MinC vai exigir explicações da produtora do Cordel Nordestino
O Ministério da Cultura (MinC) vai acionar os
responsáveis pela Taboca Produções e Eventos, produtora do "Cordel
Épico Nordestino", para que esclareçam irregularidades apontadas por
artistas que participaram da montagem do espetáculo em Belo
Horizonte. A comunicação foi feita pelo secretário de Fomento e
Incentivo à Cultura do MinC, Henilton Menezes, na audiência pública
da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas
Gerais, esta segunda-feira (18/4/11). Na reunião, solicitada pelo
presidente da comissão, deputado Durval Ângelo (PT), foram ouvidos
além de representantes do MinC, de entidades de artistas e de
produtores culturais, os atores, músicos e o diretor da peça "Cordel
Épico Nordestino", João das Neves.
Henilton Menezes esclareceu que o projeto em
questão está com captação prevista até dezembro deste ano, num valor
que pode chegar a R$ 487 mil. Até agora, R$ 200 mil foram captados
pela produtora e o Ministério liberou 40% desse valor. Após ouvir o
relato dos artistas mineiros, ele constatou, de início, uma
irregularidade no projeto encaminhado ao Ministério: a ausência de
Belo Horizonte entre as cidades previstas pela produtora para
realizar o espetáculo.
Menezes assumiu ainda que há fragilidades no
acompanhamento de projetos pelo MinC, pois o sistema não é
informatizado, o que dificulta a fiscalização. Para ele, quando for
implantado o sistema informatizado, o órgão sairá da era de apurar
erros depois e só então punir para um acompanhamento constante e
correção de rumos durante a execução do projetos. "Se não temos
condições de verificar tudo a tempo, cabe a vocês, artistas, nos
informarem", destacou.
Produtora só pagou um mês de salário
O diretor da peça "Cordel Épico Nordestino", João
das Neves, representando o elenco, relatou que "todos eles foram
contratados 'de boca', portanto, sem contratos assinados". Ele disse
que realizou uma seleção com 50 atores, sendo escolhidos 16 para
atuar na peça. Segundo João, ele e os artistas trabalharam por dois
meses seguidos, quando a produtora pagou um mês de salário (de cerca
de R$ 6 mil) e afirmou que não pagaria mais. O diretor afirmou ainda
que muitos dos atores largaram empregos e bolsas de estudo, vindo do
Norte de Minas, Rio de Janeiro e São Paulo por terem se identificado
com o projeto.
Na avaliação de João das Neves, o episódio é
revelador de situação que vem ocorrendo em função do modelo das
atuais leis de incentivo à cultura. "Estão criando castas de
gestores culturais que contratam para grandes empresas interessadas
em fazer marketing cultural", criticou ele, analisando que, com
isso, a atividade artística deixa de ser determinada pela classe de
artistas, ficando subordinada ao interesse das empresas". O diretor
criticou também a fiscalização dos projetos pelo Ministério da
Cultura. "A prestação de contas é puramente fiscal. Não se vê o
resultado artístico: se o projeto fomentou novas atividades
artísticas, novos grupos teatrais, nada!".
A presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos
em Espetáculo e de Diversão de MG (Sated), Magdalena Rodrigues,
ressaltou que denúncias como a discutida na audiência pública chegam
frequentemente ao sindicato. E que situações como essa acontecem com
mais frequência no interior do Estado. "A relação de trabalho
precisa ser esclarecida. O produtor tem que ter a noção de que os
artistas são trabalhadores", defendeu. A sindicalista também
criticou a fiscalização dos projetos pelo MinC: "se o dinheiro
captado for roubado, mas devidamente justificado por notas fiscais,
tudo bem!"
Também o presidente do Sindicato dos Produtores de
Artes Cênicas de MG (Sinparc), Rômulo Duque de Azevedo, concordou
com que se estabeleça uma relação profissional para realização de
espetáculos culturais. E reclamou que, nos moldes atuais das leis de
incentivo, o único que tem direitos garantidos é o captador, que
seria "intocável". Na opinião dele, essa legislação descumpre o que
preceitua a Lei federal 6.533, de 1978, que trata da regulamentação
das profissões de Artista e de Técnico em Espetáculos de Diversões.
A norma, em seu artigo 9º, prevê que o exercício dessas profissões
exige contrato de trabalho padronizado. Duque sugeriu que seja
acrescentado às leis de incentivo cláusula prevendo a interrupção do
envio de recursos ao produtor inadimplente com direitos
trabalhistas.
O deputado Durval Ângelo lembrou que foi procurado
por João das Neves e sua mulher, a cantora Titane, para que a
comissão interviesse no caso. "Estamos aqui hoje para resguardar
duas coisas: a dignidade e a cidadania dessas pessoas que foram
lesadas". Depois de ouvir os convidados, ele informou que vai cobrar
a agilização da ação trabalhista contra a Taboca Produções e Eventos
à Vara da Justiça do Trabalho e ao Tribunal Regional do Trabalho.
Ele também anunciou que vai enviar a documentação sobre essa ação ao
Ministério. As notas taquigráficas da reunião serão encaminhadas ao
Ministério Público, ao MinC e à Ordem dos Músicos. Todos esses
requerimentos de providências serão apreciados na próxima reunião da
comissão.
Projeto no Congresso reformula leis para
cultura
Falando sobre as leis de incentivo à cultura,
Bernardo Mata Machado, coordenador de Relações Federativas e
Sociedade do MinC, disse que o atual modelo aponta para uma visão de
que o Estado não é produtor de cultura, só fomentador. Está
implícita aí, segundo ele, a ideia de que é o mercado é o grande
portador da cultura, e o mercado produz desigualdades: geográficas
(80% recursos vão para RJ e SP), entre artistas (mais ou menos
famosos), entre patrocinadores (grandes empresas e pequenas).
Para ele, o momento atual é o de rediscutir esse
papel do Estado na cultura, o que já é apontado pelo anteprojeto de
lei criando o Pró Cultura, que tramita na Câmara dos Deputados. Na
avaliação de Machado, o projeto aponta para a valorização do Fundo
Nacional de Cultura, que disponibilizaria recursos diretos do
Tesouro Nacional para o setor cultural. Outras medidas no projeto
seriam a valorização dos conselhos de cultura, como espaços de
fiscalização da sociedade e a obediências às diretrizes previstas no
Plano Nacional de Cultura.
Outros artistas presentes defenderam a reformulação
das atuais leis que regem o setor cultural. Também se pronunciaram:
o diretor da Ordem dos Músicos (seção Minas Gerais), José Dias
Guimarães; a representante do Movimento Cena e assessora do vereador
de Belo Horizonte Arnaldo Godoy, Ângela Mourão; a artista de dança
Maria de Lourdes Tavares; e o presidente da Cooperativa da Música de
Minas, Makely Oliveira Soares Gomes.
Presenças - Deputados
Durval Ângelo (PT) e Rogério Correia (PT).
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