Produtores de queijo artesanal reclamam de fiscalização
sanitária
A fiscalização punitiva, a falta de recursos
financeiros e de treinamento para a produção de queijo artesanal em
Minas Gerais foram os principais pontos criticados pelo segmento em
audiência pública realizada em conjunto pelas Comissões de Saúde e
de Política Agropecuária e Agroindustrial da Assembleia Legislativa
de Minas Gerais, nesta quarta-feira (20/4/11). O encontro durou mais
de quatro horas e foi acompanhado por cerca de 100 lideranças da
produção de queijo artesanal no Estado.
A audiência foi solicitada pelo deputado Adelmo
Carneiro Leão (PT) e pelo presidente da Comissão de Saúde, deputado
Carlos Mosconi (PSDB), a partir da fiscalização realizada pelo
Ministério Público em Uberaba (Triângulo Mineiro). De acordo com o
promotor Carlos Alberto Valera, que esteve na reunião, a
fiscalização do queijo artesanal foi suspensa no município porque o
índice de estabelecimentos em conformidade com a Lei 14.185, de
2002, que dispõe sobre o processo de produção de queijo minas
artesanal, é baixo: dentre 68 empreendimentos fiscalizados pelo MP,
56 descumpriam a norma.
O presidente da Associação de Produtores de Queijo
Tipo Artesanal do Município de Caldas (Aprocaldas), Vanderlei Tomé,
destacou as dificuldades enfrentadas para que o segmento se adeque
às Leis 14.185 e 19.492, de 2011, que altera dispositivos da norma
anterior. Conforme Vanderlei, faltam profissionais para orientar os
produtores em relação à qualidade de fabricação dos queijos e
recursos para pagar pelas análises físico-químicas da água usada na
produção. "A análise deve custar cerca de R$ 500 no laboratório",
afirmou, ao destacar os altos custos. Ele sugeriu que o Governo do
Estado colabore com a análise, já que a Fundação Ezequiel Dias
poderia fazer os testes.
Exigências - O gerente de
Educação Sanitária e Apoio à Agroindústria de Pequeno Porte do
Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), Pedro Hartung, explicou que
os produtores devem ser certificados junto ao órgão e os produtos
devem ter rótulo com a identificação do fabricante, a data de
fabricação e o prazo de validade do queijo, dentre outras exigências
legais. Além disso, ele destacou que os produtores devem observar a
Lei 19.476, de 2011, que dispõe sobre a habilitação sanitária em
estabelecimentos agroindustriais de pequeno porte. Hartung mencionou
que foi formado um grupo de trabalho, com integrantes das
secretarias estaduais de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável, Saúde, Casa Civil e Agricultura, Pecuária e
Abastecimento, para regulamentar a norma, o que deve ser concluído
em 90 dias.
O subsecretário de Estado de Agricultura Familiar,
Edmar Gadelha, disse que o custo para cada pequena propriedade se
adequar às exigências fitossanitárias seria de R$ 20 mil, e que a
Secretaria de Agricultura procura parcerias com associações e
cooperativas para viabilizar as adaptações.
Representantes do poder público defendem
fiscalização
O vereador em Sacramento (Alto Paranaíba),
Marcelino Marra, defendeu mais flexibilidade em relação à norma que
dispõe sobre a produção de queijo minas. Ele justificou que a renda
obtida com a venda contribui para a sobrevivência de produtores que
vivem da agricultura familiar, mas as exigências da lei prejudicam
as vendas. "Não há outra alternativa de renda, a não ser o queijo
minas, em algumas regiões", salientou. Ele considerou R$ 20 mil para
a adequação dos estabelecimentos de pequeno porte uma "fortuna" e
sugeriu que o Governo do Estado arque com parte do valor para os 30
mil estabelecimentos. "Se o Estado investisse R$ 10 mil por
produtor, seriam R$ 300 milhões. Isso é pouco para o governo",
comentou.
A representante da Vigilância Sanitária em Minas,
Cláudia Parma Machado, reforçou que as normas para o segmento têm o
objetivo de garantir a saúde pública e o direito do consumidor. Ela
afirmou que a instituição tem vários estudos científicos que
demonstram que o queijo minas artesanal apresenta altos riscos de
contaminação por ser feito com leite cru. Ela sugeriu que sejam
elaboradas medidas de curto e médio prazo, como a realização de
seminários com o segmento e sociedade civil para discutir o assunto;
a elaboração de uma "lista positiva" para o Ministério Público e a
Vigilância Sanitária, com nomes de produtores que estão se adequando
às normas; e ações por parte dos municípios.
O diretor do Departamento de Inspeção de Produtos
de Origem Animal do Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento, Luiz Carlos de Oliveira, também reforçou a
importância da educação sanitária, que classificou como "uma questão
cultural". Luiz Carlos pontuou que, além das propriedades, os
municípios precisam se comprometer mais com a fiscalização.
Em relação ao acesso ao crédito, o gerente da
Divisão de Agropecuária do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais
(BDMG), Leonardo Guimarães Parma, apresentou linhas de financiamento
ao pequeno produtor, como o Pronaf Agroindústria, que se destina a
implantar, ampliar e recuperar pequenos e médios estabelecimentos
agroindustriais.
Deputados sugerem novas discussões para resolver as
divergências
O presidente da Comissão de Saúde, deputado Carlos
Mosconi, se manifestou "preocupado com o resultado da reunião", pois
há ainda alguns impasses que precisam de solução. O parlamentar
sugeriu que as Comissões de Saúde e de Política Agropecuária e
Agroindustrial façam novas reuniões para encontrar respostas para as
questões levantadas.
"O ato fiscalizador não pode ser maior que o
espírito da lei, que é valorizar o queijo minas artesanal como
patrimônio de Minas", afirmou o deputado Adelmo Carneiro Leão. O
parlamentar mencionou que elementos que oferecem riscos à saúde,
como bactérias e excesso de sal, também estão em outros produtos, e
que a burocracia dificulta o acesso ao crédito.
O presidente da Comissão de Política Agropecuária e
Agroindustrial, deputado Antônio Carlos Arantes (PSC), e o deputado
Bosco (PTdoB) propuseram que as questões apresentadas pelos pequenos
produtores sejam repensadas para que haja uma solução para as
dificuldades. O deputado Dalmo Ribeiro Silva (PSDB) lembrou que o
assunto foi discutido em audiência pública realizada pela Comissão
de Política Agropecuária e Agroindustrial em 2008, quando o queijo
do Sul de Minas foi tematizado.
Providências - A comissão
aprovou sete requerimentos para que sejam encaminhados ofícios com
pedidos de providência para:
* o procurador-geral de Justiça, para solicitar que
ele recomende aos promotores do Estado a adoção de procedimentos
para evitar a fiscalização punitiva sobre o queijo minas artesanal,
como feito pelo representante do Ministério Público de Uberaba.
Autores: Dalmo Ribeiro Silva, Carlos Mosconi, Adelmo Carneiro Leão e
Bosco.
* o secretário de Estado de Agricultura, Pecuária e
Abastecimento, para que seja incluída a participação de um
representante das Comissões de Saúde e de Política Agropecuária e
Agroindustrial da ALMG no grupo de trabalho que vai discutir a
regulamentação da Lei 19.476, de 2011. Autores: Dalmo Ribeiro Silva,
Carlos Mosconi, Adelmo Carneiro Leão e Bosco.
* o presidente da Empresa de Pesquisa Agropecuária
de Minas Gerais (Epamig), para que o Instituto Cândido Tostes inclua
treinamentos para a fabricação do queijo minas artesanal. Autores:
Carlos Mosconi, Adelmo Carneiro Leão, Bosco, Fabiano Tolentino e
Antônio Carlos Arantes.
* o presidente da Empresa de Assistência Técnica e
Extensão Rural de Minas (Emater) e o presidente do Senar, para que
realizem treinamentos gratuitos, em todo o Estado, para a fabricação
do queijo. Autores: Carlos Mosconi e Adelmo Carneiro Leão.
* o governador do Estado e o secretário de Estado
de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, sugerindo estudar a
possibilidade de criação de um fundo com o objetivo de facilitar o
acesso ao crédito para a modernização da agroindústria de pequeno
porte; e aos órgãos de vigilância sanitária (Anvisa, IMA, Secretaria
de Estado da Saúde e Procon Estadual), solicitando que as atividades
de fiscalização, no que diz respeito aos pequenos produtores rurais,
sejam pautadas pela educação sanitária, valorização dos
trabalhadores e da produção, bem como adoção de medidas
sócio-educativas em substituição à aplicação de penalidades
punitivas, em especial no que se refere ao queijo minas artesanal.
Autor: Antônio Carlos Arantes.
* o secretário de Estado de Agricultura, Pecuária e
Abastecimento, o presidente da Emater e o diretor-geral do IMA, com
as seguintes reivindicações: 1º) revisão da Lei 19.492,
principalmente quanto aos padrões microbiológicos, maturação e/ou
umidade, transporte, embalagem e rotulagem e comercialização; 2º)
obrigatoriedade de recebimento de "selo", pelo Centro de
Distribuição, que garanta a origem e qualidade. Na falta do centro,
todo rótulo deveria ter a numeração a ser fornecida pelo Escritório
Seccional do IMA; 3º) linha específica de crédito para adequações,
exames, construção, compra de animais, insumos, etc., para cadastro
de produtores; 4º) desoneração de produtores e comerciantes de
impostos; inclusão do produto na cesta básica ou merenda escolar;
5º) implantação de mecanismos de comércio justo entre produtores e
comerciantes, garantindo um preço compatível para o consumidor
final; 6º) envolvimento do Estado e dos municípios em políticas
públicas que incentivem o cadastramento de mais produtores; e 7º)
divulgação e esclarecimento de toda cadeia produtiva do queijo,
principalmente consumidores, sobre o Programa Queijo Minas
Artesanal, e segurança alimentar. Autor: Bosco.
Presenças - Deputados
Carlos Mosconi (PSDB), presidente da Comissão de Saúde, que presidiu
a audiência; Antônio Carlos Arantes (PSC), presidente da Comissão de
Política Agropecuária e Agroindustrial; Fabiano Tolentino (PRTB),
vice da Comissão de Política Agropecuária; Adelmo Carneiro Leão
(PT), Doutor Wilson Batista (PSL), Neider Moreira (PPS), Sávio Souza
Cruz (PMDB), Dalmo Ribeiro Silva (PSDB) e Bosco (PTdoB). Além dos
convidados citados na matéria, participaram o diretor-geral do IMA,
Altino Rodrigues Neto; o pesquisador da Epamig, Fernando Antônio
Resplande Magalhães; o vice-presidente do Instituto de
Desenvolvimento Integrado de Minas Gerais (Indi/MG), João Carlos
Vitor Garcia; e o presidente da Federação dos Trabalhadores na
Agricultura do Estado de Minas Gerais (Fetaemg), Vilson Luiz da
Silva.
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