Audiência da Comissão de Direitos Humanos debateu a falta de saneamento básico em assentamentos da Capital
O deputado Rogério Correia disse ter recebido denúncias de ameaças de remoções de famílias em comunidades
A diretora de Planejamento da Urbel, Maria Cristina Fonseca de Magalhães, rebateu as críticas à Prefeitura

Moradores de ocupações em BH denunciam falta de saneamento

Reclamações de violações dos direitos humanos marcaram audiência pública na tarde desta segunda-feira (22).

22/04/2013 - 19:47

A falta de saneamento básico nos assentamentos Dandara, no bairro Céu Azul; Camilo Torres, Eliana Silva e Irmã Dorothy, no Barreiro; Helena Greco, no Conjunto Zilah Spósito; Vila da Luz e Vila da Paz, às margens do Anel Rodoviário; e Vila Bandeirantes, no entorno da Avenida Raja Gabaglia, foi um dos temas debatidos nesta segunda-feira (22/4/13) em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

O deputado Durval Ângelo (PT) iniciou a reunião enfatizando que a moradia é um direito fundamental do ser humano. "Quem luta por moradia são cidadãos conscientes. Bandido é quem nega moradia aos pobres. A imprensa desqualifica o trabalho da Comissão de Direitos Humanos, dizendo que é só para garantir direito de bandido. Mas isso não é verdade".

O autor do requerimento que deu origem à audiência pública, deputado Rogério Correia (PT), relatou que chegaram ao seu gabinete denúncias de ameaças de remoções e despejo de várias famílias em comunidades de baixa renda. Segundo ele, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) não dá condições de moradia e as pessoas carentes se veem obrigadas a viver em condições degradantes. "Estivemos com a presidenta Dilma Rousseff em Ribeirão das Neves. Foram entregues 1.640 apartamentos. Por que em BH não se tem essas entregas de apartamentos? A Prefeitura atua na contramão: ao invés de criar condições para que essas pessoas possam viver bem onde estão, trabalha para fazer desocupações".

O parlamentar relatou também denúncias a respeito de sorteio de casas para o programa Minha Casa, Minha Vida. De acordo com o deputado, muitos membros de comunidades carentes não foram contemplados, enquanto foram sorteadas pessoas inscritas há pouco tempo ou que sequer estavam inscritas. "Inclusive o Ministério Público abriu uma investigação a respeito", ressaltou.

Falta saneamento básico nas comunidades

Membro do Movimento de Libertação dos Bairros e morador da comunidade Eliana Silva, Leonardo Perez relatou que um problema comum a todas as ocupações citadas é a falta de saneamento básico. "No Dandara há fossas; no Eliana Silva, não é propício fazer. A Copasa precisa providenciar um sistema de esgotamento. A Camilo Torres e a Dorothy estão sem água para beber. E a Polícia Militar está reprimindo muitas famílias nos últimos dias, ostensivamente, com helicóptero. Precisamos da urbanização dessas comunidades. Muitas já estão lá há mais de 5 anos. Desocupação não faz sentido".

O assessor de comunicação da Comissão Pastoral da Terra, frei Gilvander Luís Moreira, relatou a falta de água nas ocupações Camilo Torres e Irmã Dorothy. "É uma covardia, uma falta de humanidade. Aquelas terras foram griladas, eram públicas. O povo tem o direito de continuar naquelas terras. Não podemos tolerar esse termo de ajustamento de conduta (TAC) que proíbe a Copasa e a Cemig de instalarem água e luz nas comunidades. Não queremos a revisão desse TAC, mas sim extingui-lo. Existem 114 famílias debaixo do Anel Rodoviário".

Moradora do assentamento Dandara, Ângela Pinto manifestou revolta pela falta de condições básicas de moradia e pelo desinteresse do município em fazer a urbanização da área. "Ao invés de desapropriar quem está morando lá, tinha que nos dar condições de continuar morando lá e construir casas para aqueles que precisam. Se o Governo do Estado e o prefeito construíssem, estaríamos sem esse problema. BH não tem construção de moradia. Somos eleitores. Não é justo. Precisamos de saneamento básico. Quando as fossas encherem, o que faremos? A Copasa precisa colocar esgoto para nós. Queremos pagar por esses serviços".

O deputado Durval Ângelo ressaltou que o único lugar no Brasil onde é proibido prestação de serviços de água e luz em ocupações irregulares é em Belo Horizonte, por causa do TAC. Outros moradores dos assentamentos que estiveram presentes à audiência relataram diversas dificuldades que passam graças à falta de luz, saneamento básico, telefone, asfalto e transporte público nos locais onde moram.

População se mostra insatisfeita com Minha Casa, Minha Vida

Membro do Fórum Mineiro pela Reforma Urbana, Welton Pimentel Freitas relatou a situação da Vila da Luz, às margens do Anel Rodoviário. "O que vimos infringe mais de dez direitos humanos constitucionais. Não é possível ser humano nenhum viver daquele jeito. Cidades da Região Metropolitana de Belo Horizonte conseguem construir casas pelo Minha Casa, Minha Vida. Mas em BH, o prefeito leiloou terrenos públicos e agora procura a União para arrumar terrenos para construir casas", acusou.

A diretora de Planejamento da Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (Urbel), Maria Cristina Fonseca de Magalhães, rebateu as críticas à Prefeitura. Ela afirmou que há convênio entre Urbel e Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) para a construção de unidades habitacionais em três anos para reassentar os moradores da Vila da Luz e da Vila da Paz. "O prazo é mais longo porque pressupõe cadastrarmos as famílias que serão atingidas pelas obras do Anel. Serão construídas 1.470 unidades no Jardim Vitória pelo Minha Casa, Minha Vida. Elas já foram sorteadas. Além dessas, temos também mais de 1.500 unidades em construção e terrenos públicos em fase de licenciamento, para podermos atender as demandas de vocês".

A diretora foi questionada por pessoas presentes à audiência quanto aos critérios para a realização dos sorteios do Minha Casa, Minha Vida. Segundo ela, o principal entrave para que os moradores dos assentamentos sejam beneficiados é a portaria federal que regulamenta a participação nos sorteios. "O que estamos buscando é que o Ministério das Cidades altere a portaria, para que as comunidades sejam atendidas". Quanto à ocupação da Vila Bandeirantes, na Raja Gabaglia, seria necessária a saída definitiva da população, tendo em vista estar próxima de uma encosta que oferece risco. No ano passado, antes do período chuvoso, muitas famílias foram removidas por esse motivo, segundo ela.

A superintendente substituta da Secretaria do Patrimônio da União, Joana D'arc Couto Soares, falou a respeito do esforço em buscar imóveis para serem destinados à provisão habitacional de famílias com renda entre zero e R$ 1.600. "Nas áreas adquiridas pelo Dnit serão alocados moradores da Vila da Luz e da Vila da Paz. Estamos buscando identificar outras áreas, remanescentes da Rede Ferroviária Federal, para atender essa demanda enorme que Belo Horizonte e Minas Gerais têm. Temos um grupo de trabalho discutindo mensalmente a regularização fundiária e a provisão habitacional. E confiamos que o relatório que a Plataforma Brasileira de Direitos Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (Dhesca) vai produzir nos ajude a retirar os entraves do processo".

Entidade vinculada à ONU relata desrespeito aos direitos humanos

Em visita à Capital, o relator nacional do direito à cidade da Plataforma Dhesca, Leandro Franklin Gorsdorf, disse ter ficado surpreso com a situação de violação sistemática de direitos humanos em comunidades em que esteve, como a Vila da Paz. “Já estive em vários lugares, mas as condições subumanas que vi em Belo Horizonte me entristeceram. Em um mês vou apresentar um relatório com o que constatei. Mas adianto a vocês que o que percebi é que existe uma política de exclusão. O poder público elege certas áreas da cidade e suspende seus direitos. E dizer que essas áreas são de posse privada não é desculpa. É responsabilidade do município intervir para garantir direitos a todos. Essas áreas estão ocupadas porque não tinham destinação social. Como a Prefeitura leiloa áreas que deveriam ser destinadas à ocupação? Despejo não pode ser política pública. O Minha Casa, Minha Vida não é solução para todos. Aqueles que mais precisam não estão conseguindo ter acesso”.

O relator ressaltou também que a política habitacional de Belo Horizonte precisa levar em consideração os movimentos sociais. “A Prefeitura tem que interferir nas ações de despejo e pedir a suspensão, até que a situação seja regularizada. E esse TAC precisa ser suspenso. Luz e água são direitos fundamentais.

O deputado Durval Ângelo sugeriu que a Plataforma Dhesca apoie as comunidades na realização de uma ação civil pública contra a PBH, o Governo do Estado e o Ministério Público, no que foi apoiado pelos representantes da entidade. Ele também frisou que o assentamento Dandara não precisa ser realocado e sim regularizado, com saneamento básico e urbanização, tendo em vista sua organização.

Requerimentos – Ao final da reunião, o deputado Rogério Correia leu uma série de requerimentos formulados durante a audiência e que serão apreciados posteriormente, envolvendo o envio de notas taquigráficas a todos os órgãos envolvidos com os problemas relatados e uma visita da Comissão de Direitos Humanos aos assentamentos Eliana Silva e Camilo Torres, para verificar a situação na qual se encontram seus moradores.