Operadores de telemarketing denunciam más condições de
trabalho
A correta aplicação do Nexo Técnico Epidemiológico
(NTEP), a atualização da tabela do Nexo para reconhecer as doenças
psíquicas como doenças ocupacionais e a implantação do piso estadual
regional em Minas são as principais reivindicações dos operadores de
telemarketing. O assunto foi tratado em audiência pública da
Comissão do Trabalho, da Previdência e da Ação Social da Assembleia
Legislativa de Minas Gerais, nesta quarta-feira (13/7/11).
A reunião foi solicitada pelo deputado Celinho do
Sinttrocel (PCdoB) para lembrar o Dia do Operador de Telemarketing,
comemorado no dia 4 de julho. O teleatendimento é um dos setores que
mais empregam no Brasil, com mais de 1,2 milhão de trabalhadores, e
também está entre os que apresentam as piores condições de
trabalho.
O parlamentar manifestou sua preocupação com o
adoecimento desses profissionais e lembrou que, em audiência
realizada em abril, na Assembleia, para debater a saúde do
trabalhador, os relatos dos problemas vividos no setor de
teleatendimento eram os mais contundentes.
Celinho do Sinttrocel apoia a aplicação do NTEP,
para responsabilizar as empresas pelas doenças decorrentes das más
condições de trabalho, que teriam que arcar com as despesas do
tratamento dos funcionários. Segundo ele, há estudos dentro do
Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) para aplicar o Nexo no
teleatendimento para as funções de telefonista e telemarketing. "Ao
arcar com o tratamento dos trabalhadores, a empresa criará as
condições de trabalho, físicas e psicológicas para evitar que isso
se repita", argumentou.
Telemarketing é lucrativo para empresas
Em contraposição às condições precárias de
trabalho, o diretor da Secretaria-Geral do Sindicato dos
Trabalhadores em Telecomunicações do Estado (Sinttel-MG), Tiago
Santana Cassiano, afirmou que as empresas de telemarketing faturaram
R$ 6 bilhões em 2010, com previsão de elevar esse número para R$ 10
bilhões este ano. "O setor é bastante lucrativo, embora os salários
sejam tão baixos", afirmou.
Ele fez um desabafo de que, para a sociedade, o
operador não é vítima, mas vilão. "São seis horas de atendimento,
uma ligação após a outra, e o cliente acha que a gente quer
enrolar", afirmou, explicando que a responsabilidade das empresas
sobre a qualidade dos serviços prestados é transferida para os
trabalhadores. "Ninguém sonha em ser operador de telemarketing. Quem
trabalha nessa área é porque precisa", afirmou.
Tiago Cassiano disse já houve alguns avanços, como
o anexo II da NR 17, que é uma norma para auxiliar a atuação dos
auditores fiscais do trabalho e dos profissionais envolvidos com a
segurança e a saúde do trabalhador. No entanto, há outros pontos que
precisam avançar, como a aplicação do NTEP, o pagamento de pelo
menos um salário mínimo para a categoria, a luta contra os assédios
moral e sexual e a adoção do piso regional.
Ele ainda denunciou que todos na empresa sabem o
dia da medição da Anatel para aferir a qualidade do atendimento e,
nesses dias, são suspensas as pausas para banheiro, que são de 5
minutos por dia, e de lanche ou almoço, de 15 minutos.
Fiscalização - Em Minas
Gerais, só no setor de teleatendimento e cobrança, há cerca de 48
mil trabalhadores, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e
Desempregados (Caged), apresentados pelo auditor fiscal e
coordenador de Projetos da Superintendência Regional do Trabalho e
Emprego em Minas Gerais, Francisco Reis. Incluindo as empresas que
não têm o teleatendimento como atividade fim, seriam em torno de 100
mil operadores.
Ele relatou que os problemas envolvendo essa
categoria são diferentes nas grandes empresas de telemarketing e
naquelas em que o teleatendimento é uma atividade secundária, como
em pizzarias, por exemplo.
No primeiro grupo, os trabalhadores sofrem com a
pressão da empresa por metas e dos clientes que ligam para encerrar
contratos ou reclamar de produtos e serviços. No caso de outras
empresas, os operadores do teleatendimento não sofrem com a pressão
por metas, mas com péssimas condições de trabalho e jornada de 8
horas diárias em instalações precárias.
De acordo com o auditor, o Ministério do Trabalho
faz fiscalizações planejadas nas empresas de teleatendimento,
munidos de informações sobre sua atuação e conduta, e buscam um
trabalho de continuidade. No entanto, ele apontou que o principal
problema é de gestão da atividade. Os resultados, segundo o auditor,
acabam sendo lentos, porque implicam em mudança na cultura da
empresa.
Ele ainda contou que as empresas usam de muita
"criatividade" para driblar a legislação e a remuneração adequada
dos funcionários. Como exemplo, ele citou o caso de uma empresa de
Belo Horizonte que mantinha um centro de treinamento para operadores
de teleatendimento, sem assinar contrato com as pessoas que estavam
sendo treinadas e pagando apenas vale transporte e alimentação.
Dieese traçou perfil do trabalhador em
telecomunicação em Minas Gerais
O perfil do trabalhador em telecomunicações de
Minas Gerais foi levado aos participantes da audiência pelo técnico
do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos
Socioeconômicos (Dieese), Fernando Ferreira Duarte. Ele informou que
os operadores de telemarketing correspondem a maior parte dos
trabalhadores em telecomunicações. Segundo ele, em Minas, são 31.400
trabalhadores em telecomunicações, segundo dados da Relação Anual de
Informações Sociais (Rais) de 2009. A Rais é um documento pelo qual
o Ministério do Trabalho coleta dados sobre a atividade trabalhista
no País. O técnico esclareceu, no entanto, que a Rais não é capaz de
captar as terceirizações.
Em Minas estão cerca de 9% dos trabalhadores em
telecomunicações do Brasil. Quanto aos salários, a média em Minas
está bem abaixo da nacional. Em 2009, em Minas esse profissional
recebia em média R$ 922, enquanto a média nacional era de R$ 1.182.
A remuneração dos operadores de telemarketing, que são cerca 77,4%
da mão de obra em telecomunicações, era, na época, de R$ 529.
Operadores são jovens - Os
estudos também revelam que 77% dos trabalhadores do setor têm até 29
anos, mais de 50% têm até 25 anos e 68,8% são mulheres. É também uma
mão de obra bem qualificada: 98,5% têm escolaridade mínima de 2º
grau completo. "Se fizermos uma segmentação por atividade, o setor é
um dos que apresenta o melhor nível de escolaridade", afirmou.
O representante do Dieese também defendeu o piso
regional e disse que somente Minas Gerais e Espírito Santo não
adotaram ainda o piso, entre os estados das regiões Sul e Sudeste.
"Caso o piso não seja implantado em Minas, o Estado será procurado
pelas empresas interessadas em pagar menos aos funcionários e, do
ponto de vista social, isso não é nada bom", concluiu.
Para o deputado Tadeu Martins Leite (PMDB) o
assunto precisa ser tratado com cautela, porque o setor apresenta
graves problemas nas relações de trabalho e também emprega mais de 1
milhão de trabalhadores. "O setor supre necessidade de emprego,
sobretudo dos jovens, mas precisa fazer isso com qualidade",
concluiu.
A deputada Rosângela Reis (PV) lembrou a
responsabilidade do poder público em relação a situação especial
desses trabalhadores que são jovens, mulheres e estreantes no
mercado de trabalho.
Na fase de debates, vários operadores que
participavam da reunião foram ao microfone apresentar denúncias e
dados sobre a precarização do trabalho da categoria e também
reforçar a pauta de reivindicação dos trabalhadores.
Requerimentos - Foram
apresentados vários requerimentos ao final da reunião, de autoria do
deputado Celinho do Sinttrocel e também da deputada Rosângela Reis,
que serão colocados em votação na próxima reunião da comissão. Eles
tratam de pedidos de informações e providências de órgãos públicos
em relação ao setor de telemarketing.
Foram aprovados outros três requerimentos do
deputado Celinho do Sinttrocel. Ele solicita a realização de debate
público em conjunto com as Comissões de Transporte, Comunicação e
Obras Públicas e de Direitos Humanos para debater o Projeto de Lei
do Senado Federal 271/2008, que institui o Estatuto dos Motoristas,
e a situação do transporte terrestre em âmbito federal e no Estado
de Minas Gerais.
O deputado também pede ao INSS, informações sobre o
número de afastados por doença e especificação dessas doenças dos
trabalhadores de empresas de teleatendimento, nos últimos dois anos
a contar de junho deste ano.
Por fim, o deputado solicita ao INSS informações
sobre o número de afastados por doença e especificação dessas
doenças dos trabalhadores de telemarketing e telefonista, nesse
mesmo período.
Também foi aprovado requerimento do deputado Luiz
Carlos Miranda (PDT) para realização de debate público para discutir
o Movimento Pró-Estatuto do Motorista.
Na reunião ainda foram aprovadas outras proposições
que dispensam a apreciação do Plenário da Assembleia.
Presenças - Deputada
Rosângela Reis (PV), presidente; Celinho do Sinttrocel (PCdoB) e
Tadeu Martins Leite (PMDB). Além dos convidados citados na matéria,
também participou da audiência o diretor de Coordenação Geral do
Sinttel-MG, Fernando Antônio Pereira Cançado.
|