O Teatro da Assembleia ficou lotado de trabalhadores sem terra que acompanharam a reunião
Trabalhadores rurais e sem terra apoiam campanha que coíbe a venda de lotes em assentamentos

Lotes para reforma agrária não devem ser vendidos

Incra lança campanha de reforma agrária em audiência pública na ALMG e deputados e sem-terra condenam venda de lotes

14/12/2011 - 19:30

A reforma agrária é uma das medidas mais urgentes a serem tomadas no Brasil e as terras a ela destinadas não podem ser vendidas nem negociadas. Esse foi o pensamento predominante entre trabalhadores rurais sem terra, parlamentares e autoridades federais e estaduais que se reuniram na tarde desta quarta-feira (14/12/11), em audiência pública da Comissão de Política Agropecuária e Agroindustrial da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.

A reunião marcou o ato de lançamento da “Campanha Nacional de Reforma Agrária - Essa Conquista Não Está à Venda”, promovida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), com o objetivo de divulgar o esforço coletivo dos órgãos públicos ligados à terra e dos movimentos sociais organizados contra a venda de lotes destinados à reforma agrária. O encontro serviu também para promover o debate sobre a organização social e produtiva dos assentamentos, seus problemas e desafios.

Conduzida pelo presidente da comissão, deputado Antônio Carlos Arantes (PSC), a audiência pública atendeu a requerimento do deputado Rogério Correia (PT) e outros, e contou também com a participação dos deputados Fabiano Tolentino (PSD), vice-presidente, Doutor Viana (DEM), Pompílio Canavez (PT) e Rômulo Viegas (PSDB).

Deputado denuncia preconceito

Todos os parlamentares presentes ressaltaram a importância do debate para o esclarecimento da sociedade e a concretização da reforma agrária. O autor do requerimento, Rogério Correia, aproveitou para cobrar do governo mais agilidade na liberação do crédito fundiário para os assentados e pequenos produtores. Afirmou que a reforma agrária é uma das mais importantes a serem feitas no Brasil, mas precisa de impulso. “Dificilmente ela será realizada sem o movimento social”, disse.

Segundo ele, é preciso superar o preconceito que existe hoje, no País, contra os trabalhadores sem terra. Admitiu que pode haver oportunismo por parte de alguns que adquirem os lotes dentro do programa de reforma agrária e depois os vendem. Contudo, frisou que isso não corresponde à postura da maioria, acrescentando que alguns que assim agem podem ser movidos pelas dificuldades de tocar os projetos por falta de infraestrutura.

Correia afirmou que a agricultura familiar é responsável por 10% do Produto Interno Bruto (PIB) do País e que 70% do que é consumido no Brasil vem da agricultura familiar, já que o agronegócio trabalha mais com a monocultura voltada para a exportação. Saudando os trabalhadores rurais presentes à reunião, observou que a implantação da reforma agrária contribuirá para combater o êxodo rural, gerar empregos e promover a justiça social.

O deputado Doutor Viana afirmou que a discussão chegava “em boa hora” e destacou que a reforma agrária não pode ser feita sem que o governo promova também as condições de infraestrutura necessárias para que o programa seja bem sucedido. Citou como exemplo a China, que visitou no ano 2000, e onde, segundo afirmou, o governo garantiu aos assentados não só recursos financeiros, como crédito, e garantia de compra da produção, mas também uma infraestrutura básica, como escola, igreja e bancos, em agrovilas localizadas próximo aos assentamentos.

O presidente da comissão, Antônio Carlos Arantes, mencionou projeto de sua autoria (PL 2.595/11), em tramitação na Casa, que disciplina as condições e a forma de encaminhamento à Assembleia Legislativa do relatório e da relação das terras públicas e devolutas a serem alienadas ou concedidas administrativamente, sem prévia autorização legislativa, a que se refere o § 7º do art. 246 e o § 9º do art. 247 da Constituição Estadual. O PL tem por objetivo impedir que terras devolutas sejam usadas para especulação fundiária. O deputado Rômulo Viegas apoiou a proposição.

MST condena venda de lotes e denuncia criminalização do movimento

Representando o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Sílvio Neto condenou a venda de lotes da reforma agrária e afirmou que, apesar das dificuldades que enfrentam, seus militantes não admitem, em nenhuma hipótese, que os lotes sejam negociados. “A venda de lotes tem sido usada no Brasil pela burguesia agrária, aliada ao agronegócio e à mídia, que usam incidentes isolados para fazer uma ampla e maciça criminalização dos movimentos sociais”, disse.

Ele criticou também o modelo de agronegócio, voltado para a monocultura, e exaltou os projetos da agricultura familiar, “um modelo sustentável, que, mesmo com pouca terra e poucos recursos, responde pela maior parte dos alimentos na mesa dos brasileiros”. O líder do MST denunciou que o Brasil, “onde predomina o latifúndio improdutivo”, é o país que detém a maior concentração de terra no mundo, ressaltando que milhares de famílias, há mais de dez anos vivem sob lonas pretas, “à espera do sonho de ver a terra partilhada”.

A menina Flora Villela Faria Cardoso Rabello, de 9 anos, representando o movimento dos sem-terrinha, além de reforma agrária, exigiu escola, água encanada e condições dignas nos assentamentos.

Maria Rita Fernandes de Figueiredo, da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Minas Gerais (Fetaemg), afirmou que a campanha contra a venda de lotes chega “em momento oportuno”, mas observou que é pequeno o número de trabalhadores que negociam as terras. O superintendente do Incra no Estado, Carlos Calazans, anunciou que o governo federal pretende lançar uma ampla campanha pela regularização dos assentamentos em 2012. Segundo ele, só em Minas Gerais, há oito mil famílias acampadas à beira de estradas e embaixo de viadutos, algumas esperando há mais de dez anos pela reforma agrária. “Nosso objetivo é chegar em 2014, no final do governo Dilma, com o assentamento de todas as famílias acampadas”, prometeu.

Confira resultado completo da reunião