A polêmica gira em torno da Lei Municipal 3.754, de 2007, cujo capítulo XI trata da poluição sonora, limita barulhos e ruídos a níveis de decibéis
Para Silvano Tolentino, a lei municipal é menos tolerante que a estadual
O major Paulo Veloso disse que a PM já registrou pessoas que se mudaram devido à poluição sonora

Artistas reclamam da Lei do Silêncio em Montes Claros

Comissão de Cultura debateu a poluição sonora na maior cidade do Norte de Minas nesta terça-feira (26).

26/03/2013 - 14:24

O excesso de rigor dos órgãos fiscalizadores da Lei do Silêncio, que permite o volume máximo de apenas 50 decibéis no horário noturno em Montes Claros (Norte de Minas), tem deixado insatisfeita a classe artística da cidade. Para debater a questão, que envolve a ação da polícia ambiental, a Comissão de Cultura da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizou, nesta terça-feira (26/3/13), audiência pública no município, com a presença dos deputados Elismar Prado (PT) e Paulo Guedes (PT).

De acordo com Paulo Guedes, autor do requerimento que motivou a reunião, é preciso buscar soluções para o problema, levando em consideração todos que se sentem prejudicados, tanto de um lado quanto do outro. “Donos de bares, restaurantes e artistas reclamam que o rigor da lei traz prejuízos financeiros para a cidade. Por outro lado, temos que ouvir setores da comunidade que reclamam da atuação da polícia. Montes Claros tem um movimento cultural muito forte, que não pode ser desconsiderado. E esse movimento se sente reprimido atualmente”, afirmou o parlamentar.

Toda a polêmica gira em torno da Lei Municipal 3.754, de 2007, que dispõe sobre a política municipal de proteção, preservação, conservação, controle e recuperação do meio ambiente e de melhoria da qualidade de vida em Montes Claros. De modo específico, seu capítulo XI, que trata da poluição sonora, limita barulhos e ruídos a níveis de decibéis para cada turno do dia: manhã, tarde e noite. Para o vereador Diu Andrade, a lei tem que ser aplicada, mas pode ser flexibilizada.

“Esse é um problema antigo. Há muitos abusos que não podem continuar. Moro no centro da cidade, e de vez em quando sai um carro à uma da manhã com o som muito alto. Há carros de propaganda próximos de escola e hospital. É preciso ter bom senso”, ressaltou o prefeito Ruy Muniz.

De acordo com ele, a legislação municipal é comparável à de outras cidades, como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. “É bem moderna, mas pode evoluir em um ponto, que talvez contemple o que a maioria gostaria que fosse atendido. Sugiro que o nível de som medido, dentro dos níveis reais do ambiente do suposto incômodo, possa ser de até 70 decibéis exclusivamente para eventos esporádicos”, destacou o prefeito.

Representando a classe artística, o poeta e letrista João Aroldo Pereira observou que a Lei do Silêncio não é só ligada à música. “A cultura é menosprezada historicamente. Montes Claros tem seu DNA cultural. São muitos músicos que dedicam sua vida a levar lazer para a população. Essa discussão de decibéis é importante, a lei é para ser cumprida, mas tem que se adequar à realidade. Precisamos chegar a um denominador comum, que atenda as partes e também o setor cultural”, defendeu.

Partes estão em busca de consenso

Para Silvano Tolentino, vice-presidente do Sindicato dos Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Montes Claros, a lei municipal é menos tolerante que a estadual. “Existe um exagero da Polícia Militar. A lei diz que a medição deve acontecer no ambiente do suposto prejudicado. Mas as medições são feitas no passeio do estabelecimento. Quem está ali presente busca o lazer”, registrou.

A polícia, segundo colocado na audiência, estaria atuando nesses casos sem ser acionada por reclamantes. Para Tolentino, contudo, se não houve reclamação de barulho, não existe prejuízo. “A polícia vai continuar agindo sem que sejam provocados e atrapalhar o funcionamento das empresas que geram muitos empregos na cidade? Ou vai atuar de ofício na área de violência urbana?”, questionou ele.

Tolentino referiu-se ao artigo 62 da lei, que estabelece limites máximos permissíveis de ruído. “Independentemente do ruído de fundo, o nível de som proveniente da fonte poluidora, medido dentro dos limites reais da propriedade onde se dá o suposto incômodo, não poderá exceder os níveis fixados no artigo 60”.

PM diz que busca conciliação

Em resposta, o comandante da 11ª Cia. Independente de Meio Ambiente e Trânsito da Polícia Militar, major Paulo Eliedson Veloso, afirmou que, no período de um ano, foram atendidas 1.457 solicitações de perturbação do sossego. Desse total, apenas em 30% dos casos foram registrados boletins de ocorrência, porque foi tentada por várias vezes a conciliação. “Temos registro de pessoas que se mudaram por conta de poluição sonora de bar com música ao vivo. A regra é a proteção da coletividade”.

De acordo com o major, o embate hoje é para saber qual o critério que será adotado. “A PM tem um limite para praticar seu papel conciliador, mas precisamos de um respaldo. Eu me comprometo a levar a questão ao meu superior para que possamos praticar mais a conciliação”, afirmou.

O secretário municipal de Desenvolvimento Social, Franklin Silveira, propôs a criação de uma comissão formada por diversos setores da sociedade para analisar as questões levantadas na audiência e que contemplem todas as partes. Já o secretário municipal de Cultura, Esporte e Juventude de Montes Claros, Carlos Roberto Borges Muniz, chamou a atenção para a importância de se avaliar os decibéis tanto no local do evento quanto fora dele. Por sua vez, o vereador Cláudio Prates, vice-presidente da Câmara Municipal de Montes Claros, manifestou o desejo de resolver o conflito, que nesse momento exige uma resposta da Câmara.

Outros participantes também tiveram oportunidade de apresentar seus pontos de vista. O músico Tiago Pinho reclamou da associação entre cultura e drogas e  criticou a ação repressiva da polícia com os músicos que tocam à noite no município. Outra proposta levantada na reunião é que os músicos comecem e terminem as apresentações mais cedo.

Deputado sugere ações imediatas

Após as discussões, o deputado Paulo Guedes anunciou que na próxima reunião da comissão será votado um requerimento para que o comando da Polícia Militar apure se as ocorrências a cargo da Polícia Ambiental relacionadas à Lei do Silêncio foram registradas a pedido de moradores ou de ofício.

Em situações de reclamações, o parlamentar sugeriu que, desde já, a PM passe a fazer as medições dos decibéis no ambiente do reclamante, e não no ponto de origem do barulho. Ele adiantou que vai propor, ainda, a formação de um grupo de trabalho formado por representantes da PM, da área cultural e da sociedade em geral para discutir a adequação da legislação.

Incentivo à cultura - Antes de iniciar a discussão, o deputado Elismar Prado destacou pontos do trabalho da comissão. “Realizamos uma grande audiência para tratar da mudança da Lei de Incentivo à Cultura, uma proposta para reduzir de 20% para 5% a contrapartida dos empresários. Os produtores culturais conseguem aprovar o projeto mas não conseguem captar recursos. A lei não resolve a grande demanda que nós temos, só pequenos grupos têm acesso aos recursos”, afirmou.