Maquinistas denunciam trabalho degradante em ferrovia
mineira
Denúncias de condições degradantes de trabalho e de
excesso de jornada, fatores que colocam em risco a vida e a saúde de
maquinistas e provocam incidentes diários com locomotivas foram
apresentadas à Comissão do Trabalho, da Previdência e da Ação Social
da Assembleia Legislativa de Minas Gerais em audiência pública
realizada nesta quarta-feira (5/5/10). As acusações foram feitas por
representantes do Sindicato dos Ferroviários de Conselheiro Lafaiete
(Sintef-CL) e nem todas conseguiram ser explicadas pelo advogado da
MRS Logística S/A, empresa que opera na região.
A principal reclamação dos trabalhadores é em
relação ao sistema de monocondução (a operação dos trens por apenas
um profissional), implantado em 2001. De acordo com o diretor do
Sintef-CL, Edmir Machado de Oliveira, apenas um maquinista opera, ao
mesmo tempo, cinco ou mais locomotivas que puxam até 132 vagões de
carga. Cada comboio chega a 1,5 mil metros de extensão e 16 mil
toneladas de peso, dificultando muito o trabalho.
Além da atenção que lhe é exigida durante horas
seguidas, o maquinista precisa acionar a cada 40 segundos um
dispositivo, o alertador, conhecido como "homem morto", para emitir
o sinal para o Centro de Controle Operacional. Em função de tantas
tarefas, segundo Edmir Oliveira, o profissional não pode sair do
lugar para fazer necessidades fisiológicas, usando garrafas
plásticas para urinar, e jornais, para defecar. "São situações
constrangedoras", reclama o sindicalista. As refeições também são
feitas durante a operação e não é possível nem higienizar as mãos
antes da alimentação.
O diretor do Sindicato reclamou, ainda, do
excessivo calor dentro das máquinas e da dificuldade de visibilidade
para o maquinista. Os trabalhadores reivindicam o retorno do
auxiliar de maquinista, profissional que antes da implantação do
sistema ajudava o condutor em seu trabalho.
As más condições de trabalho seriam fatores para
muitos incidentes que ocorrem diariamente. O manobrador Adalberto
Lage Resende, que trabalha há 27 anos na empresa, afirma que todos
os dias ocorrem avanços de sinais, colocando em risco pessoas que
atravessam as linhas, sejam de carro ou a pé.
O também diretor do Sindicato, Rodrigo Gabriel
Maurício, explicou que os avanços ocorrem por cansaço do maquinista
que, pela carga horária excessiva, muitas vezes dorme ou tem a
atenção dispersa pelo estresse. Segundo ele, a legislação assegura
uma carga horária de 6 horas para o maquinista mas, na empresa, eles
são forçados a trabalhar uma média de 12 horas por dia e, em alguns
casos, chegam a 26 horas ininterruptas.
O maquinista Paulo César Soares de Sá relatou um
acidente que ocorreu com ele em 2004, o qual atribui à falta de um
auxiliar. Ele contou que uma pedra de 30 toneladas caiu no meio da
linha e ele não conseguiu parar o trem, arrastando-a por 30 metros.
A colisão provocou incêndio na locomotiva e ele não conseguiu
contato com o centro de operações, porque o rádio quebrou. Só
conseguiu fazer contato quando alcançou a locomotiva da frente e só
foi socorrido 2 horas depois.
Ele também citou outro acidente em que o operador
prendeu a mão no freio e lutou sozinho até ser socorrido quatro
horas depois. Em função da lesão e da demora no atendimento, ele
acabou perdendo o dedo.
Representante de empresa não responde às perguntas
técnicas
O consultor jurídico da MRS que compareceu à
audiência, Cássio Ribeiro Proton, admitiu que não tinha como
responder a muitas perguntas dos empregados, alegando que não tem
conhecimento técnico suficiente. Ele afirmou que a empresa mantém
auxiliares em alguns trechos da linha, sem dar detalhes sobre o
critério de escolha para a decisão.
Cássio Proton discordou de que os acidentes sejam
provocados pela falta do auxiliar, imputando "às circunstâncias" a
responsabilidade dos fatos. "Falhas acontecem. A Nasa erra, o setor
de aviação erra", comparou. Afirmou, no entanto, que em todos os
acidentes registrados não houve falha técnica, mas admitiu erros de
maquinistas e controladores. Segundo o advogado, o número de
acidentes na malha ferroviária caiu de 2009 para cá. Naquele ano,
foram registrados 39 acidentes; em 2010, 25; e até março deste ano,
apenas 5.
O deputado Duarte Bechir (PMN), que presidiu a
reunião, lamentou as formas degradantes de trabalho dos maquinistas
e questionou a motivação financeira para a redução do número de
trabalhadores nas locomotivas. "Não existe economia, quando se
coloca em risco a vida do trabalhador e provoca-se acidentes, que
trazem prejuízos", disse.
O autor do requerimento para a audiência, deputado
Padre João (PT), sugeriu ao representante da empresa que o melhor
caminho é o entendimento. Ele também lamentou as condições de
trabalho dos maquinistas e os riscos para eles e para a sociedade.
"Não fica bem para a empresa deixar um rastro de mortes",
advertiu.
O advogado do sindicato dos ferroviários, Sávio
Cornélio, disse que já foi aberta uma ação contra a empresa visando
acabar com o sistema de monocondução, mas que ainda precisa ser
feita nova perícia para constatar o risco apontado pelas
denúncias.
Presenças - Deputados
Duarte Bechir (PMN) e Padre João (PT). Também compareceu o
presidente do Sindicato dos Ferroviários de Conselheiro Lafaiete,
Carlos Antônio Vitoretti.
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