Chan Kou Wha lembra que o Código de Trânsito Brasileiro prevê educação sobre trânsito nas grades curriculares
Especialistas acusam brasileiro de ser conivente com acidentes de trânsito

Palestrante aposta na educação contra violência no trânsito

Ciclo de Debates Siga Vivo foi encerrado nesta sexta-feira, mas sugestões podem ser encaminhadas até segunda-feira (9)

06/07/2012 - 15:06

A Assembleia Legislativa de Minas Gerais encerrou, nesta sexta-feira (6/7/12), o Ciclo de Debates Siga Vivo: Pelo fim da Violência no Trânsito, com a mesa-redonda: Sociedade e Governos na Busca da Redução dos Acidentes de Trânsito. A coordenação dos trabalhos foi da deputada Maria Tereza Lara (PT) e do deputado Bosco (PTdoB). O parlamentar anunciou que será apresentado à Mesa da ALMG requerimento propondo que a TV Assembleia produza um programa semanal sobre segurança no trânsito. Lembrou, ainda, que tramita na Casa o Projeto de Lei (PL) 3.317/12, para incluir o tema na grade escolar.

Propostas para o documento final do evento ainda podem ser apresentadas até a próxima segunda-feira (9). Após a palestra do consultor Osias Baptista Neto, o professor do Centro Federal de Educação Tecnológica (Cefet-MG), Chan Kou Wha, abriu sua exposição fazendo um alerta: “Mesmo depois de 15 anos da criação de nossa legislação, a educação para o trânsito ainda não foi implementada”.

O professor do curso de Transportes e Trânsito do Cefet fez referência aos artigos 74 e 76 do Código de Trânsito Brasileiro (Lei Federal 9.503, de 1997), que dispõem, respectivamente, sobre o direito universal à educação para o trânsito e sobre a obrigação de inserir o tema nas grades curriculares da pré-escola ao ensino superior. “Nossos jovens de hoje, com 15 anos, deveriam ter sido formados para a segurança no trânsito. São justamente eles os que mais morrem em acidentes, cerca de 50% das mortes acontecem entre pessoas de 15 a 30 anos”, enfatizou.

Chan Wha afirmou que outro motivo de preocupação é a falta de entendimento, inclusive de agentes públicos e técnicos da área, acerca da educação. Para o educador, a formação não pode se resumir a programas ou campanhas sobre o uso do cinto de segurança ou da faixa de pedestres. “Essas ações pontuais são importantes, mas a educação deve ser pensada de forma integrada e multidisciplinar”.

O superintendente regional da Polícia Rodoviária Federal, Davi Stanley Bomfim Dias, concordou com o professor, mas disse acreditar que a escola sozinha não é suficiente. De acordo com ele, a educação deve começar em casa. Ele ponderou que o trabalho dos policiais, das escolas e dos legisladores não terá sucesso se a própria sociedade não estiver disposta a mudar de atitude. “Um pai que entrega o carro ao filho inabilitado está deseducando. Assim, nem todo o esforço possível será capaz de refrear os acidentes”, esclareceu.

Ele lembrou que Minas Gerais tem a maior malha rodoviária do País, mais de 6 mil quilômetros, e que há pontos críticos nas BRs 040 e 381, sendo o contingente das forças policiais insuficientes para fazer a fiscalização rotineira de todos os trechos. Por isso, segundo Dias, é importante insistir na responsabilidade compartilhada. O policial ressaltou ainda que não há rodovias ou curvas da morte. “Quem mata somos nós”.

Já o comandante do Batalhão de Trânsito da Polícia Militar, tenente-coronel Roberto Lemos, afirmou que o poder público terá que aprender a pensar o trânsito junto a outros âmbitos de atuação, não só a educação. Ele conta que a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), por exemplo, trará consequências para o tráfego nas cidades. Lemos esclareceu que, só em maio de 2012, mais 340 mil carros passaram a circular em Belo Horizonte. “Temos que avaliar o custo-beneficio de medidas como essa. Sabemos que, nos últimos cinco anos, a frota de automóveis em BH aumentou 30,9%. Estatisticamente está comprovado que o aumento da frota é proporcional ao de acidentes”, concluiu.

Ações institucionais – A gerente de Educação para o Trânsito do Departamento de Estradas de Rodagem (DER-MG), Roseli Fantoni, e a diretora de Atendimento de Informação da BHTrans, Jussara Bellavinha, apresentaram as ações que suas instituições vêm realizando nos últimos anos para tentar reduzir a violência no trânsito. O órgão estadual investiu, entre 2003 e 2012, R$ 8 bilhões na conservação de vias estaduais, aquisição de equipamentos e educação. Roseli informou que, em 2011, 73% das rodovias administradas pelo Estado foram consideradas em boas condições. Elas contam com 74 praças de pesagem e 224 redutores eletrônicos de velocidade, segundo ela. A gerente informou ainda que atualmente estão sendo realizadas 75 obras de reforço e alargamento de pontes.

Em Belo Horizonte, as principais ações de fiscalização promovidas pela BHTrans estão na instalação de radares fixos e móveis, disse Jussara Bellavinha. Além disso, afirmou, a empresa realiza sistematicamente blitze em caminhões, fiscalização de bares e campanhas junto a estudantes.

Em relação às vítimas de acidentes em Belo Horizonte, os dados mais recentes trazidos pela diretora se referem a 2010. Jussara afirmou que, naquele ano, foram registradas 262 mortes no trânsito. Em termos relativos, foram 11,4 vítimas para cada 100 mil habitantes, número inferior à média brasileira, que está em torno de 18. Na Capital ocorreram 3.064 atropelamentos, sendo que 105 pedestres morreram na hora.

A formação dos condutores de veículos no Brasil foi criticada pelo presidente do Sindicato dos Proprietários dos Centros de Formação de Condutores (SiproCFC-MG), Rodrigo Fabiano da Silva. Ele considerou “ridícula” a carga horária de preparação de motoristas e motociclistas atualmente exigida pela legislação. “É preciso um novo modelo”, alertou, justificando que o trânsito mudou muito nos últimos 50 anos, mas os exames de direção permanecem praticamente os mesmos.

Ele disse ainda que os instrutores precisam ser mais bem qualificados, aprimorando os conceitos de educação e cidadania. Silva garantiu ainda que os CFCs de Minas estão à disposição para participar de campanhas educativas para o trânsito nas escolas, em parceria com as instituições públicas.
 
Maior conhecimento das normas de trânsito também é defendido

Frisando que não faltam leis de trânsito no País, e sim conhecimento das normas e soluções práticas, o presidente do Sindicato dos Transportadores Autônomos de Carga de Minas Gerais, José Acácio Carneiro, sugeriu a criação de uma comissão formada por Ministério Público, órgãos governamentais e entidades da sociedade civil para verificar a adoção de providências necessárias à segurança no trânsito. Muitas delas, disse ele, já são conhecidas e, se adotadas, poderiam estar evitando acidentes graves. A exemplo de áreas de escape em rodovias e saídas emergenciais em vias como o Anel Rodoviário, conforme simulação que ele exibiu em vídeo durante sua fala. "É preciso deixar de demagogia e fazer o que deve ser feito", frisou.

O representante dos transportadores de cargas ainda questionou, por outro lado, se proprietários de caminhões estariam, ao contratar autônomos, cumprindo a legislação que obriga que o trabalhador tenha três anos de experiência na atividade ou aprovação em curso específico. "Todo contratante tem que oferecer treinamento", registrou. Para ele, apesar da responsabildiade do contratante, somente a conduta do motorista costuma ser questionada em casos como o do acidente envolvendo uma carreta que perdeu o freio na avenida Nossa Senhora do Carmo, em Belo Horizonte, em 6 de junho, atingindo sete veículos e resultando na morte de três pessoas.

O presidente da Federação das Empresas de Transporte de Passageiros de Minas Gerais, Waldemar Araújo, disse reconhecer que diminuir a violência no trânsito requer mudança de cultura e investimento em educação, como pontuado durante todo o ciclo de debates. Mas ele ponderou que, diante do cenário atual, deve haver também reforço do policiamento, com investimentos em efetivo e equipamentos, e da capacitação de motoristas, por dirigirem veículos de última geração.

Respeito – Já os representantes de motociclistas e ciclistas defenderam maior respeito da sociedade. O coordenador da Associação Mountain Bike BH de Ciclismo, Vinícius Mundim Zucheratto, se disse incrédulo quando a motorista que atingiu a bicicleta da esposa explicou ter jogado o carro sobre ela para não bater em outro veículo que teria lhe fechado no trânsito. Vinícius também frisou que poucos conhecem o artigo 201do Código de Trânsito Brasileiro, que determina em 1,5 metro a distância lateral entre um veículo e o ciclista que se deseja ultrapassar de carro.  Ele defendeu campanha educativa nesse sentido e maior fiscalização, com aplicação de multas aos que descumprirem a norma.

Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Motociclistas e Ciclistas de Minas Gerais, Rogério dos Santos Lara acrescentou que a categoria atua para "salvar" aqueles que não têm tempo de resolver situações pessoais e profissionais, como receber remédios urgentes ou ter documentos entregues.  Ele disse que já há falta de trabalhadores no ramo e que a categoria é mais vítima do que causadora dos problemas no trânsito. "Fomos introduzidos num trânsito e numa política trabalhista que não se prepararam para nos receber", criticou.