Foi informado na audiência que os dependentes de drogas de Pirapora precisam se deslocar até 600 quilômetros para conseguirem tratamento
Autoridades regionais e estaduais participaram do debate no Norte de Minas
Os deputados defenderam políticas de prevenção às drogas
Para Cloves Benevides, o combate às drogas é o maior desafio de todas as políticas públicas

Pirapora precisa de instituições para tratamento de drogados

O apelo foi apresentado em audiência pública, na qual se constatou o crescimento acelerado do uso de crack na cidade.

17/09/2013 - 15:39

Pirapora (Norte de Minas) reivindica a implantação de uma comunidade terapêutica e de uma clínica de reabilitação para tratamento de dependentes de drogas. Esse foi o apelo unânime de participantes da audiência pública da Comissão de Prevenção e Combate ao uso de Crack e outras Drogas da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizada nesta terça-feira (17/9/13) no município. O autor do requerimento da reunião, deputado Tadeu Martins Leite (PMDB), lembrou que em toda a região existem apenas seis comunidades terapêuticas aptas a receber recursos públicos para o trabalho.

O presidente da Câmara Municipal de Pirapora, vereador Orlando Pereira de Lima, afirmou que os dependentes da cidade precisam se deslocar até 600 quilômetros para conseguirem tratamento. E o problema do uso de droga se alastra no município e em cidades vizinhas. É comum, por exemplo, dependentes abordarem pessoas em restaurantes pedindo um marmitex.

De acordo com o presidente da Federação das Comunidades Terapêuticas Evangélicas do Brasi (Feteb), pastor Wellington Antônio Vieira, esta é uma estratégia que eles usam para trocar a comida por crack. Ele lamentou que apenas 1% do orçamento estadual tem sido destinado a políticas públicas de combate e prevenção da droga.

O pastor Wellington ressaltou a eficácia das comunidades terapêuticas no tratamento dos dependentes, mas reclamou do preconceito de conselhos de saúde e da própria sociedade. “Os dependentes são tratados como marginais, mas só deixarão as drogas se conseguirem a reinserção social”, advertiu.

Os números apresentados pela Polícia Militar mostram a escalada da droga em Pirapora e região. O comandante do 55º Batalhão de Polícia Militar, tenente-coronel Antônio Librelon de Oliveira, informou que apenas neste ano, até o início de setembro, foram presos 26 menores de idade e 75 adultos por tráfico de drogas. Neste período foram apreendidas mais de 100 pedras de crack e 70 buchas de maconha. Os entorpecentes foram apreendidos no município e nas cidades de Buritizeiro, Santa Fé de Minas, São Romão e Várzea da Palma.

O oficial ressaltou que a expansão do uso de drogas, especialmente do crack, se reflete no crescimento da violência de forma geral, como assaltos e furtos. No ano passado, a PM local registrou 4.078 prisões e apreensões; e até setembro deste ano, o número chegou a 2.448. O deputado Tadeu Martins Leite afirmou que a localização de Pirapora favorece ainda mais o crescimento do tráfico. A cidade está às margens da BR-365, rodovia utilizada como rota pelos traficantes. “Estamos lidando com um flagelo”, lamentou o presidente da comissão, deputado Vanderlei Miranda (PMDB).

O prefeito de Buritizeiro, Eduardo Monteiro de Morais, disse que nos meses de junho e julho foram registrados 85 assaltos no município, todos motivados pelo uso de drogas. “Eles (os dependentes) precisam de ocupação, pois muitas vezes não têm apoio na própria família”, sugeriu. A prefeitura cuida de 14 dependentes em fase de recuperação, mas o prefeito reconhece que o trabalho precisa ser ampliado e solicita mais recursos do Governo do Estado.

Trabalho em conjunto é apontado como solução

Os participantes da audiência pública também concordaram que a solução para o combate às drogas depende da união de esforços entre poder público e sociedade. “É um problema de todos nós”, resumiu Vanderlei Miranda.

Tadeu Martins Leite defendeu um trabalho de médio a longo prazo que envolva políticas que alcancem desde o combate ao tráfico até o tratamento do usuário, com atenção especial à prevenção. “É preciso pensar em políticas de educação, saúde, cultura e lazer para tirar os jovens da rua”, exemplificou. A vereadora de Pirapora, Dju Vieira, que solicitou a audiência pública, emendou que a cidade é rica em manifestações culturais, que poderiam ser usadas para o desenvolvimento social do município.

Do Executivo estadual, o deputado Tadeu Martins Leite vai solicitar a implantação de um Centro de Atenção Psicossocial para Álcool e Drogas (Caps-AD) e um Caps Infantil, instrumentos que ainda não existem em Pirapora. Por emenda parlamentar, ele também vai solicitar cursos de inglês e informática para capacitar 300 jovens da cidade. Segundo o superintendente de Atenção Primária da Secretaria Municipal de Saúde, já existe a autorização para a instalação do Caps-AD, e a prefeitura está finalizando a documentação.

Ele disse que as duas unidades existentes no município, que não são especializadas em dependência de drogas, atendem cerca de 500 dependentes oferecendo serviços psiquiátricos, psicológicos e médicos, mas não pode, por exemplo, oferecer abrigo. O município também destina dois leitos psiquiátricos para os dependentes de drogas e se prepara para inaugurar, até novembro, uma unidade de acolhimento de dependentes e outra de crianças que poderão atender, por 24 horas, 15 pessoas em cada.

Luta de Davi contra Golias

O deputado Vanderlei Miranda comparou a luta contra as drogas à batalha bíblica travada entre Davi e o gigante Golias. “Podemos nos sentir pequenos diante da questão das drogas. Mas acredito que podemos vencer pela soma de esforços de todos nós”. Segundo o deputado, no Brasil, de cada dez dependentes internados, sete retornam para o vício. Já em Miami (EUA), onde ele conheceu um trabalho de recuperação de drogados, a estatística é totalmente inversa: apenas três retornam ao uso das drogas. Ele também comparou os investimentos públicos: enquanto em Minas investe-se cerca de US$ 400 por dependente no combate e recuperação de drogados, naquele país são destinados US$ 6 mil para cada.

O subsecretário de Estado de Políticas sobre Drogas, Cloves Benevides, admitiu que o combate às drogas é o maior desafio de todas as políticas públicas. Ele disse que o crescimento do uso do crack nos últimos 15 anos trouxe novos e mais complexos desafios ao poder público.

“Mudou o perfil do dependente. O crack traz profundos impactos na saúde e na educação”, afirmou. Segundo Benevides, o índice de mortes pelo crack é mais devastador que qualquer guerra: 40% dos dependentes vão a óbito em função da droga.

Diante do quadro, os participantes da reunião também reconheceram a importância do trabalho de prevenção. Alguns defenderam investir em políticas de emprego e renda, outros na ampliação dos serviços de saúde e terapêuticos para os dependentes e familiares e teve até os que defenderam maior disseminação de valores espirituais como forma de apoio aos usuários. O papel da família, no entanto, foi reconhecido como fundamental na luta contra a droga. “O primeiro trabalho de prevenção começa dentro de casa, pelo exemplo dos pais”, disse Vanderlei Miranda.

Maçonaria fará campanha educativa

O mestre-conselheiro da Ordem Demolay de Pirapora, João Pedro Gomes, anunciou que a instituição vai começar ainda este ano uma campanha de educação contra as drogas com jovens da cidade. Será distribuída uma cartilha nas escolas e em pontos estratégicos do município com informações sobre os danos que as drogas provocam na saúde, na segurança e na família. A ordem é uma irmandade da maçonaria.

O jovem apresentou uma pesquisa feita pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM), na qual se constatou que dos 805 municípios mineiros consultados, 734 enfrentam problemas com circulação de entorpecentes em seu território. O crack foi detectado em 555 cidades, tornando o Estado o campeão do uso de drogas no País.

Ainda segundo o CNM, apenas 43% dos municípios possuem programas de enfrentamento do crack e 20,3% têm conselhos municipais antidrogas. Os centros de assistência psicossocial (CAPs) e os de referência especializado em assistência social (Creas) estão presentes em apenas 6,8% e 10,8% das cidades mineiras, respectivamente.