Lei que autorizava verticalização em orla de lagoa é
questionada
A legitimidade de uma lei municipal que autorizava
a construção de empreendimentos verticais na orla da Lagoa Central
da cidade de Lagoa Santa (Região Metropolitana de Belo Horizonte),
foi uma das principais discussões durante a audiência pública que a
Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da
Assembleia Legislativa de Minas Gerais promoveu nesta quinta-feira
(27/5/10).
O vice-presidente da comissão, deputado Sávio Souza
Cruz (PMDB), autor do requerimento para a audiência, disse que o
fato de a lei ter sido aprovada na Câmara de Vereadores e sancionada
pelo prefeito e, em pouco tempo, ter sido revogada, causa
estranheza. Para ele, ou esse processo se deu para que fossem
beneficiados determinados empreendimentos durante o curto período de
vigência da lei, ou os vereadores e o prefeito estão arrependidos e,
por essa razão, decidiram revogar a lei.
Também destacou esse fato o diretor da Escola de
Belas Artes da UFMG Luiz Antônio Cruz Souza, que é membro do
Conselho Estadual do Patrimônio Cultural (Conep). Luiz Antônio
afirmou que moradores de Lagoa Santa e entidades ligadas ao meio
ambiente e à cultura não foram chamados a discutir o projeto que deu
origem à lei que permitia a verticalização na orla da lagoa,
questionando sua validade. "Lei nula não gera direitos", declarou.
O procurador-geral do município de Lagoa Santa,
Frederico Binato, explicou que no período em que a lei ficou em
vigência, algumas empresas se inscreveram para obterem a permissão
para construírem na orla e que alguns alvarás foram concedidos.
Binato afirmou que a Prefeitura de Lagoa Santa está analisando a
recomendação do Ministério Público para que sejam suspensas essas
autorizações, ressaltando que a questão deve ser avaliada inclusive
sob o ponto de vista jurídico. Ele disse que é preciso ter cautela,
porque a questão envolve também os direitos dos empreendedores.
Para o coordenador das promotorias de Justiça de
Defesa dos Rios das Velhas e Paraopeba, promotor Carlos Eduardo
Ferreira Pinto, os empreendimentos são insustentáveis ambiental e
juridicamente. Ele reiterou que é necessário que as autorizações
sejam imediatamente suspensas, até que haja uma solução para o
impasse. Informou, ainda, que o Ministério Público vem estudando o
caso há meses e que "vai agir com o rigor que a lei impuser". O
promotor lembrou que, apesar de terem sido concedidos os alvarás, as
empresas ainda não estão autorizadas a construir, pois isso ainda
depende de licenciamento ambiental.
Autor do projeto admite que a lei foi um erro
O autor do projeto que deu origem à lei que
permitia a verticalização, Wanderley Soulares, admitiu que, ao
apresentar o projeto à Câmara de Vereadores de Lagoa Santa, não
levou em consideração os aspectos ambientais. "Eu estava pensando no
crescimento de Lagoa Santa", declarou. Ele disse que os vereadores
aprovaram a revogação da lei que eles próprios tinham aprovado
porque entenderam que houve um erro de avaliação.
O presidente da Câmara, vereador José Quintino
Marques, esclareceu que o projeto tramitou dentro dos prazos
regimentais, e que ninguém apareceu para se manifestar
contrariamente. Moradores que falaram durante a fase de debates,
rebateram essa afirmação, alegando que a população não foi chamada a
participar da discussão.
Outros problemas que ameaçam a Lagoa Central são
apontados
A construção de empreendimentos verticais na orla
da Lagoa Central é apenas um dos problemas que ameaçam a área. Essa
é a avaliação do presidente do Subcomitê da Bacia do Ribeirão da
Mata, José Procópio de Castro. A ocupação desordenada do entorno da
lagoa, o padrão de construção das ruas e a deficiente drenagem
pluvial, que contribuem para o assoreamento, e a não preservação das
nascentes, foram alguns dos problemas apontados.
Para José Procópio, a preservação da Lagoa Central
depende de muitos fatores, principalmente de planejamento urbano.
Ele lembrou que os córregos Bebedouro e Jaque, que deságuam na
lagoa, são fundamentais para sua manutenção, sendo importante
preservá-los. José Procópio também alerta para o grande crescimento
previsto para Lagoa Santa, tendo em vista os investimentos na
região, como a ampliação do Aeroporto Internacional Tancredo Neves e
a implantação da Cidade Administrativa.
Moradores - A audiência
contou também com a presença de vários moradores de Lagoa Santa, que
se manifestaram contra a instalação dos empreendimentos verticais na
orla da Lagoa Central.
Ana Beatriz Apocalypse, do movimento Abrace Lagoa
Santa, defendeu o desenvolvimento sustentável e a qualidade de vida
dos moradores. Ela criticou a administração municipal pelo fato de
os moradores não terem sido chamados para discutir o projeto que deu
origem à lei da verticalização.
O morador José Renato Amaral também afirmou que a
população não está sendo ouvida, e disse que a lei de uso e ocupação
do solo "está virando uma colcha de retalhos, pois a todo momento é
votada uma alteração". Patrícia Boson, que atua na liderança local,
propôs que sejam estudadas ações conjuntas com vistas à preservação
da Lagoa Central. Subsídios para coleta de esgoto e projetos de
drenagem para controle dos sedimentos na lagoa foram algumas das
medidas sugeridas por Patrícia. Ela também fez um apelo para que
sejam suspensos os alvarás para construções verticalizadas. "Em nome
do clamor popular, que o prefeito revogue essa autorização", pediu.
O presidente da comissão, deputado Fábio Avelar
(PSC), disse que espera que esses empreendimentos não sejam
iniciados até que a questão seja esclarecida, mas acredita que as
obras não sejam passíveis de execução, por todas as implicações que
foram apresentadas durante a reunião.
Presenças - Deputados
Fábio Avelar (PSC), presidente, e Sávio Souza Cruz (PMDB), vice.
Também participaram da audiência a diretora de Proteção e Memória do
Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico, Vera
Chacham; o presidente do Conselho Consultivo da APA Carste de Lagoa
Santa, Ivson Rodrigues; e a diretora de Meio Ambiente do Circuito
Turístico das Grutas, Maria de Fátima Guimarães.
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