Jornalistas apontam as dificuldades para se fazer a reforma
política
O Brasil não deverá ter uma reforma política
profunda, que altere completamente os sistemas eleitoral e
partidário. Essa é a previsão de jornalistas e cronistas de política
ouvidos nesta terça-feira (5/4/2011) pela Comissão Extraordinária de
Acompanhamento da Reforma Política, em audiência na Assembleia
Legislativa de Minas Gerais. Entre os principais argumentos, estão a
falta de um ambiente político favorável a mudanças significativas e
o fato de os parlamentares estarem votando o próprio futuro. A
comissão está realizando audiências para apresentar contribuições ao
Congresso Nacional, onde a reforma política deverá ser votada.
O presidente da ALMG, Dinis Pinheiro (PSDB)
participou da abertura da reunião e saudou os jornalistas Carlos
Lindenberg, colunista do jornal Hoje em Dia e presidente do Centro
de Cronistas Políticos e Parlamentares de Minas Gerais (Cepo);
Teodomiro Braga, diretor do jornal O Tempo; Luiz Carlos Bernardes,
da BandNews; e Bertha Maakaroun, jornalista do Estado de Minas e
doutora em Ciência Política. São profissionais, segundo Dinis, que
"sempre se pautam por uma visão equilibrada e serena e que vão
abrilhantar os trabalhos da comissão".
Um dos mais céticos em relação à reforma política,
Teodomiro Braga argumenta que os ocupantes do poder não estão
interessados na reforma e que a oposição está desarticulada. "Não há
uma crise política que force uma reforma. Não creio nem em uma
reforma limitada porque até o voto distrital, única mudança viável
nesse contexto, enfrenta oposição", afirma. Ainda assim, o
jornalista diz esperar por mudanças pontuais e salienta que várias
alterações seriam necessárias para evitar, por exemplo, que
deputados com poucos votos sejam eleitos "na carona" de outros e que
partidos políticos de aluguel continuem a "poluir" o sistema
partidário.
Carlos Lindenberg lembrou que, desde 1988, a partir
da promulgação da Constituição Federal, já se fala da necessidade de
uma reforma política no Brasil. "Ela não é feita porque não
interessa aos que detêm o mandato. Alguém sairia prejudicado com a
mudança nas regras do jogo", aponta. Por isso mesmo, segundo o
colunista, em Brasília já se fala em uma reforma "pontual". Para
Lindenberg, a solução é mobilizar a sociedade civil, os sindicatos,
a imprensa, para que pressionem pelas mudanças. "O meio político
precisa ser saneado. É preciso melhorar a representatividade. O
único consenso por aí é a decepção do eleitor", afirma.
Experiências mundiais devem ser observadas
"Quando os deputados são colocados para discutir o
próprio futuro, não vejo como o Congresso possa fazer uma reforma
profunda", concordou também Bertha Maakaroun. Ela listou os
principais sistemas eleitorais adotados na atualidade e as vantagens
e problemas de cada um deles. Mas afirmou não ser uma crítica do
sistema proporcional adotado no Brasil. Para a jornalista, o modelo
brasileiro precisa de ajustes, como nas coligações que fazem das
legendas pequenas verdadeiros "balcões de negócios". Bertha salienta
ainda que o modelo conhecido por "Distritão", que tem sido defendido
por alguns partidos, foi abandonado pelo Japão. "É uma guerra de
todos contra todos", define.
Já Luiz Carlos Bernardes citou o exemplo da Costa
Rica, onde o presidente só pode ser eleito uma vez, enquanto os
parlamentares podem ser reeleitos, mas com intervalo de uma mandato.
"Isso abre espaço para mais gente", ponderou. Ele também criticou a
existência de "caixa dois" nas campanhas e avaliou que essa
irregularidade continuará existindo mesmo se for aprovado o
financiamento público de campanhas, outro ponto discutido na
reforma. Luiz Carlos defende o fortalecimento sindicatos como base
para o fortalecimento dos partidos políticos. "Os sindicatos
formaram políticos importantes, mas foram enfraquecidos pela onda
neoliberal", analisa.
Deputados frisam necessidade da participação
popular
O coordenador da comissão, deputado Carlos Mosconi
(PSDB) admitiu ter receio de que a reforma política não se
aprofunde, uma vez que o assunto ainda não "comoveu" a opinião
pública. Mas admitiu que se nada for mudado, a situação ficará
desconfortável para a própria classe política. André Quintão (PT)
também salientou a importância da participação da sociedade e
afirmou que, se a reforma ficar apenas no Congresso, não terá
legitimidade. "Acho importante que tenhamos iniciativas como a
Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político
Brasileiro", afirmou, citando a reunião de várias entidades em torno
da reforma.
O deputado Romeu Queiroz (PSB) lamentou que a
comissão da ALMG não tenha o tempo necessário para percorrer todo o
Estado, uma vez que a reforma já começou a ser votada na comissão do
Senado. Por isso mesmo, ele voltou a defender o uso de redes sociais
para permitir a participação dos cidadãos nessa discussão e em
outras travadas na Casa. Uma Proposta de Emenda à Constituição está
sendo proposta pelo parlamentar. Já Rogério Correia (PT) defendeu
não só a participação popular, mas também um posicionamento dos
partidos políticos. Para ele, o sistema eleitoral atual está
enfraquecendo a representatividade e a própria democracia.
A deputada Luzia Ferreia (PPS) também lamentou que
os grandes partidos ainda não tenha fechado suas propostas para a
reforma política. Para a parlamentar, o voto distrital misto poderia
garantir tanto a eleição de deputados com votação regionalizada
quanto deputados com votos pulverizados. Um estudo detalhado sobre o
voto distrital está sendo elaborado pelo deputado Fábio Cherem (PSL)
e deverá ser apresentado em breve. Na visão do parlamentar, a
reforma deve levar em conta o interesse do eleitor em acompanhar a
atuação do seu parlamentar. No caso do Brasil, com regiões
continentais, o voto distrital, segundo ele, favoreceria essa
aproximação. "A população só vai se mobilizar por uma proposta que
ela entenda", acredita.
Judiciário - Já Antônio
Júlio (PMDB) defendeu uma reforma que alcance o Judiciário. Ele
lembrou que, em 1996, foi aprovada a lei da cláusula de barreira,
para eliminar "partidos de aluguel". A lei deveria valer dez anos
depois, mas em 2006, foi considerada inconstitucional. "No caso do
Ficha Limpa, o Supremo ainda estava decidindo, cinco meses depois
das eleições", lembrou. Para o deputados, a classe política é a
"vidraça", já que há receio de se falar da Justiça.
Financiamento depende do modelo partidário
O financiamento de campanha também foi discutido na
audiência. Bertha Maakaroun lembrou que já existe o financiamento
público de campanhas no Brasil. Citando estudos acadêmicos, ela
afirmou que o País deixou de arrecadar R$ 890 milhões em isenção
fiscal aos meios de comunicação nas últimas eleições, por causa do
horário eleitoral gratuito. E se os partidos tivessem que pagar por
esses horário, teriam que desembolsar R$ 6,2 bilhões. Mesmo assim,
Luzia Ferreira enfatizou que a ausência de mulheres na política está
relacionada à falta de financiamento.
Os participantes da audiência reconheceram que o
desafio da comissão é maior, diante das dificuldades para se
realizar a reforma política. Eles argumentam que será preciso
apresentar propostas viáveis como o fim das coligações, a efetivação
do Ficha Limpa e mudanças na eleição de suplentes para o Senado.
Presenças - Deputados
Dinis Pinheiro (PSDB), presidente da ALMG, Carlos Mosconi (PSDB),
coordenador da comissão, Antônio Júlio (PMDB), deputada Luzia
Ferreira (PPS), deputados Rogério Correia (PT), Romeu Queiroz (PSB),
Fábio Cherem (PSL), Jayro Lessa (DEM), André Quintão (PT), Luiz
Humberto Carneiro (PSDB), Gustavo Valadares (DEM), Bonifácio Mourão
(PSDB) e Durval Angelo (PT).
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