Especialistas querem leis de trânsito mais rígidas
Participantes de audiência pública querem medidas urgentes e eficazes para acabar com acidentes que matam 40 mil por ano
29/11/2011 - 19:32Implantar um Plano Nacional de Segurança Viária, que estabeleça medidas emergentes e leis mais rígidas para reduzir os acidentes de trânsito, e criar um comitê gestor para coordenar essas ações conjuntas nos três níveis de poder: municipal, estadual e federal. Essas foram algumas das sugestões defendidas por especialistas que participaram na tarde desta terça-feira (29/11/11), durante audiência pública da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. O objetivo da reunião foi debater a resolução da Organização das Nações Unidas (ONU), que definiu os anos de 2011 a 2020 como a década de ações de segurança no trânsito, uma orientação também da Organização Mundial de Saúde.
Os acidentes de trânsito já são a principal causa de morte entre jovens de 20 a 29 anos em todo o mundo e o Brasil é o quinto colocado na estatística, atrás apenas dos Estados Unidos, Índia, China e Rússia. O País registrou, ano passado, 40,6 mil mortes no trânsito, 25% delas com motocicletas e 60% motivadas por uso de álcool pelo condutor, de acordo com o presidente da Associação Mineira de Medicina do Tráfego, Fábio Antônio Rodrigues Nascimento. Diante da gravidade do tema, o presidente da comissão, deputado João Leite (PSDB), anunciou que em 2012 a Assembleia deve promover um fórum técnico para debater com mais profundidade o assunto.
Os números também são trágicos em Minas Gerais. Somente o Hospital de Pronto Socorro João XXIII, em Belo Horizonte, atendeu em 2010 16 mil vítimas do trânsito, metade envolvidas em acidentes com motos. O dado foi apresentado pelo médico cirurgião e coordenador do Serviço de Cirurgia Geral e do Trauma do Hospital João XXIII, Domingos André Fernandes Drumond. No primeiro semestre deste ano, já passaram pela instituição 4.221 vítimas de acidentes de moto, e a expectativa é de que o número chegue a 8,5 mil até o fim do ano. “Anualmente, o País recebe uma legião de incapacitados para o trabalho e com um custo altíssimo para a saúde pública”, lamentou o médico.
As mortes no trânsito trazem prejuízos também para a economia. Segundo o deputado Carlos Mosconi (PSDB), um terço do orçamento do Ministério da Saúde é destinado para atendimento a vítimas de acidentes. O presidente do Fórum Mineiro de Gerenciadores de Transporte e Trânsito, Galba Gomes da Silva, afirmou que os gastos com essas vítimas consomem 3% do Produto Interno Bruto do Brasil. A preocupação aumenta com o crescimento acelerado da frota de veículos, principalmente motos, consideradas muito mais perigosas para os condutores. Belo Horizonte possui 1,4 milhão de veículos, dos quais 18% são motos, conforme o delegado Ramon Sandoli, coordenador de Operações do Detran-MG. Anualmente, segundo Galba Silva, o número de carros aumenta 7% e o de motos, 14%.
Fatores de risco - O excesso de velocidade e o uso do álcool foram confirmados pelos especialistas como as principais causas dos acidentes de trânsito. O presidente do Fórum Mineiro explicou que a aceleração em 10 quilômetros por hora já faz diferença. A probabilidade de acidente com um carro a 50 km/h é de um para cada dez veículos; mas na velocidade de 60 km/h, o risco some para três a cada dez. “Noventa e cinco por cento dos acidentes são responsabilidade do condutor”, afirmou.
O delegado Sandoli disse que após a lei seca, entre 20 de junho e 31 de outubro, foram abertos 2.552 inquéritos policiais contra condutores que usaram álcool. Desse total de casos, 877 tiveram vítimas. A faixa etária que mais se envolve em acidentes na capital mineira é de 18 a 35 anos, a maioria com homens motoristas e jovens da classe média. Os acidentes ocorrem com mais frequência na zona Centro-Sul.
Fábio Nascimento afirmou que o condutor alcoolizado tem 10 vezes mais chances de se envolver em acidente do que o sóbrio. Por isso, ele defende a lei da tolerância zero para a presença de álcool no sangue. “Não há níveis seguros. O álcool, em qualquer quantidade, aumenta o risco de acidente”, justificou.
Participantes querem leis mais duras
Outras sugestões foram apresentadas durante a audiência pública, desde campanhas educativas até alterações na legislação. A presidente do Instituto Trânsito Seguro, Maria de Lourdes Barreto, quer que o crime de trânsito seja considerado doloso (com intenção de matar) e não mais culposo (sem intenção), como é atualmente. Mãe de Raquel Barreto, que morreu atropelada há três anos em Ipatinga, Maria de Lourdes lidera um movimento de recolhimento de assinaturas para pressionar o Governo Federal a fazer a alteração. Já foram colhidas 200 mil assinaturas em todo o País.
O presidente do Sindicato dos Transportadores de Cargas de Minas Gerais, José Carneiro, sugeriu a instalação de rampas de escape nas estradas para evitar acidentes com veículos sem freios, sobretudo caminhões. O deputado João Leite também defende a ideia e disse que viu, em Portugal, que a rampa realmente é eficiente. Trata-se de uma área, no acostamento das estradas, com brita e areia que serviria para frear o veículo desgovernado.
Melhorias nas estradas e investimento em educação no trânsito foram outras sugestões, mas a maioria dos participantes do debate concordou que a legislação precisa ser mais rigorosa e a fiscalização, mais ampla. “Todos querem punição, mas não querem ser punidos. É preciso mudar esta cultura”, disse a coordenadora da Gerência de Educação para o Trânsito do DER-MG, Rosely Fantoni. Ela lembra que a maioria das pessoas bebe antes de dirigir, atende celular ao volante e excede na velocidade, fatores de risco de acidentes. Rosely afirmou que a Espanha conseguiu reduzir 50% dos acidentes de trânsito com medidas mais efetivas e defendeu o mesmo para o Brasil.
O deputado Carlos Mosconi, também defensor do rigor da lei, disse que as estatísticas não mostram os dramas vividos pelas vítimas do trânsito, após os acidentes. “Como essas pessoas são tratadas? Para onde vão?”, provocou. Para ele, é preciso dar uma resposta rápida ao problema. A deputada Maria Tereza Lara (PT) também concordou que a violência no trânsito traz consequências graves para o setor de saúde.