentes no Estado, dirigindo-se, em especial, a cinco metalúrgicos acidentados na Siderúrgica Sada no último dia 7.

Consulte o resultado da reunião.