Movimentos querem que ALMG interfira em violações da mineração
A criação de uma comissão composta de movimentos
sociais e representantes da Assembleia para discutir a violação de
direitos na mineração foi proposta no Debate Público "Mineração e
Direitos Humanos", promovido nesta sexta-feira (29/4/11), pela
Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas
Gerais. O debate discutiu as violações desses direitos pelas
diversas mineradoras instaladas no Estado, sobretudo os direitos dos
trabalhadores e do uso da água. A reunião foi solicitada pelo
deputado Durval Ângelo (PT), presidente da comissão.
Durval Ângelo explicou que a comissão recebeu a
demanda do movimento dos atingidos pela Vale, diante de uma série de
denúncias de violações. O parlamentar destacou que o tema está
dentro das competências da comissão, porque segundo definição da
Organização das Nações Unidas (ONU) para direitos humanos, os
conflitos trabalhistas, o direito à água, à vida, ao meio ambiente
são considerados direitos fundamentais do homem. Ele criticou a
iniciativa de outros deputados de questionar a Mesa da Assembleia,
sobre as iniciativas da Comissão de Direitos Humanos, sob a alegação
de que ela estaria invadindo competências de outras comissões.
Durval Ângelo citou dezenas de audiências
realizadas pela sua comissão para apurar denúncias de violações no
exercício da mineração, destacando entre elas, os debates sobre a
mina de Capão Xavier, a mineração de ouro em Paracatu e Conceição de
Ipanema. E mais recentemente o debate sobre a mineração na Serra da
Piedade, ao lado do santuário, que depois de licenciada pelos órgãos
ambientais, foi suspensa por liminar do Tribunal de Justiça. O
parlamentar criticou especialmente a empresa Vale, que segundo ele,
mudou de nome "depois de degradar os rios e tornar a vida das
populações mais amarga".
Atingidos por barragens garantem que mineração
viola os mesmos direitos
Autor da proposta de formação da comissão conjunta
entre movimentos sociais e parlamentares, o presidente do Movimento
dos Atingidos por Barragens (MAB), Moisés Borges, disse que a
entidade conseguiu aprovar na Subsecretaria Nacional de Direitos
Humanos, um relatório onde são listadas 16 violações de direitos dos
atingidos por barragens. Para ele, o relatório pode ser usado pelos
atingidos pela mineração, porque as violações são as mesmas.
E citou entre elas, a dívida social deixada para os
municípios, a renda quase inexpressiva gerada pela mineração, o
modelo energético que beneficia as grandes empresas, quase sempre
transnacionais, com prejuízo para a população mais pobre, a expansão
da monocultura do eucalipto, para manter as mineradoras e o
desrespeito aos pequenos proprietários rurais.
A presidente do Movimento em defesa da Serra do
Gandarela, área localizada entre Rio Acima, Santa Bárbara, Caeté e
Ouro Preto, Maria Teresa Viana de Freitas Corujo, centrou sua
apresentação no uso da água pelas mineradoras. Lembrando que a ONU
classifica a água como direito fundamental do homem, ela também
garantiu que a violação está "justamente no uso que as mineradoras
fazem desse bem, que é de todos".
Teresa Corujo falou ainda sobre problemas com a
destruição da canga, tipo de rocha onde se ergue uma vegetação
típica de solos ricos em minério de ferro, que não interessa às
empresas, mas que é importante para a manutenção harmônica dos
lençóis freáticos; e sobre o movimento de criação do Parque Nacional
Águas da Serra da Gandarela.
Ela alertou ainda para o perigo da mineração de
ouro que usa o cianeto e que está sendo feita em locais muito
próximos de sistema de captação de água que abastece a Região
Metropolitana de Belo Horizonte. Teresa lembrou que somente um grama
da substância é suficiente para matar um ser humano adulto e que o
risco de algum acidente com seu uso junto aos mananciais é
grande.
Durval e Maria Teresa Corujo enfatizaram o pouco
significado econômico da mineração para o Estado e o País. O
deputado lembrou que os alimentos pagam quatro vezes mais imposto do
que o minério. E Corujo destacou que a mineração representa somente
4% do Produto Interno Bruto. E informou que o equivalente a um litro
de minério custa somente R$ 0,44, enquanto o litro de água custa R$
3, completando: "minério não se bebe. É um bem que está ali no solo
e que deve ser usado para o bem comum".
Governo Federal cobra dívida da Vale com
royalties
O deputado Rogério Correia (PT), líder do Bloco
Minas Sem Censura, destacou que o Governo Federal cobra na justiça
uma dívida de R$ 4 bilhões que a empresa Vale teria com o pagamento
de royalties da mineração. Correia estranhou o fato de nenhum membro
do Governo de Minas reforçar a cobrança junto à Vale, já que os
recursos interessam a Minas. Para ele, o silêncio se deve ao fato de
que a Vale foi uma das grandes doadoras para a campanha de
Anastasia, contribuindo com R$ 7,25 milhões. O deputado avalia que
esses fatos mostram que todos que estão nesta luta contra as
mineradoras enfrentam interesses poderosos.
Correia também denunciou a pretensão de
mineradoras, apoiadas pelo Governo do Estado, de fazer um mineroduto
ligando todas as serras de Minas até o porto. "Várias áreas já foram
consideradas de utilidade pública para essa finalidade", reforçou.
Por fim, Correia defendeu a criação de um fundo social do minério,
formado por recursos captados das mineradoras que seriam aplicados
na educação e no meio ambiente.
O deputado federal (e ex-estadual) Padre João
(PT-MG) citou vários fatos que comprovam que, na questão minerária a
regra é a prevalência dos interesses dos poderosos em prejuízo das
comunidades envolvidas e do meio ambiente. Assim ocorreu com o
vazamento da barragem na região de Muriaé, em que a empresa
responsável foi multada em R$ 1 milhão, não pagou e já voltou a
funcionar, sendo que os atingidos pelo problema não foram
indenizados. Outro exemplo é o privilégio que tem o setor mineral na
legislação, sendo toda a atividade considerada de utilidade pública.
"Lutamos para que assentamentos de reforma se tornem, pelo menos,
áreas de interesse social, mas nem isso conseguimos, porque a
influência é grande a favor dos mais ricos", lamentou.
Semad defende licenciamento ambiental
mineiro
O assessor especial da Secretaria de Estado de Meio
Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), Ilmar Bastos Santos,
apesar de reconhecer falhas no modelo mineiro de licenciamento
ambiental, destacou que o mesmo é referência no País.
Segundo ele, só em Minas Gerais, os pareceres
jurídico e técnico de cada empreendimento passam pela análise de um
órgão colegiado, no caso, o Conselho Estadual de Política Ambiental
(Copam), com representantes de entidades ambientais, setor público e
empresas. Em outros estados e no Governo Federal, de acordo com
Ilmar, o próprio órgão faz o parecer, sem consulta a outros
segmentos.
Ilmar Bastos refletiu ainda que o licenciamento
ambiental é a forma atualmente colocada de tentar equilibrar os
vários interesses em disputa: sociais, ambientais e econômicos.
"Hoje, tratar de licenciamento é fazer gestão de conflitos: o que
vai impactar na comunidade e no meio ambiente; como mitigar esse
dano ou compensá-lo", avaliou Ilmar, para quem a questão do meio
ambiente deve perpassar todas as políticas públicas do governo. Essa
visão, afirma o assessor, tem norteado a tentativa de implementar
novo modelo no Governo Estadual de chamar a área ambiental no
início, quando se propõe alguma política econômica, e não depois,
quando surgem os problemas.
O representante da Semad se posicionou em relação a
algumas críticas feitas por convidados que o antecederam. Sobre o
mineroduto citado por Rogério Correia, Ilmar disse que o
licenciamento ambiental nesse caso, que envolve dois estados, é
feito pelo Governo Federal.
Quanto ao problema com barragens de rejeitos, tema
de Padre João, o assessor afirmou que em Minas, foi criado o Sistema
de Gestão de Barragens. Nesse modelo, o empreendedor tem que
contratar empresa de auditoria para apurar situação de suas
barragens e possíveis falhas no funcionamento, para evitar acidentes
como o de Muriaé.
Em relação à denúncia feita por Teresa Corujo de
uso de cianeto na mineração de ouro, Ilmar pediu que a Comissão de
Direitos Humanos aprove requerimento sobre o assunto e lhe encaminhe
para que seja investigado.
Sindicato do Canadá participa dos debates
Na fase de debates, os participantes foram ao
microfone para denunciar abusos por parte de mineradoras.
Representando o sindicato dos mineiros do Canadá, Rick Bertrand,
disse que os trabalhadores desse pais já enfrentam problemas com a
Vale. Nos primeiros anos de atuação lá, segundo ele, a empresa
faturou US$ 4 bilhões. Mesmo assim, quando se sentou para negociar
com os trabalhadores, quis retirar benefícios trabalhistas duramente
conquistados, inclusive propondo redução de salários, conforme o
mineiro.
Jorge Pires falou em nome dos vitimados pela
silicose (doença crônica e incurável causada por inalação de poeiras
contendo partículas de sílica), a maioria nos municípios onde opera
a Anglo Gold, Nova Lima, Raposos, Rio Acima e Sabará. "A empresa só
oferece para nós remédio, balão de oxigênio e depois, o caixão",
indignou-se. Altair Gomes (de Lagoa Santa) e Anjinho (de Brumadinho)
reclamaram dos danos ambientais promovidos, respectivamente, pela
Lys e pela Ferrous em seus municípios.
Ainda nos debates, Durval Ângelo sugeriu aos
manifestantes que se organizem para participar da reunião que a
comissão vai realizar nesta quarta-feira (4/5) para tratar da
questão dos desaparecidos da guerrilha do Araguaia. Embora o tema da
reunião seja outro, ele se dispôs a abrir espaço para que os
movimentos dos atingidos pelas barragens, pela Vale e por outras
mineradoras levem suas denúncias aos juízes da Corte Interamericana
de Direitos Humanos e da Corte de Haia, que estarão presentes à
reunião.
O parlamentar propôs também que os militantes
solicitem a ajuda do defensor de Direitos Humanos do Estado, Gustavo
Corgozinho, que também estará na reunião.
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