Debate procura solução para processo que se arrasta desde 1941

O encaminhamento do caso das desapropriações das fazendas Perobas e Ferrugem para a implantação da Cidade Industrial ...

24/05/2010 - 00:01
Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais
 

Debate procura solução para processo que se arrasta desde 1941

O encaminhamento do caso das desapropriações das fazendas Perobas e Ferrugem para a implantação da Cidade Industrial de Contagem à Comissão Interamericana de Direitos Humanos foi sugerido pelo coordenador de Direitos Humanos da Defensoria Pública de Minas Gerais, Gustavo Corgozinho Alves de Meira. Ele participou, nesta segunda-feira (24/5/10), do Debate Público Desapropriações e indenizações na Cidade Industrial: 70 anos de impasse, que tratou da situação das 435 famílias herdeiras no processo de desapropriação pelo poder público, que teve início em 1941. O evento foi promovido pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.

A apresentação de um projeto para alterar a lei da desapropriação das terras, listando os 1.356 herdeiros reconhecidos por decisão judicial para pleno direito às indenizações, foi outro encaminhamento da reunião. O deputado Durval Ângelo (PT), autor do requerimento para a realização do debate público, também informou que solicitará audiências com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e com o governador Antônio Augusto Anastasia para cobrar o posicionamento deles em relação ao caso. A comissão também vai encaminhar as notas taquigráficas do debate às diversas instituições que acompanham o processo.

Para o defensor público Gustavo Meira, é inadmissível que um processo tramite por todo esse tempo. "Justiça que demora demais não traz justiça", afirmou. Gustavo Meira citou a inclusão do "direito a razoável duração do processo" no texto constitucional, por meio da Emenda à Constituição 45, de 2004. Na opinião dele, não é o caso de se buscar qual o governo responsável pela demora no pagamento das indenizações, uma vez que o processo já passou por 15 governos. "A responsabilidade é do Estado como um todo", afirmou, lembrando que a demora do processo implicará prejuízos para o próprio Estado. O defensor ainda contestou a dificuldade de comprovação dos vínculos de parentesco dos herdeiros, alegada no processo de indenização. "Não acredito que isso ocorra hoje. Na pior das hipóteses, há o exame de DNA", concluiu.

O deputado Durval Ângelo sugeriu que a Defensoria Pública não só redigisse a peça sobre o caso para enviar à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, como também se colocasse como uma das entidades proponentes do processo. O parlamentar informou que a ação dos herdeiros da Cidade Industrial está em fase de execução judicial há dez anos. E questionou: "A demora é resultado da burocracia ou a demonstração clara de que temos dois 'Brasis'? O Brasil de cima, onde está o poder econômico, e o Brasil de baixo, a quem cabe somente cumprir as leis."

Quarta geração de herdeiros luta por indenização

O drama das famílias Abreu e Hilário foi relatado pela representante dos herdeiros, Geovania Cortes de Abreu. Ela contou emocionada que muitos foram retirados das terras a força pelo Exército e outros tantos já não estão mais vivos para lutar pelos seus direitos. Quem luta pelo direito às indenizações hoje é a quarta geração de herdeiros. "Somos herdeiros da ilusão ou vítimas de um Estado ladrão?", perguntou Geovania Abreu.

Segundo ela, o Estado protela o pagamento das indenizações. "Uma hora dizem que não devem; na outra que não sabem a quem devem. Depois argumentam que o direito prescreveu", explicou. A representante das famílias convocou os herdeiros a não desistirem de sua luta. "Não lutamos por sonhos, mas por um direito", afirmou. Ela ainda contestou o argumento do Estado de não ter dinheiro para pagar as indenizações. "Nosso patrimônio contribuiu para o desenvolvimento de Minas. Se o governo não tem dinheiro para nos pagar, que pague com os recursos que tem", concluiu.

A proposta do defensor Corgozinho de denúncia do caso à Corte Interamericana de Direitos Humanos mereceu uma provocação do deputado Durval Ângelo, que evocou o caso Maria da Penha para falar da condenação internacional ao Brasil por permitir maus-tratos às mulheres. O deputado lembrou que para uma denúncia dessas, algumas entidades precisariam ser proponentes, como a OAB, a Comissão de Direitos Humanos e a própria Defensoria Pública.

Com uma palestra interrompida várias vezes por vaias e apitaços, o procurador José Roberto Dias Balbi procurou esclarecer sem paixão e da maneira mais neutra possível que a posição do Estado não é contrária ao pagamento. Embora afirmasse que não estava ali para defender nenhum governo passado e que compreendia a situação de dificuldade e a luta dos herdeiros, Balbi ouviu protestos quando disse que a procuradora encarregada do processo estava em viagem para a Rússia e outro procurador que o conhecia bem também estava viajando.

"O Estado concorda em pagar o que foi estabelecido na sentença de primeiro grau em 1953, mas os herdeiros têm que provar a titularidade e a cadeia sucessória, porque o Estado já pagou várias indenizações e a Advocacia tem o dever de salvaguardar o uso do dinheiro público", afirmou o procurador.

Segundo processo envolve 1.356 pessoas e procurações falsas

O desembargador Evandro Lopes da Costa Teixeira disse que em 20 anos nunca havia se deparado com um processo tão extenso, tumultuado e demorado. "Na verdade são dois processos com 15 volumes cada e mais de mil páginas. O primeiro já tem sentença. O segundo envolve 1.356 pessoas. Uma das dificuldades é que várias pessoas que não tinham direito pleitearam através de fraudes e procurações falsas". O magistrado alertou que, das decisões, ainda cabem vários recursos, e elas podem demorar vários anos. Para ele, a melhor maneira de encurtar caminho é chegar a acordos para uma solução definitiva. Ele propôs que o Estado remeta um projeto de lei à Assembleia, estabelecendo indenização aos familiares.

O deputado Durval Ângelo considerou o magistrado um aliado dos herdeiros das famílias Abreu e Hilário. Indagou do advogado dos herdeiros, Evandro Brandão, qual seria o valor atual das indenizações dos herdeiros das fazendas Perobas e Ferrugem. Brandão disse que a sentença lhes daria R$ 287 por metro quadrado, mas que o valor real seria de R$ 1,5 mil a R$ 2 mil. O deputado lembrou que vários desapropriados fizeram acordo e receberam. "Quem foram? Arthur Savassi, Pentagna Guimarães receberam. Só os pobres não receberam", afirmou.

O advogado Evandro Brandão discordou plenamente do procurador e parcialmente do desembargador. Disse que a intenção do governo de protelar e não pagar é evidente, pois a ação se arrasta há 70 anos. "Estamos enfrentando absurdos jurídicos. Sou procurador de herdeiros de José Manoel de Abreu, do Luiz Claudino Hilário. Todos têm documentos de titularidade e os apresentaram na petição inicial de 1943. Os documentos estão lá. O que está fazendo confusão são as interpretações divergentes da lei. Estão pedindo título de domínio, mas não há precatório".

O deputado Weliton Prado (PT) considera a questão "uma das maiores injustiças do Poder Judiciário na História do Brasil". Citou Dona Maria da Conceição, 81 anos, que ostenta o título de milionária mais pobre do Brasil. "Se a situação foi o Estado que criou, expulsando as pessoas com violência e sem conversa, o Estado tem que pagar. Já passaram 15 governadores e não resolveram a situação".

O deputado disse estar convencido de que o governo está litigando de má-fé, porque a procuradora Maria da Glória teria entrado "com todos recursos protelatórios possíveis e impossíveis". E historiou o caso: o interventor Benedito Valadares, ao decidir criar o Distrito Industrial, mandou desapropriar vastas extensões de terras em Contagem, em 1943. Em 1959, o juiz encerrou processo reconhecendo o direito da família Abreu. Mas o processo teria desaparecido na ditadura de 64 e reaparecido em 1991, quando um juiz decidiu que o direito havia prescrito.

Debates - Na fase de debates, vários herdeiros ocuparam os microfones do Plenário para relatar o drama das famílias que aguardam o pagamento das indenizações. Fizeram apelos emocionados e contaram de tantos que já faleceram, dos doentes, da luta para serem ouvidos. Alguns denunciaram a diferença de tratamento, afirmando que alguns herdeiros ricos e influentes teriam recebido a indenização devida. Os participantes ameaçaram invadir a sede do Executivo estadual para fazer valer seus direitos. Os herdeiros lotaram o Plenário e suas galerias e usavam roupas pretas, chapéus, apitos e faixas para protestar.

Presenças - Deputados Durval Ângelo (PT), presidente; e Weliton Prado (PT). Também participaram da reunião Marco Aurélio Ferenzini, diretor do Fórum e juiz auxiliar da Corregedoria-Geral de Justiça; e André Cordeiro Leal, doutor em Direito Processual.

 

 

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