Comissão constata falta de treinamento para uso de armas não
letais
A falta de treinamento de integrantes do sistema
prisional para o uso de armamentos considerados não letais foi o
principal problema apontado em audiência pública da Comissão de
Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais nesta
segunda-feira (5/7/10). Requerida pelo presidente da comissão,
deputado Durval Ângelo (PT), a reunião teve como objetivo discutir,
sob a ótica dos direitos humanos, o uso das armas ditas não letais
pelos agentes de segurança pública do Estado.
Leonardo Aganette Pessoa, vice-diretor do Comando
de Operações Prisionais Especiais (Cope), grupo que conta com 84
agentes penitenciários efetivos, enfatizou que a grande deficiência
em sua área é o treinamento. "O curso de formação de agentes
penitenciários é ainda deficiente", constatou. O problema é agravado
pelo fato de que, no universo de 14 mil agentes penitenciários em
atividade no Estado, apenas 4 mil são concursados e os 10 mil
restantes são contratados.
Comentando a fala de Leonardo Pessoa, Durval Ângelo
reforçou que, nos últimos meses, ele e o presidente da Comissão de
Segurança Pública, deputado João Leite (PSDB), têm recebido várias
denúncias de uso indiscriminado de balas de borracha e spray de
pimenta. As denúncias se referem principalmente a agressões a
detentos em unidades prisionais. Durval questionou Pessoa quanto ao
controle do uso dessas armas por parte dos diretores de unidades
prisionais. Leonardo Pessoa respondeu que só podia responder por sua
unidade. Ele afirmou que, no Cope, quando sai algum armamento, fica
registrado o nome e o "masp" do agente responsável pela retirada, a
quantidade de munição utilizada e os dados são passados para a Vara
de Execuções Criminais.
O deputado Durval Ângelo citou alguns casos
emblemáticos de agressões com armamentos não letais: o garoto
Douglas Oliveira, 13 anos, que ficou parcialmente cego ao ser
atingido por bala de borracha disparada por policial militar no
Mineirão, em 2009; e Filipe Pereira, de 28 anos que, mesmo
acompanhado da mulher, foi retirado à força de ônibus por PMs,
jogado ao chão e atingido no peito por projétil de borracha após
jogo do Campeonato Brasileiro, em 2010. O parlamentar citou ainda
denúncias de detentos de Coronel Fabriciano, São Sebastião do
Paraíso e Caratinga, entre outros, que reclamaram do uso de spray de
pimenta diretamente nos olhos.
O ouvidor de Polícia do Estado, Paulo Vaz Alkmin,
complementou que de 2008 a 2010, foram denunciados, só ao órgão, 11
casos de agressão por armamento não letal. O vice-presidente da
Torcida Organizada Galoucura, Willian Palumbo, destacou que Filipe
Pereira não compareceu à reunião na comissão porque estaria sendo
intimidado por policiais. Na opinião dele, muitas pessoas agredidas
pela PM não denunciam porque temem represálias. "Um amigo meu quase
perdeu o pênis por causa de um tiro de bala de borracha disparado
por policial há um ano e meio", contou.
PM que atirou bala de borracha é processado por
Justiça Militar
Em resposta, o corregedor da Polícia Militar,
coronel Cezar Romero Machado Santos, declarou que todos os casos que
chegam ao órgão são devidamente apurados. Ele informou que, com
relação ao menino Douglas, foi apurado que a utilização do armamento
foi correta, apesar do dano que acarretou. Mesmo assim, o policial
responsável foi indiciado. Quanto à agressão a Filipe Pereira,
Romero disse que o uso da bala de borracha foi completamente fora de
tudo o que a PM ensina a seus policiais. Pela utilização inadequada,
o policial foi indiciado e o processo foi encaminhado à Justiça
Militar.
O capitão Edson Gonçalves, representando a Academia
de Polícia Militar (Acadepol), ressaltou que atualmente o militar,
para fazer uso desse tipo de arma, necessariamente passa por
treinamento específico. Ele acrescentou que está sendo preparado
pela Acadepol um caderno doutrinário tratando, principalmente, da
munição de impacto controlado (bala de borracha) e do spray de
pimenta. Segundo o capitão, a distância mínima exigida para o uso de
armamento com bala de borracha é de 20 metros entre o militar e o
alvo. Os tiros devem sempre mirar as pernas, jamais a cabeça ou
órgãos genitais.
O coordenador do Grupo de Resposta Especial (GRE),
delegado Sérgio Rodrigo de Melo Andrade, juntamente com alguns de
seus comandados, exibiram na reunião alguns armamentos considerados
não letais. O policial Sandro Vinícius Procópio mostrou o revólver
de choque stinger, que provoca incapacitação neuromuscular por oito
segundos e só pode ser usado numa distância entre quatro e sete
metros. Já a espingarda calibre 12 pode disparar diversos projetis
de polietileno e outros materiais, a uma distância mínima de cinco
metros.
O espargidor de gás pimenta (ou spray de pimenta)
só deve ser usado a um metro da vítima, podendo provocar lesões
oculares fortes se disparado a uma distância menor. Sandro Procópio
destacou que no GRE eles optam por uma outra definição desse tipo de
armamento, caracterizado como de menor potencial ofensivo, e não
como arma não letal. "Todo armamento tem potencial ofensivo e pode
vir a matar, conforme o caso e o uso", avaliou.
O coordenador do Centro de Apoio Operacional das
Promotorias de Justiça e Defesa dos Direitos Humanos e de Apoio
Comunitário, promotor Rodrigo Filgueira de Oliveira, comentou a
demonstração dos armamentos. "Essas armas de não letais não têm
nada!", ironizou. Ele sugeriu a Durval Ângelo que o assunto fosse
levado ao Colegiado das Corregedorias do Estado, com ênfase no
treinamento de pessoal, principalmente dos agentes
penitenciários.
Durval acatou a sugestão, informando que vai
apresentar requerimento sobre o assunto nas próximas reuniões. O
deputado disse também que vai solicitar à Assessoria das Comissões
um levantamento de todos os casos denunciados envolvendo o uso de
armas não letais. Essa mesma solicitação, segundo Durval, será feita
ao Colegiado das Corregedorias e às Ouvidorias de Defesa Social, do
Sistema Prisional, da PM e da Polícia Civil.
Requerimentos - Na
reunião, foram aprovados vários requerimentos de deputados.
Vanderlei Miranda (PMDB) solicita envio das notas taquigráficas da
reunião realizada pela comissão no dia 22 de junho à
Procuradoria-Geral de Justiça, ao secretário de Esportes e da
Juventude e aos presidente da OAB-MG, Conedh e Federação das
Associações de Pais e Alunos das Escolas Públicas de Minas Gerais. O
deputado requer que seja realizada reunião com convidados para obter
esclarecimentos sobre abuso sexual contra criança. Durval Ângelo
solicita audiência pública para discutir violações de direitos
humanos e o eminente despejo de cerca de 4 mil famílias em 981
barracos da ocupação Dandara.
O deputado Durval Ângelo também requer que seja
encaminhado ao capitão Roberto Caetano Moreira, chefe da Seção de
Inteligência da 19ª Cia. da PM de Pará de Minas, pedido de cópia dos
documentos referentes à apuração de denúncias contra o sargento
Regicardo Antônio Rosa e o cabo José Geraldo da Silva, acusados de
abuso de autoridade, agressões e torturas contra cidadãos de
Conceição do Pará. Durval Ângelo requer ainda que sejam encaminhados
à Corregedoria da PM, à Ouvidoria de Polícia, ao presidente da
Comissão de Direitos Humanos da OAB-MG, ao Ministério Público, ao
juiz da comarca de Pitangui e à Delegacia de Polícia Civil de
Conceição do Pará cópia das notas taquigráficas da reunião da
comissão realizada no dia 28 de junho e pedido de providências para
averiguar as denúncias apresentadas contra os policiais.
Presenças - Deputados
Durval Ângelo (PT), presidente; Vanderlei Miranda (PMDB), Delvito
Alves (PTB), Lafayette de Andrada (PSDB), Sebastião Costa (PPS) e
Sargento Rodrigues (PDT).
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