Famílias reivindicam posse de terra em Salto da Divisa
Para trabalhadores e lideranças locais, fazenda é improdutiva e tem terrenos devolutos
05/03/2012 - 19:47Entoando gritos de “pátria livre” e carregando faixas de protestos e produtos cultivados na agricultura, as famílias que ocupam área denominada Manga do Gustavo, em Salto da Divisa (Vale do Jequitinhonha), e que estão na iminência de sair do local devido a uma decisão judicial de reintegração de posse, reivindicaram, nesta segunda-feira (5/3/12), o direito de ocupação do terreno.
Em audiência pública promovida pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, requerida pelo seu presidente, deputado Durval Ângelo (PT), lideranças locais afirmaram que a fazenda é improdutiva e tem declaradamente 480 hectares em terrenos devolutos, conforme documentação apresentada pelo advogado da Comissão Pastoral da Terra – Regional Jequitinhonha – e membro da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, Elcio Pacheco.
A defensora dos Direitos Humanos do Grupo de Apoio e Defesa dos Direitos Humanos de Salto da Divisa, Geralda Magela da Fonseca, disse que a propriedade não cumpre sua função social, conforme preconiza a reforma agrária. Na oportunidade, trabalhadores sem-terra também relataram que foram despejados do local e tiveram seus animais mortos.
Na audiência, a 12a Vara Agrária Federal foi acusada de favorecer os latifundiários. Segundo o deputado Durval Ângelo, há dois anos o órgão não dá ganho de causa para os trabalhadores rurais em Minas Gerais. O superintendente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Carlos Alberto Menezes Calazans, concordou com o parlamentar, afirmando que encaminhou denúncias ao Conselho Nacional de Justiça, solicitando uma investigação sobre o caso.
O conflito agrário na região de Salto da Divisa persiste desde 2006, quando 185 famílias do Movimento dos Sem Terra (MST) ocuparam parte da fazenda Manga do Gustavo, para exigir a desapropriação de área vizinha, na fazenda Monte Cristo, ambas de propriedade da Fundação Tinô da Cunha. A ação de reintegração de posse da fazenda Manga do Gustavo transitou em julgado, com sentença favorável à Fundação, o que faz com que os trabalhadores tenham que desocupar a área.
Para Elcio Pacheco, a judicialização dos processos de reforma agrária é uma manobra para impedir que os trabalhadores sejam assentados, a exemplo do que vem ocorrendo em Salto da Divisa. A coordenadora da Defensoria Especializada em Direitos Humanos, Coletivos e Socioambientais, Cleide Aparecida Nepomuceno, concordou e defendeu que a questão não deve ser tratadas somente na justiça. Para ela, as negociações devem envolver também o Incra. “A melhor solução seria o envolvimento de quem realmente tem poder para intervir a justiça social e distribuição de terra”, disse.
O deputado Rogério Correia (PT) reclamou da falta de infraestrutura da reforma agrária em Minas, afirmando que a maioria das famílias vive sem água, luz e em barracas de lona. Para o deputado Duarte Bechir (PSD), a audiência não será em vão, já que dará origem a uma série de requerimentos, que serão enviados às autoridades competentes, solicitando providências. Ele destacou ainda que, além de dar as terras, os governos também precisam continuar apoiando essas famílias.
Carlos Alberto Menezes Calazans anunciou que visitará, no começo de abril, a região de Salto da Divisa, para conhecer de perto o problema dos trabalhadores. Disse ainda que o Governo Federal entregará, em março, retroescavadeiras para auxiliar os assentamentos locais na abertura de poços e construção de estradas de acesso.
Requerimentos – Foram aprovados, na audiência, cinco requerimentos. Três deles, de autoria da Comissão de Direitos Humanos para que: sejam encaminhadas notas taquigráficas da reunião aos órgãos e autoridades mencionados no debate; seja enviado pedido de providência ao Secretário Extraordinário de Reforma Agrária de Minas Gerais e ao presidente do Incra para que agilizem o assentamento das famílias camponesas sem-terra, acampadas no município de Salto da Divisa, garantindo a função social da propriedade; seja realizada audiência pública para discutir a situação das famílias da ocupação Braúnas, em Ribeirão das Neves, que foram alvo de despejo com violação de direitos fundamentais, a despeito de estarem no terreno há 30 anos ininterruptos.
Também foi aprovado requerimento do deputado Paulo Guedes (PT) e da deputada Liza Prado (PSB) em que solicitam audiência pública para discutir a violência no campo nos município de Porteirinha, Janaúba e região (Norte de Minas). Requerimento do deputado Rogério Correia também foi aprovado na ocasião, solicitando audiência para discutir a superlotação de sistema prisional do Estado, que vem causando violações de direitos humanos dos detentos, em função da legislação que preconiza tratamento digno aos presos.