Mariana resiste ao projeto de reativação da Mina Del
Rey
"O povo de Mariana não quer e não vai aceitar a
reativação da Mina Del Rey. Se preciso for, vamos fechar estradas,
fazer barricadas e fazer manifestação". A declaração do prefeito de
Mariana (região Central), Geraldo Sales de Souza, resumiu o
sentimento dominante na audiência pública da Comissão de Minas e
Energia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, realizada nesta
quarta-feira (22/6/11), naquele município.
Segundo os participantes da reunião, que lotaram o
auditório do Centro de Convenções da cidade, localizado na Praça JK,
a possibilidade de reativação da mina de minério de ferro pela Vale
representa uma ameaça à comunidade, com riscos à saúde, ao meio
ambiente, ao meio social e à cultura da histórica cidade mineira, de
315 anos. Para resistir ao projeto de mineração, moradores,
políticos e líderes comunitários se organizaram no movimento Mariana
Viva.
O requerimento para a realização da audiência
pública partiu do deputado Rogério Correia (PT), atendendo a
solicitação da 1a. secretária da Câmara Municipal da
cidade, a vereadora Aída Ribeiro Anacleto, uma das líderes do
movimento Mariana Viva.
Licenças ambientais ainda não foram
solicitadas
Localizada a menos de cinco quilômetros do centro
histórico e a cerca de um quilômetro do sítio arqueológico do Gogô,
formado por antigas ruínas do tempo dos escravos, a Mina Del Rey
desativada há mais de 20 anos, poderá voltar a operar a partir de
2014, conforme admite a Vale, responsável pela exploração. Por
enquanto, porém, a empresa ainda não requereu os documentos para
licença ambiental, embora uma empresa terceirizada já esteja
instalada no local, com máquinas e operários em atuação.
A Vale não foi convidada a participar da audiência
pública, mas na ocasião foi lida uma nota de esclarecimento da
empresa, datada de 30 de março de 2011, assinada por seu coordenador
estadual de Relações Institucionais, Rubens Vargas Filho, declarando
que a mina foi arrendada, devendo entrar em operação em 2014, com
geração de 300 empregos. Muitos moradores da localidade, porém,
acreditam que, em caso de reativação, os impactos negativos serão
muito maiores e não compensariam os novos empregos.
É o que pensa, por exemplo, o promotor de Justiça
Antônio Carlos de Oliveira, que em 25 de abril instaurou inquérito
civil público indagando sobre os possíveis danos ambientais, ao
patrimônio histórico-cultural da cidade e à saúde da população e
"para saber se os órgãos ambientais estão agindo com lisura".
Segundo o promotor, a Vale, até agora, não respondeu nenhuma
pergunta, alegando que caberá à empresa terceirizada responder pelas
licenças ambientais.
A vereadora Aída Anacleto manifestou a sua
preocupação com a contaminação dos mananciais e nascentes, com as
comunidades próximas à mina, com o sítio arqueológico do Gogô e com
o cinturão verde em torno da área, caso a mina venha a ser
reativada, lembrando que a região fica próxima a importantes
reservas florestais como o Parque Estadual do Itacolomi, o Caraça e
a Estação Ecológica de Tripuí. "Sou a favor do desenvolvimento, mas
do desenvolvimento sustentável. Não vamos permitir que Mariana se
transforme em uma nova Congonhas, em uma nova Itabira, uma nova
Brumadinho", disse.
Equiparação - O
coordenador do movimento "O Minério é Nosso", Luiz Pegazo, informou
que já existe um projeto de lei de iniciativa popular solicitando a
equiparação dos royalties do minério aos royalties do petróleo, para
corrigir "uma injustiça histórica", já que a Petrobrás paga 10% de
seu faturamento em royalties, a título de compensação pelos danos
ambientais, enquanto as mineradoras pagam menos de 2% do lucro
líquido pelos danos causados ao meio ambiente. "Exigimos uma
compensação adequada, na defesa dos direitos de Minas Gerais",
disse.
Deputados apoiam movimento de resistência
O autor do requerimento para a realização da
audiência pública, deputado Rogério Correia, e seu colega da bancada
federal, deputado Padre João (PT), manifestaram total solidariedade
ao movimento de resistência dos moradores, líderes comunitários e
políticos locais. Segundo Rogério, antes de tomar qualquer decisão a
Vale deveria promover um amplo debate com a sociedade, com consulta
à Prefeitura, Câmara de Vereadores e população. "O aspecto econômico
não é o único nem o principal", disse, afirmando que é preciso
examinar a questão tendo em vista os possíveis impactos ambiental,
social, cultural e turístico para a região. "De que adianta gerar
300 empregos e prejudicar outros?", indagou.
O deputado Padre João criticou "a nota fria da Vale
e o desrespeito com a população de Mariana" e observou que o
primeiro passo para o processo de liberação ambiental é a carta de
anuência, considerando que se a prefeitura negar a conceder o
documento o processo não avança.
No encerramento, o presidente da comissão, deputado
Sávio Souza Cruz, afirmou que a licença ambiental deve ser uma
decisão política, a partir dos pareceres técnico e jurídico. Segundo
ele, é necessário resgatar a síntese do licenciamento ambiental.
"Minas Gerais, disse, está sofrendo de absoluta perda de
credibilidade no processo de licença ambiental, que passa a ser
visto como mera etapa burocrática dos empreendimentos. Isto é
gravíssimo. Precisamos resgatar o processo ambiental como decisão
política, assegurando a vontade coletiva e de concretização do bem
comum".
Presenças - Deputados
Sávio Souza Cruz (PMDB), presidente; e Rogério Correia (PT).
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