O objetivo de discutir a situação organizacional da entidade, formada pela Fundação TV Minas e pela ADTV
Antonio Achiles acredita que os concursos, como são feitos hoje, não identificam talentos necessários
Eneida da Costa apoia a realização do concurso, mas tem ressalvas quanto ao edital

Concurso da TV Minas gera polêmica em reunião

Comissões recebem convidados para discutir destino de funcionários da emissora.

10/09/2013 - 14:48 - Atualizado em 30/09/2013 - 13:58

A realização de concurso para a contratação de pessoal na TV Minas foi alvo de polêmica durante audiência pública conjunta das Comissões de Administração Pública e de Transporte, Comunicação e Obras Públicas da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) na manhã desta terça-feira (10/9/13). A reunião teve o objetivo de discutir a situação organizacional da entidade, que hoje é formada pela Fundação TV Minas, com 19 servidores concursados, e pela Associação de Desenvolvimento da Radiodifusão de Minas Gerais (ADTV), que presta serviço para a rede e conta com 393 funcionários no regime celetista.

Diante de questionamentos do Ministério Público, a emissora anunciou a realização de concurso público, o que vai repercutir em demissões na ADTV – algumas dezenas de funcionários já foram dispensados. Enquanto alguns convidados questionaram a qualidade do profissional que será selecionado por concurso, outros avaliaram a medida necessária para diminuir a intervenção dos governos na programação da emissora.

O presidente da TV Minas, Júlio Cezar de Andrade Miranda, falou um pouco do histórico da emissora, fundada há quase duas décadas. Ele explicou que, na tentativa de criar uma televisão que tivesse, ao mesmo tempo, uma programação de interesse público e um modelo de gestão que permitisse o dinamismo necessário, foi aberta uma concorrência pública. A produtora que venceu essa concorrência foi o Sistema Salesiano de Vídeocomunicação, da qual Júlio Miranda era superintendente. "Era uma tentativa, que foi sendo questionada. O modelo foi evoluindo após novas tentativas, por meio de outras Oscips, na época ONGs e, mais recentemente, pela ADTV", disse.

Júlio Miranda explicou que a decisão de realizar o concurso e mudar esse modelo veio depois de o Ministério Público do Trabalho questionar a terceirização das atividades finalísticas e o Ministério Público do Estado apontar que, por ser uma televisão estatal, deveria submeter-se ao regime estatutário de gestão. "Cheguei à TV há exatamente um mês, com o propósito de viabilizar essa mudança de modelo de gestão. Se, por um lado, ele traz algum prejuízo à dinâmica, porque na área pública as regras são muito duras nas contratações, por outro lado é uma maneira muito própria de proteção ao erário", disse. O presidente da TV Minas também ressaltou os investimentos feitos na emissora desde 2003, quando ela passou a ser submetida à Secretaria de Cultura. Segundo ele, de lá para cá o orçamento cresceu em torno de 50%. Ele também salientou que não haveria novas demissões até a realização do concurso.    

Modelo de seleção via concurso é questionado

“Nós pagamos impostos para manter uma televisão de qualidade. Precisamos encontrar um modelo de seleção honesto e impessoal que não deixe de fora os talentos, porque os concursos, como são feitos hoje, não identificam esses talentos”, afirmou Antonio Achiles, ex-presidente da Associação Brasileira das Emissoras Públicas, Educativas e Culturais (Abepec) e da TV Minas.

A presidente do Sindicato dos Jornalistas de Minas Gerais, Eneida da Costa, discordou. Ela usou, para exemplificar sua argumentação, o concurso realizado em 2008 para preenchimento de vagas na ALMG. “É consenso dentro da Casa que a qualidade dos serviços da TV Assembleia melhorou muito depois da chegada dos concursados, provenientes de emissoras como Globo, Bandeirantes, Alterosa e até da TV Minas. Não posso concordar que passam no concurso aqueles que não sabem mais do que marcar 'X'”, disse Eneida, que passou em primeiro lugar nesse processo seletivo.

A presidente do sindicato salientou que é preciso acabar com a interferência do governo na programação da emissora. “Fui chefe de reportagem lá e já vi secretário de Estado exigindo que sua entrevista, de 20 minutos, fosse transmitida na íntegra, o que vai contra todas as regras de edição”, disse. Para ela, o concurso pode melhorar esse quadro. Eneida lembrou que a exigência de concurso é constitucional e que em 2004 a Fundação TV Minas assinou com o Ministério Público um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) se comprometendo a realizar a seleção dessa forma.

“Edital tem problemas”, diz presidente do sindicato

Apesar de declarar seu apoio à realização do concurso, a presidente do sindicato afirmou que tem várias ressalvas quanto ao edital, que segundo ela não respeita a carga horária dos jornalistas e não abre vagas para repórter cinematográfico, mas apenas para operadores de câmera. “Vamos ter que contestar esse edital, feito à revelia de todas as informações sobre a categoria passadas para o governo”, disse.

Gustavo Persichini, diretor executivo da ADTV, salientou que o essencial é discutir o futuro da instituição, que ainda não está traçado. “Atualmente prestamos serviço exclusivamente para a Fundação TV Minas, mas não precisa ser assim. Os funcionários que não entrarem no concurso são qualificados, e só temos que encontrar novos rumos para esse grupo”, afirmou.

Os representantes dos funcionários da ADTV destacaram que é importante aproveitar o momento para discutir o rumo da TV pública. Leandro Silva Lopes, membro da Comissão de Negociação dos Trabalhadores da Rede Minas, afirmou que é preciso levar esse debate para a sociedade. “Temos que entender que existem diferenças entre TV estatal e pública. Agora é hora de lutar não apenas por uma televisão de qualidade, mas também por uma emissora efetivamente pública”, disse. Para a representante do Movimento Salve a Rede Minas, Brisa Ramos Marques, é essencial, nesse sentido, discutir as formas de financiamento da TV Minas.

Funcionários apontam defasagem salarial

Muitos funcionários da ADTV estiveram presentes na reunião, realizada no Teatro, e demonstraram, por meio de vaias, sua discordância com a realização do concurso público. Ao fim do encontro, alguns deles fizeram o uso da palavra e destacaram os prêmios que reconhecem a excelência da programação da emissora, construída pelos funcionários terceirizados. O orçamento reduzido destinado à emissora também foi apontado como uma questão a ser discutida.

Também foram questionados os baixos salários e as longas jornadas de trabalho, seja dos empregados terceirizados ou dos futuros servidores concursados. Segundo os presentes, há uma desvalorização tão grande dos salários e cargos no edital que, se um atual funcionário da ADTV passar no concurso para a mesma função que desempenha atualmente, acabaria trabalhando por mais tempo por um salário menor.

O presidente da TV Minas, Júlio Cezar de Andrade Miranda, afirmou que as questões de salários e jornadas de trabalho, assim como as diferenças entre contratos celetistas e estatutários, estão sendo avaliados pela assessoria jurídica da emissora. "Considerando editais e cargos existentes, que podem ser comissionados, e outros que estão funcionando, vamos ter cerca de 320 funcionários. Hoje esse número é 20% maior. Pretendemos suprir a ampliação da produção local seguindo a recomendação do governador, que é fomentar essa produção audiovisual por meio de editais", disse.

Parlamentares exaltam importância da emissora

O deputado Celinho do Sinttrocel (PCdoB), autor do requerimento que deu origem à audiência, afirmou que se solidariza com os funcionários da ADTV e destacou a importância da TV Minas no cenário nacional de emissoras públicas. Salientou, ainda, que a rede mantém 44 emissoras afiliadas no interior mineiro, o que garante sua ampla abrangência. O parlamentar garantiu, ainda, que será solicitada uma reunião com a secretária de Estado de Cultura, Eliane Parreiras, para discutir o edital do concurso e negociar mudanças.

A importância da emissora na democratização da TV pública foi destacada pela deputada Luzia Ferreira (PPS), que disse ser essencial ter uma programação diferente da marcada pelo mercado e com fortes vínculos com o pensamento dominante. “Esta é a importância da TV Minas: trazer a diversidade. É isso que precisamos fortalecer. Hoje, a emissora atinge cerca de 500 municípios do Estado – é muito, mas temos que lembrar que ainda faltam mais de 300”, disse.

Os deputados Juarez Távora (PV) e Gustavo Valadares (PSD) parabenizaram a iniciativa da audiência e exaltaram a importância da TV Minas. Gustavo Valadares fez um convite para que os funcionários da ADTV prestem o concurso. "Tenho certeza de que se o Estado pudesse, daria a vocês uma pontuação inicial superior em relação à dos que estão vindo de fora, mas isso não é permitido", disse.

Consulte o resultado da reunião.