Especialistas defendem punição para atraso na entrega de
imóveis
A proibição de venda de novos imóveis na planta ou
de concessão de alvará para a construção de novas edificações
enquanto os imóveis já vendidos não forem entregues pelas
construtoras foram algumas das medidas para proteger o consumidor
defendidas por especialistas em reunião da Comissão de Defesa do
Consumidor e do Contribuinte da Assembleia Legislativa de Minas
Gerais, nesta terça-feira (19/4/11). Requerida pelo deputado Duarte
Bechir (PMN), a audiência teve como objetivo debater a situação de
consumidores que compram imóveis na planta e não recebem as chaves
na data prevista no contrato.
O coordenador do Procon Assembleia, Marcelo
Barbosa, afirmou que o atraso na entrega dos imóveis comprados na
planta se tornou um problema nacional. Segundo ele, apenas em 2011,
o Procon Assembleia já registrou 70 reclamações contra as
construtoras Tenda e MRV. Ele afirmou que o Procon Assembleia
apresentou uma representação junto ao Ministério Público e espera
que sejam tomadas medidas para resolver a situação. "É necessário
fazer, por exemplo, um ajustamento de conduta. Temos que pesar a mão
no bolso das construtoras para tentar resolver o problema",
afirmou.
Marcelo Barbosa defendeu como medida extrema que as
construtoras sejam proibidas de vender novos imóveis enquanto não
realizarem a entrega dos já vendidos. "Infelizmente a situação
passou do limite e é preciso que o Ministério Público adote uma ação
enérgica para defender os consumidores", afirmou.
O presidente da Comissão de Direito Imobiliário
(OAB/MG), Kênio de Souza Pereira, também considerou que a situação
atual é muito grave, sendo importante uma atuação e interferência do
Ministério Público e do Poder Público na defesa do consumidor.
Para ele, a devolução do dinheiro com correção não
é uma solução que atende aos consumidores. "O valor dos imóveis está
subindo muito anualmente. Dessa forma, a simples devolução do valor
pago no início do contrato, mesmo que corrigido, não resolve o
problema do consumidor pois, com essa quantia, ele não consegue mais
comprar um imóvel no mesmo padrão", considerou.
Legislação - Kênio de
Souza Pereira defendeu a elaboração de legislação específica para
regulamentar a situação e proteger o consumidor. Ele defendeu a
aprovação de projeto de lei que tramita na Câmara Municipal de Belo
Horizonte estabelecendo que somente poderão ser concedidos alvarás
para a realização de novas edificações se a construtora não possuir
atrasos na entrega de imóveis superior a 60 dias. "As empresas não
podem continuar lançando novos empreendimentos se não estão
entregando os imóveis já previstos dentro do prazo", afirmou.
Ele destacou ainda que o problema não atinge só as
construtoras MRV ou Tenda, mas também construtoras de imóveis de
luxo, como a Patrimar. "Existem grandes construtoras atrasando as
entregas sistematicamente", disse. Kênio de Souza Pereira afirmou
que atualmente cerca de 85% dos imóveis são comprados na planta. "É
preciso que o Poder Público crie uma situação de segurança para o
consumidor", disse. Ele lembrou que os contratos são elaborados
pelas construtoras e que, segundo ele, muitas vezes são feitos para
enganar o consumidor.
Ministério Público já está intimando as
construtoras
O promotor de Justiça de Defesa do Consumidor da
Área Imobiliária, Eduardo Henrique Soares Machado, explicou que o
Ministério Público já está intimando as construtoras que tiveram
problemas de atraso na entrega relatados no Procon Estadual. Ele
explicou que o procedimento teve início há um mês e que o Ministério
Público está aguardando a resposta das construtoras.
"Essa é a primeira etapa do processo. Se a situação
não for resolvida, os próximos passos do Ministério Público serão a
elaboração de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), depois o
estabelecimento de multas e, no último caso, a adoção de medidas com
o objetivo de suspender a venda de novos imóveis na planta enquanto
os antigos não forem entregues", afirmou.
Eduardo Henrique Soares Machado disse ainda que, se
um TAC for elaborado, ele pretende incluir como um dos itens a
obrigatoriedade de que as construtoras informem aos consumidores os
outros compradores de imóveis no mesmo empreendimento. A sugestão de
inclusão dessa obrigatoriedade foi dada por Kênio de Souza Pereira
que afirmou que as construtoras, muitas vezes, dificultam e impedem
que os compradores de um mesmo empreendimento tenham os nomes uns
aos outros, com o objetivo de impedir a sua mobilização.
Cláusulas abusivas - O
vice-presidente da Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação,
Lúcio Delfino, falou sobre as cláusulas abusivas que muitas vezes
são colocadas nos contratos elaborados pelas construtoras. Entre
elas, ele destacou a previsão de atraso na entrega do imóvel, sem
que haja previsão de pagamento de indenização para os consumidores.
"Os contratos devem ser equilibrados, se está previsto o pagamento
de multa pelo consumidor no caso de atraso de pagamento de parcelas,
também deve ser previsto o pagamento de multa pela construtora no
caso de atraso na entrega dos imóvel", afirmou.
Lúcio Delfino explicou que muitas vezes as
construtoras estabelecem nos contratos um prazo de prorrogação da
data de entrega, em geral de 180 dias, e que somente após esse
período estaria previsto o pagamento de multa. Entretanto, segundo
ele, mesmo esse prazo é abusivo, sendo que, por exemplo, o Procon de
São Paulo já proibiu a inclusão desse prazo nos contratos realizados
no Estado. "Não é necessário elaborar uma legislação específica para
combater essa prática. Esses abusos já estão sendo reconhecidos pelo
Judiciário e o consumidor deve recorrer à Justiça para equilibrar o
contrato e requerer o pagamento de indenização por danos morais e
materiais", afirmou.
Juros - Por fim, Lúcio
Delfino falou sobre a cobrança de juros. Ele afirmou que antes da
entrega das chaves não pode haver qualquer cobrança de juros e
orientou os consumidores que estejam nessa situação a entrar na
Justiça e pedir a restituição desses valores, desde que o pagamento
tenha sido feito nos últimos cinco anos. Após a entrega das chaves,
Lúcio Delfino explicou que nos contratos feitos dentro do Sistema
Financeiro de Habitação a cobrança de juros limita-se a 12% ao ano,
mas nos contratos fora do SFH a taxa de juros pode ser maior.
Projeto de lei pretende regulamentar a
situação
O deputado Duarte Bechir (PMN) explicou que um
projeto de lei de sua autoria pretende regulamentar a situação em
Minas e proteger o consumidor no caso de atraso na entrega dos
imóveis comprados na planta. Entre as medidas previstas no texto,
está a proibição de cobrança de condomínio antes da entrega dos
imóveis.
Duarte Bechir afirmou que é preciso regulamentar a
situação, pois, nos últimos anos, diante da estabilidade econômica,
do aumento de renda e do crédito, houve um crescimento no número de
imóveis vendidos no Brasil e também no número de problemas
registrados. Segundo ele, o Procon Municipal de Belo Horizonte
recebeu, em 2010, cerca de 1.200 reclamações sobre atrasos na
entrega de imóveis. O parlamentar lembrou que o atraso gera grandes
danos na vida do consumidor, pois prejudica seus planos e projetos
pessoais.
O parlamentar afirmou também, que além da questão
do atraso, muitas vezes o consumidor recebe o imóvel com vários
problemas. Na reunião, o diretor-presidente da Associação Brasileira
dos Mutuários da Habitação, Richarde Neviton Mamede, fez relatos de
imóveis que foram entregues pelas construtoras e encontram-se
inacabados ou com problemas de construção.
Lista suja - O deputado
Sávio Souza Cruz (PMDB) sugeriu que seja acrescentado no texto do
projeto de lei a criação de uma lista suja, divulgando o nome das
empresas que atrasam a entrega dos imóveis. "A criação dessa lista
suja iria gerar um grande dano na imagem das construtoras",
considerou. A vice-presidente da comissão, deputada Liza Prado
(PSB), apoiou a ideia do parlamentar e lembrou que o CDC já prevê
que os órgãos de defesa do consumidor divulguem os nomes dessas
empresas. Nesse sentido, o coordenador do Procon Assembleia, Marcelo
Barbosa, afirmou que vai começar a divulgar no site da instituição a
relação das construtoras com problemas.
Liza Prado também solicitou que os compradores de
imóveis que estejam com problemas para o seu recebimento entrem em
contato com a Comissão de Defesa do Consumidor. "Nós vamos
encaminhar todos os relatos para o Ministério Público com o objetivo
de viabilizar a entrada na Justiça de processos coletivos", afirmou.
O deputado Duilio de Castro (PMN) também criticou a
posição das construtoras e defendeu a adoção de medidas punitivas.
Ele também afirmou que seu gabinete está disponível para receber
reclamações de consumidores e que irá ajudar na divulgação dos nomes
das empresas com problemas. Já o deputado Antônio Júlio (PMDB)
lembrou que o programa "Minha Casa, Minha Vida" também apresenta
problemas semelhantes. "Temos casas que já estão prontas há mais de
um ano e não foram entregues. Temos que discutir essa questão",
considerou.
Requerimentos pretendem aprofundar a
questão
Na reunião, foram apresentados e aprovados vários
requerimentos com o objetivo de conhecer melhor a realidade sobre o
atraso na entrega de imóveis comprados na planta e tentar contribuir
para resolver a situação. Entre eles, está o requerimento
apresentado pelos deputados presentes na reunião solicitando que
seja encaminhada ao Ministério Público as notas taquigráficas da
audiência para conhecimento e providências.
Outro requerimento aprovado foi apresentado pelo
deputado Duilio de Castro. Ele solicita que as empresas Tenda, MRV e
Habitare remetam à comissão relação com nome e endereço, prazo para
início das obras e prazo para a entrega de todos os contratos
vendidos na planta. Também pede que as construtoras informem quantos
empreendimentos possuem e sua localização.
Da deputada Liza Prado, foram aprovados seis
requerimentos, três deles tratando de temas relacionados a reunião.
O primeiro solicita que seja incluído no projeto do deputado Duarte
Bechir a proibição de cláusulas contratuais que retirem a
responsabilidade das construtoras de entregar as chaves em uma data
única e previamente pactuada. Também propõem a proibição de previsão
contratual de prazo de prorrogação de entrega sem penalidade para a
vendedora.
O segundo requerimento pede que o Ministério
Público tome providências em relação as cláusulas abusivas de
contratos da MRV. O outro solicita que seja enviado à MRV pedido de
informação sobre a entrega de imóvel referente ao condomínio Avant
Garden, localizado em Belo Horizonte.
Lagoa Santa - Os outros
três requerimentos da deputada tratam de reunião da comissão
realizada no último dia 18 de abril, que discutiu a qualidade da
água de Lagoa Santa. Eles pedem que sejam encaminhadas as notas
taquigráficas da reunião para o Ministério Público e que sejam
encaminhados à Copasa pedido de informações sobre o abastecimento e
a qualidade da água de Lagoa Santa e sobre a realização de mutirão
com a Prefeitura para a limpeza das fossas.
Foram aprovados quatro requerimentos do presidente
da comissão, deputado Délio Malheiros (PV). Eles pedem a realização
de debate público para debater a formação e desenvolvimento do
Sistema Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor, de audiência
pública em Juiz de Fora para debater supostas ilegalidades na
instalação de radares no município, e de audiência pública para
discutir o aumento do preço dos combustíveis. O último requerimento
do parlamentar pede que seja formulado voto de congratulações à
Ordem dos Advogados do Brasil pela indicação de Bruno Kneipp e
Marcelo Barbosa para a composição da Comissão de Defesa do
Consumidor.
Por fim, foi aprovado requerimento do deputado
Rogério Correia (PT) solicitando a realização de audiência pública
para obter informações sobre a segurança oferecida pela Copasa no
tratamento e na distribuição de águas no município de São
Francisco.
Presenças - Deputada Liza
Prado (PSB), vice-presidente; deputados Antônio Júlio (PMDB), Carlos
Henrique (PRB), Duilio de Castro (PMN), Duarte Bechir (PMN) e Sávio
Souza Cruz (PMDB); e, além dos convidados já citados, o analista do
Ministério Público, Marcelo Henrique Sampaio de Souza; o vereador de
Uberlândia, professor Neivaldo; e as representantes da construtora
MRV Engenharia Bianca Vargas e Heliane Silveira.
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