Moradores relatam dificuldades pela falta de água no
Jequitinhonha
Relatos de moradores de comunidades rurais do Médio
Jequitinhonha, onde a água é considerada artigo de luxo,
impressionaram os deputados André Quintão (PT) e Luiz Henrique
(PSDB), da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, que visitaram a
região nesta terça-feira (31/5/11). "Não temos o direito de possuir
nada", resumiu Sebastiana Pereira Dias, de 74 anos, que recebe água
em casa através de uma mangueira. A horta que ela plantou está
condenada e, da criação, só restou um "burro sofrido". O sonho de
muitos moradores parece trivial: ter água na torneira.
Sebastiana mora no povoado de Barbosa do Meio, em
Virgem da Lapa. O Córrego do Barbosa, que já foi orgulho do local,
tem hoje apenas pequenas poças. Das 40 famílias, raras são as que
têm água por perto, como em nascedouros. Boa parte recebe água de
caminhão-pipa fornecido pela prefeitura, e muitos consomem água do
rio, comprovadamente contaminada. Crianças buscam água no córrego
ainda de madrugada, para tomar banho antes de ir à escola.
A motivação para a visita foi o critério adotado
pela Copanor, subsidiária da Copasa criada para cuidar do saneamento
na região: atender apenas localidades com 200 a 5 mil habitantes. Na
reunião realizada na capela do povoado, o prefeito de Virgem da
Lapa, Averaldo Martins, considerou histórico o encontro com o
presidente da Comissão de Participação Popular, deputado André
Quintão, e o deputado Luiz Henrique. "Vocês fizeram o mesmo caminho
que as crianças fazem para ir à escola", observou, citando os 16
quilômetros de terra e muita poeira que ligam Barbosa do Meio à sede
do município.
André Quintão salientou que a falta de água é um
problema que deverá receber mais atenção dos governos. Ele afirmou
que, nesta quinta-feira (2), a presidente Dilma Rousseff lançará o
programa "Brasil sem miséria" e que a água será uma das prioridades.
"Na próxima semana vamos debater na Assembléia, com o Governo de
Minas, como será esse plano no Estado", antecipou. Luiz Henrique
acrescentou que a própria Copanor poderia firmar parcerias com a
União, dentro do projeto de combate à miséria.
Comunidade quilombola teme perder sua
identidade
Na localidade de Almas, também em Virgem da Lapa, o
desafio é manter a identidade cultural e a história da comunidade
remanescente de quilombo. Com a falta de água e trabalho, os jovens
deixam o povoado e acabam por não aprender os costumes locais. Pouco
antes da chegada dos deputados, os dois filhos da líder comunitária
Maria Rita Batista de Oliveira tinham migrado para a colheita de
café no Sul de Minas. "Meu marido também vai", informou. Antônio
Figueiredo, de 62 anos, deu a entender que a migração é forçada.
"Nenhum de nós quer entulhar mais a cidade", disse.
As mulheres de Almas complementam a renda
confeccionando vassouras com palha de coqueirinho, um artesanato
ensinado pelos moradores mais antigos, como dona Júlia, a matriarca,
de 83 anos. Mas o desmatamento, que comprometeu o volume de água do
córrego que abastecia a comunidade, acabou também com as palmeiras.
"Com a água seria diferente", garantiu Rita.
Na reunião, feita na rua, em bancos de madeira, o
deputado André Quintão garantiu que não termina o mandato sem que a
Copanor altere os critérios de atendimento na região. "Não se pode
excluir ninguém de uma política pública que deve ser universal",
afirmou. Luiz Henrique prometeu enviar ao governador Antonio
Anastasia um relato da situação nas comunidades visitadas.
Moradores têm que optar entre limpar a casa ou
cozinhar
Outro povoado visitado pela comissão foi o de
Ribeirão da Onça, a 12 quilômetros da sede de Francisco Badaró. Na
reunião estavam moradores da localidade de Olhos d'Água. Nas duas
comunidades vivem cerca de 35 famílias e a base do abastecimento é o
caminhão-pipa. As casas mais distantes do reservatório ficam sem
água. A agente de saúde Maria do Rosário Ferreira, a Zaira,
coleciona queixas, como a de uma mãe que não tinha água para fazer o
café das crianças antes de elas irem à escola. "Tem gente que passa
até sede ou tem apenas um balde de água para limpar a casa uma vez
por semana", garante.
Segundo Zaira, a professora do município junta a
roupa suja de 15 dias e, no sábado, enfrenta duas horas de viagem a
cavalo para lavar tudo no povoado Rio Pedra de Sal. Muitas casas em
Ribeirão da Onça estão fechadas porque os moradores desistiram de
lutar na seca. Maria Rodrigues Viana, 76 anos, viu ir embora o
marido, Antônio, de 73. Dos sete filhos, seis também deixaram o
local. "Ele planta feijão em São Paulo. Mas lá é um fundo, não dá
para olhar ao redor. Também é frio, a terra não é nossa e não tem
fogão de lenha", enumerou dona Maria, justificando porque ficou no
Jequitinhonha, numa casa de chão batido, num topo de morro.
O prefeito de Francisco Badaró, José João, relatou
que o município será um dos mais beneficiados pela Copanor nessa
primeira fase de atuação da companhia. Entretanto, enfatizou que
faltam recursos para ampliar o atendimento. "Quem planeja não
conhece a realidade aqui do interior", afirmou.
No dia 30/5, a comissão visitou a comunidade Lagoa
do Boi Morto, em Araçuaí, onde cerca de 30 famílias vivem o mesmo
problema.
Deputados vão cobrar ações para a falta de
água
O deputado Luiz Henrique salientou, em cada uma das
comunidades, que a luta pelo abastecimento de água na região será
suprapartidária. Entre as alternativas que ele e André Quintão se
comprometeram a buscar, foi citada a possibilidade de inclusão do
Jequitinhonha nas ações da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do
São Francisco e do Parnaíba (Codevasf). Além disso, os parlamentares
vão elaborar um relatório das visitas, a ser apresentado aos
governos.
Para chegar aos quatro povoados do Médio
Jequitinhonha, a comissão percorreu 210 quilômetros, a maioria em
estrada de chão. O engenheiro de obras da Copanor, José Mário de
Castro, e o engenheiro fiscal da companhia em Araçuaí, Eduardo
Almeida, além de vereadores da região, acompanharam as
visitas.
Presenças - Deputados
André Quintão (PT), presidente da comissão; e Luiz Henrique (PSDB).
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