Febraban resiste a mudar agências bancárias contra crime da
saidinha
Os obstáculos oferecidos por representantes dos
bancos a mudanças em suas agências para prevenir o crime da
"saidinha de banco" gerou desconforto, apelos e advertências durante
debate realizado nesta terça-feira (18/5/10) pela Comissão de
Segurança Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. A
audiência pública discutiu, a requerimento dos integrantes da
comissão, medidas para prevenir este tipo de crime, que consiste na
ação de olheiros que selecionam vítimas dentro das agências
bancárias, que são assaltadas após deixarem o estabelecimento. Em
geral, são escolhidos clientes que sacam maiores valores em dinheiro
vivo.
O principal depoimento foi do comandante do
Policiamento da Capital, coronel Cícero Nunes Moreira, que
apresentou um levantamento e um diagnóstico desse tipo de crime
entre setembro de 2009 e março de 2010. Ele propôs medidas como a
instalação de biombos nas agências, que deem privacidade aos
clientes, e a proibição do uso de celulares nesses locais. Os
representantes da Federação Brasileira de Bancos (Febraban)
criticaram as propostas. "Não vejo isso (a instalação de biombos)
como algo que possa inibir a saidinha de banco", afirmou o diretor
setorial de Segurança Bancária da Febraban, Pedro Oscar Viotto.
A resistência da Febraban provocou críticas de
deputados, do Ministério Público e do próprio comandante do
Policiamento. O coronel Cícero Moreira fez um apelo aos gestores dos
bancos. "Vocês precisam deixar de ser resistentes. A busca
desenfreada pelo lucro merece uma reflexão. Não podemos projetar a
responsabilidade só para a polícia ou o cidadão. É imprescindível
que se melhore a proteção do cidadão dentro da agência bancária",
afirmou o coronel.
Os deputados também cobraram mais ação dos bancos.
"A Febraban não quer despesa; só está interessada no lucro. Onde
fica a segurança do usuário?", questionou o deputado Célio Moreira
(PSDB), autor do PL 762/07, que trata do tema. O deputado Sargento
Rodrigues (PDT) lembrou que o golpe da "saidinha de banco" não é um
problema novo. "Os bancos não têm sensibilidade com a questão humana
e resistem a acatar legislações municipais e estaduais, sob a
alegação de que matéria financeira não é competência desses entes da
federação", criticou.
Já o deputado Délio Malheiros disse acreditar que a
Febraban não estaria refratária à adoção de medidas preventivas,
mesmo porque os bancos têm sido condenados pelo crime da "saidinha",
já que são responsáveis pela integridade física dos clientes.
Vítimas dos assaltos podem processar bancos
A advertência com relação à responsabilização dos
bancos também foi feita pelo promotor Edson Antenor Lima Paula.
Segundo ele, as vítimas das "saidinhas de banco" podem cobrar
indenização das instituições financeiras alegando o vício - falha -
na prestação de serviço, por falta de privacidade para o cliente.
"No Rio de Janeiro, já há jurisprudência favorável para isso",
afirmou o promotor. Ele também lembrou que o Supremo Tribunal
Federal já garantiu que o Estado pode legislar sobre o assunto, de
forma concorrente com a União.
A resistência da Febraban às recomendações de
segurança também foram criticadas pelo presidente do Sindicato dos
Empregados em Estabelecimentos Bancários de Belo Horizonte e Região,
Clotário Cardoso. "Nesse caso, para os bancos, o lucro fala mais
alto que a vida", afirmou. Ele apresentou números sobre os lucros
dos bancos no primeiro trimestre de 2010, que seriam de mais de R$ 3
bilhões para Itaú e Unibanco e R$ 2,3 bilhões para o Bradesco.
Os representantes da Febraban argumentaram ter
total interesse em ampliar a segurança de seus clientes, mas fizeram
ressalvas a todas as recomendações da Polícia Militar. Sobre a
instalação de biombos, o coronel José Vicente, assessor de Segurança
da Febraban, disse que isso apenas faria os assaltos continuarem de
forma aleatória, sem que as vítimas fossem selecionadas a partir dos
valores sacados em caixa. Ele também disse que algumas agências
apresentam muitas dificuldades para a instalação de biombos ou
tapumes.
Quanto à sugestão de se proibir o uso do celular, o
assessor da Febraban disse que o aparelho é um instrumento
importante para o cliente decidir as operações que fará na agência.
Sobre a obrigatoriedade da identificação dos clientes, seja por foto
ou qualquer outro sistema, os representantes da Febraban afirmaram
que isso representaria um volume excessivo de dados, relativos a
milhões de clientes. Em contrapartida, Pedro Viotto preferiu sugerir
a adoção de campanhas de conscientização dos clientes, para evitarem
grandes saques, e a abordagem policial de motoqueiros que circulem
nas proximidades das agências bancárias.
Bancos mais afetados são Bradesco e Itaú
Durante a reunião, o coronel Cícero Moreira
apresentou dados sobre a ocorrência dos assaltos e valores roubados,
discriminados por região da Capital e instituição financeira. O
levantamento foi realizado entre setembro de 2009 e março de 2010.
Esse último mês foi justamente o que apresentou maior número de
ocorrências: 95. A média mensal é de 74. Com relação às agências
onde haviam sido feitos os saques, o maior número foi relativo ao
Bradesco: 137. Outros 114 saques que geraram assaltos foram feitos
em agências do Itaú; 80 no Real e 66 na Caixa Econômica Federal e
Banco do Brasil.
O coronel Moreira ressaltou que não se registrou
nenhum caso relativo ao HSBC em 2010. Em sua opinião, isso se deve
ao fato que o banco já instalou biombos em suas agências, garantindo
privacidade a quem é atendido nos caixas. Com isso, impede-se que o
criminoso escolha a vítima e avise por meio de celular o comparsa
que aguarda fora da agência. Os valores roubados no período
pesquisado são de R$ 2,65 milhões. Destes, R$ 804 mil foram de
clientes do Bradesco; R$ 661 mil de clientes do Itaú e R$ 389 mil de
clientes do Real. No período, foram feitas 14 prisões em
flagrante.
Celulares - A proibição do
uso de celulares foi a medida sugerida pela PM que gerou maior
polêmica. Esta medida também consta no Projeto de Lei 762/07, do
deputado Célio Moreira, o mais antigo a tramitar na Casa sobre o
tema. Para o promotor Edson Paula, a medida é de difícil
implantação, considerando-se a variedade de aparelhos que estão hoje
disponíveis. Além disso, para ele, a imposição da medida poderia
desviar policiais da atividade principal, que é a repressão aos
criminosos. Já o delegado Islande Batista, chefe do Departamento de
Investigação contra o Patrimônio, disse acreditar que a implantação
dos biombos e da identificação de clientes tornaria desnecessária a
proibição dos celulares.
Deputado garante que Assembleia legislará sobre o
tema
Ao final da reunião, o presidente da Comissão de
Segurança Pública, deputado João Leite (PSDB), garantiu que a ALMG
irá legislar sobre o assunto e transmitiu um recado do presidente da
Casa, deputado Alberto Pinto Coelho (PP). "O presidente recomendou
que fizéssemos todos os esforços para dar segurança ao cidadão na
utilização dos serviços bancários. Ele está muito preocupado com o
assunto", declarou João Leite. Ele também ressaltou que a comissão
está aberta a todas as contribuições para aperfeiçoamento dos
projetos em tramitação.
Ao projeto mais antigo que tramita na Casa, o PL
762/07, foram anexadas outras duas propostas sobre o tema: o PL
4.558/10, de Walter Tosta (PMN), que também proíbe a utilização de
celulares em bancos; e o PL 4.559/10, de Délio Malheiros (PV), que
além disso obriga também a instalação de biombos e câmeras de vídeo
nas agências.
Os deputados Célio Moreira, Délio Malheiros e
Sargento Rodrigues avaliam que o próximo passo a ser dado pela
Assembleia é a elaboração de um substitutivo ao PL 762/07. Segundo
Moreira, o novo texto deverá incluir sugestões feitas na audiência
desta terça (18) e as contribuições dos autores de projetos
semelhantes. Rodrigues defendeu um substitutivo de consenso, e
Malheiros avaliou que a Assembleia precisa dar uma resposta à
sociedade, ressaltando que há lacuna para legislar.
Entre as sugestões listadas por Délio Malheiros,
estão mudanças na tela do computador do caixa eletrônico, para
impedir que pessoas nas laterais vejam o valor sacado; alterações na
disposição dos caixas; advertências, a exemplo da que alerta o
usuário para não fornecer sua senha a desconhecidos; e a
possibilidade de registro das ocorrências pela internet.
A deputada Maria Tereza Lara (PT) cobrou uma
campanha de orientação dos bancos a seus clientes para a utilização
mais segura dos terminais de auto-atendimento. Também cobrou tarifas
mais baixas para transferências de valores menores, de forma a
estimular esse tipo de operação bancária.
O deputado Célio Moreira lamentou que seu projeto
tenha ficado parado na Comissão de Segurança Pública por dois anos.
Ele disse que, se já existisse legislação, teriam sido evitados
episódios como a morte recente de uma mulher no bairro Gutierrez,
quando saía de uma agência bancária. Para Moreira, a audiência desta
terça (18) foi uma demonstração de que a Assembleia preocupa-se com
os mineiros, "que estão reféns dos bandidos".
Requerimentos - Três
requerimentos foram aprovados no início da reunião. O primeiro, de
autoria do deputado Durval Ângelo (PT), pede visita da Comissão de
Segurança Pública e da Comissão de Direitos Humanos ao município de
São Sebastião do Paraíso para averiguar denúncia de tortura
praticada em estabelecimento penal de Monte Santo de Minas. O
segundo, de autoria da Comissão de Segurança Pública, propõe
audiência pública para discutir a vitimização dos profissionais de
segurança pública. Por fim, requerimento do deputado Sargento
Rodrigues pede a realização de visita da comissão ao ex-agente
penitenciário Wandrew Schwenck de Assis, de Ribeirão das Neves, que
foi baleado no Fórum de Sete Lagoas em novembro de 2009, enquanto
cumpria suas funções profissionais. Segundo o deputado, Assis está
hoje paraplégico, sem o devido amparo do Estado.
Presenças - Deputados João
Leite (PSDB), presidente da comissão; Rômulo Veneroso (PV), Tenente
Lúcio (PDT), Sargento Rodrigues (PDT), Célio Moreira (PSDB),
Sargento Rodrigues (PDT) e deputada Maria Tereza Lara (PT),
vice-presidente da comissão. Também participaram da reunião o
procurador André Ubaldino; a defensora pública Fernanda Cristiane
Heringer Milagres; o presidente do Conselho de Segurança Pública do
Hipercentro, Lincoln Pereira; o delegado chefe do Deoesp, Márcio
Simões Nabak; e o representante do Conselho Comunitário de Segurança
Pública da Região Oeste, Ernani Ferreira Leandro.
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