Parlamentares e convidados assistiram a lances polêmicos, que teriam beneficiado times cariocas e prejudicado mineiros
Deputados defendem mudança da CBF do Rio para Brasília

Deputados cobram mais transparência no futebol brasileiro

Audiência pública da Comissão de Esporte discute conduta da CBF e do STJD em relação a clubes mineiros.

30/10/2012 - 20:19

A mudança da sede da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) do Rio de Janeiro para Brasília; a profissionalização da arbitragem; a realização de concurso para preenchimento das vagas nos tribunais de justiça desportiva e a garantia legal do direito de livre manifestação dos torcedores nos estádios do País foram algumas das sugestões propostas nesta terça-feira (30/10/12) durante audiência pública da Comissão de Esporte, Lazer e Juventude da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Ao final da audiência, foram elaborados três requerimentos, que devem ser votados na próxima reunião da comissão.

A audiência pública foi coordenada pelo deputado Marques Abreu (PTB), presidente da comissão, e contou ainda com os deputados João Leite (PSDB), Tadeu Martins Leite (PMDB), Fabiano Tolentino (PSD) e Rogério Correia (PT). Os convidados presentes foram o secretário-geral da Federação Mineira de Futebol (FMF), Rodrigo Diniz; o diretor comercial do Cruzeiro, Robson Pires; o ex-auditor do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) e desembargador do Tribunal de Justiça, Eduardo Machado; e o juiz federal e comentarista esportivo da Rádio CBN, Lincoln Pinheiro Costa. Convidados, nem a CBF, nem o STJD enviaram representantes. Os presidentes do Atlético e do América também foram convidados, mas não compareceram.

O objetivo da reunião, realizada no auditório, era debater a relação da CBF e do STJD com os clubes de futebol de Minas Gerais. Neste sentido, o primeiro requerimento sugere a realização de um seminário legislativo, inclusive com o envolvimento das comissões de esporte de outras assembleias legislativas pelo País, para discutir formas de se democratizar a composição do STJD, órgão responsável por julgar os casos disciplinares nas partidas do Campeonato Brasileiro.

O segundo requerimento pede providências ao Ministério Público (MP) contra o cerceamento do direito de liberdade de expressão dos torcedores mineiros na partida Atlético 3 x 2 Fluminense, no último dia 21, na Estádio Independência, quando a torcida alvinegra reclamou de suposto favorecimento da CBF à equipe carioca. Por fim, o terceiro requerimento encaminha denúncia ao MP por conta de suposta ilegalidade na nomeação do auditor Jonas Lopes de Carvalho Neto, da 2ª Comissão Disciplinar do STJD, torcedor declarado do Flamengo nas redes sociais, responsável pela suspensão do meia-atacante atleticano Ronaldinho Gaúcho, ex-jogador do Rubro-Negro, do jogo contra o Internacional.

Lances polêmicos – O deputado Rogério Correia, um dos autores do requerimento para o encontro, citou o artigo 34 do Estatuto do Torcedor ao alertar que o STJD não vem cumprindo com os princípios da impessoalidade, independência, moralidade, celeridade e publicidade em suas decisões, notadamente naquela envolvendo a suspensão de Ronaldinho Gaúcho em partida decisiva para o Atlético. O parlamentar também denunciou que Rio de Janeiro, com 21 auditores, e São Paulo, com 18, dominam mais de 60% daquele tribunal, favorecendo os clubes cariocas e paulistas em suas decisões, enquanto Minas Gerais conta atualmente com apenas três auditores.

Rogério Correia também exibiu um vídeo em que foram compilados lances polêmicos desta edição do Brasileirão em que o Fluminense teria sido favorecido pela arbitragem, como a marcação de pênaltis inexistentes, pênaltis não marcados e expulsão de jogadores adversários, inversão de faltas e anulação de gols legítimos, como o marcado de falta por Ronaldinho Gaúcho, contra o Fluminense, em que o árbitro viu falta de um jogador atleticano sobre a barreira tricolor. No mesmo vídeo há um lance idêntico de uma partida do Fluminense contra o Vasco, em que um jogador tricolor fez o mesmo e o gol não foi anulado. “Problemas assim precisam ser questionados, pois precisamos garantir o cumprimento do que diz o Estatuto do Torcedor. O STJD precisa de mudanças em sua composição com escolhas mais democráticas”, afirmou o deputado.

Futebol movimenta 5% do PIB mundial

“O futebol está se tornando algo chato de se ver. As pessoas envolvidas no esporte vivem do aplauso, mas as manifestações críticas, quando pacíficas, também são bem-vindas para que o futebol possa se aprimorar”, declarou o deputado Marques Abreu, ex-jogador de futebol, ao repudiar a possibilidade de o Atlético ser multado pelo protesto de seus torcedores contra a CBF. Da mesma forma, ele lembrou que o Cruzeiro também pode ser punido injustamente porque um torcedor não identificado teria apontado um laser para o gramado em uma partida disputada em Varginha, no Sul de Minas. “Enquanto isso, há dois auxiliares de arbitragem atrás dos gols que nunca vêem nada”, reclamou.

O deputado João Leite, que também foi jogador de futebol, lembrou que não podem pairar dúvidas sobre a legitimidade do resultado de uma partida de futebol profissional, sob risco de comprometer os investimentos futuros no esporte. “O futebol já movimenta 5% do PIB mundial e é responsável pela geração de 200 milhões de empregos em todo o mundo. Futebol é paixão, mas é negócio também, e é por isso que é responsabilidade dos parlamentos discutirem seriamente esse assunto. O ideal inclusive é que a CBF, o STJD e todas as confederações esportivas tenham suas sedes em Brasília, um lugar neutro, sem pressão das partes interessadas. Afinal, o Rio de Janeiro não é mais a capital do Brasil”, afirmou.

O deputado Tadeu Martins Leite lamentou a ausência da CBF e do STJD na audiência pública. “Mas eles terão outra chance de se fazerem representar. Este será o primeiro de muitos encontros com o objetivo de garantirmos os direitos dos torcedores, tanto da livre expressão nos estádios quanto de assistirem a um jogo justo, sem interferências extracampo. Se assim não for, o futebol vai se transformar em um esporte artificial e o torcedor vai perder o entusiasmo”, disse.

Já o deputado Fabiano Tolentino foi na mesma linha e disse compreender que o árbitro esteja sujeito a erros, mas que é preciso encontrar formas de diminuí-los, pelo bem do futebol. “Precisamos deixar a paixão de lado e encontrar soluções. Como o futebol é a coisa mais importante entre as menos importantes, precisamos saber até que ponto o que se faz nos bastidores influencia no resultado de uma partida”, questionou.

Entre os convidados, Rodrigo Diniz, da FMF, declarou que há previsão legal para que sejam limitadas as manifestações dos torcedores nos estádios, que, segundo ele, tem a função de garantir que o evento transcorra sem incidentes. Contudo, disse ser favorável a que se discuta uma mudança nos regulamentos vigentes, flexibilizando tal conduta. Robson Pires, dirigente do Cruzeiro, defendeu que o quadro de árbitros do Brasileirão seja profissionalizado. “Já ganhamos e perdemos títulos sendo prejudicados pela arbitragem. É preciso mais investimento nessa área e uma legislação mais inteligente porque quando um clube é punido, muitas vezes os torcedores e até mesmo o adversário é punido, com a mudança de um local de jogo, por exemplo”, citou.

Concurso para auditor – Já o comentarista esportivo Lincoln Costa sugeriu a realização de concurso para os cargos de auditores do STJD, a exemplo do que acontece com a magistratura, sob a fiscalização da OAB, para que o órgão ganhe mais legitimidade. “O primeiro passo para moralizarmos o futebol é colocá-lo na agenda política, levando esta discussão até Brasília, com a participação de outros Estados prejudicados. A CBF e as federações hoje são monarquias, com quase nenhuma rotatividade”, apontou.

Por fim, o desembargador Eduardo Machado cobrou um maior envolvimento da FMF e dos clubes mineiros no processo de escolha dos auditores do STJD e uma mudança de filosofia de todos os envolvidos com o futebol. “Todo mundo se acha no direito de chamar o pobre coitado do árbitro de ladrão, de venal, mas e os 50, 60 passes errados que os atletas profissionais erram por jogo? Liberdade de expressão é falar mal da mãe do árbitro? Qualquer cidadão tem o direito de recorrer a Justiça para fazer valer seus direitos, mas falar mal da CBF é mais fácil. O Estatuto do Torcedor é excelente, basta que ele seja aplicado”, concluiu.

Consulte o resultado da reunião.