Parentes de vítimas de maníaco denunciam falhas nas investigações

A necessidade de estrutura e de pessoal suficientes para garantir a agilidade e a qualidade das investigações dos cri...

23/02/2010 - 00:01
Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais
 

Parentes de vítimas de maníaco denunciam falhas nas investigações

A necessidade de estrutura e de pessoal suficientes para garantir a agilidade e a qualidade das investigações dos crimes contra a mulher foi defendida em audiência pública da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais nesta terça-feira (23/2/10). Na reunião, solicitada pelo deputado Ruy Muniz (DEM), familiares de mulheres assassinadas na Região Metropolitana de Belo Horizonte por um suposto maníaco sexual se queixaram da precariedade do atendimento feito pelo 190, da demora das investigações e de falhas nas perícias. O autor do requerimento defendeu o aparelhamento das polícias para que as leis possam ser cumpridas. "É preciso que a lei saia do papel e vire proteção", afirmou.

Os parentes das vítimas acreditam que as jovens poderiam ter sido salvas se a polícia tivesse agido logo que o número de emergência da polícia foi acionado. No entanto, os familiares afirmaram que foram orientados a aguardar 24 horas para registrarem a denúncia de desaparecimento. Maria da Glória Cordeiro de Oliveira, mãe de Edna, morta em novembro do ano passado, contou que fez o primeiro contato com o 190 às 21 horas, pedindo que a placa do carro da filha fosse divulgada às viaturas policiais. O pedido não foi atendido e o carro de Edna foi multado na Via Expressa por excesso de velocidade à 1h40, reforçando a ideia de Maria da Glória de que o sofrimento da família poderia ter sido minimizado. "Para a polícia, 24 horas pode ser pouco, mas para as famílias é muito", comparou Edilene Maria de Paiva, tia de outra vítima, Natália Cristina de Almeida Paiva.

Edilene acredita que o caso da sobrinha poderia ter sido solucionado no dia 29 de outubro e evitado a morte de Edna Cordeiro de Oliveira no mês seguinte. Segundo ela relatou, a família ligava todos os dias para o Instituto Médico Legal (IML) procurando pela jovem e não foi informada da chegada do corpo de Natália, que foi registrado como "sexo indeterminado". A vítima foi enterrada como indigente em Ribeirão das Neves e três meses depois, a família foi chamada para fazer o reconhecimento das roupas encontradas pela polícia, por meio de fotos tiradas no IML. A exumação do corpo sepultado em Neves confirmou a morte de Natália. "O acesso das famílias ao IML só pode ser feito por telefone, e não fomos informados de que havia um corpo de mulher lá", denunciou Naiara de Almeida Paiva, irmã de Natália. "Nosso sofrimento poderia ter sido menor", avaliou.

A falta de integração dos órgãos de investigação também foi denunciada pelo irmão de Edna, Éder Cordeiro de Oliveira. Segundo ele, a polícia de Belo Horizonte já estava investigando o maníaco e a polícia de Contagem não sabia. Muito indignada, Cleuza Luiza de Matos, mãe de Laila, morta em 1999, falou da semelhança dos crimes que estão ocorrendo no bairro Industrial, em Contagem, com os que ocorreram naquela época. "Precisamos de leis mais rígidas", desabafou, lembrando que o suspeito do assassinato de sua filha foi inocentado nos tribunais. "As leis beneficiam os bandidos", protestou.

Acúmulo de processos - O juiz da 13ª Vara Criminal, Relbert Chinaider Verly, pediu que a sociedade se mobilize para reivindicar mais estrutura para o Judiciário. Ele afirmou que as duas varas de Belo Horizonte especializadas em crimes contra a mulher acumulam 28 mil processos sob a responsabilidade de um juiz e nove funcionários em cada. O juiz explicou que tenta dar prioridade aos casos mais graves, mas que no caso da cabeleireira Maria Islaine de Morais, morta pelo ex-marido no início do ano em Belo Horizonte, faltavam elementos ao processo que orientassem para a seriedade das ameaças recebidas.

Relbert Verly criticou a cobertura sensacionalista que a imprensa fez do caso, noticiando que havia nove ocorrências e que nada havia sido feito. O juiz verificou que não havia inquérito, e sim quatro medidas protetivas e quatro boletins de ocorrência sem ameaças graves. O juiz manifestou preocupação com a postura de descrédito das pessoas com a Lei Maria da Penha. "A lei é uma conquista, e as mulheres podem e devem acreditar nela", defendeu.

A defensora pública Junia Carvalho elogiou a legislação brasileira, mas ponderou que a estrutura do Judiciário e de suas ramificações tornou-se insuficiente para atender as demandas da Lei Maria da Penha. "O sistema está na sua capacidade máxima de atendimento, e muitos processos se encontram parados", explicou. Ela frisou ainda a falta de casas de passagem para abrigar as mulheres que precisam deixar suas residências em função de ameaças. Junia cobrou ainda do Estado melhores condições para a realização do trabalho de proteção às vítimas de crimes.

Investigadores afirmam que falhas serão verificadas

O chefe da Assessoria Institucional da Polícia Militar, coronel Alexandre Salles Cordeiro, garantiu que não há a recomendação de espera de 24 horas para registrar ocorrências de desaparecimento. Ele informou que são registrados 18 mil telefonemas para o 190 por dia e que as gravações das conversas dos dias do desaparecimento das mulheres do bairro Industrial estão sendo rastreadas para verificação. O coronel Salles também apresentou dados que demonstram o número de ocorrências de pessoas desaparecidas registradas antes das 24 horas. Segundo ele, foram 2.028 em 2007; 6.004 em 2008 e 7.034 em 2009.

No mesmo sentido, o chefe do Departamento de Investigação, Orientação e Proteção à Família, delegado Wellington Péres Barbosa, disse que as falhas nas investigações estão sendo apuradas pela Corregedoria Geral de Polícia. O delegado defendeu que os órgãos de segurança trabalhem de forma integrada, nos moldes do que já ocorre em relação ao menor infrator. O deputado João Leite (PSDB) também defendeu a ideia dos centros integrados de atendimento à mulher vítima de violência (CIM), que acredita que permitiria a aplicação de medidas protetivas às mulheres de forma mais rápida.

Para o delegado Wellington Péres Barbosa, também é necessário o aumento do quadro de pessoal da polícia, que é o mesmo desde 1969. Ele acredita, ainda, que não são necessárias leis mais severas, e sim a aplicação das já existentes. A deputada federal Jô Moraes (PCdoB-MG) lembrou que a revisão do Código Penal está tramitando no Congresso e concordou que falta a aplicação das leis e medidas de prevenção. "O sentimento que temos hoje é de impotência diante da situação", lamentou.

A falta de comunicação entre o IML, a Delegacia de Homicídios de Ribeirão das Neves e o Departamento de Investigação de Homicídios e Proteção à Pessoa no caso de Natália foi reconhecida pelo chefe desse departamento, delegado Edson Moreira da Silva. Ele defendeu o sigilo das investigações para evitar o pânico da população e não prejudicar os trabalhos policiais.

O deputado Célio Moreira (PSDB) também criticou as falhas ocorridas nas investigações dos assassinatos em série e ressaltou que quase todas as famílias alegaram ter sido orientadas a esperar 24 horas para denunciar os desaparecimentos. "Se tivesse havido mais agilidade, as mortes poderiam ter sido evitadas", avaliou. Para ele, é preciso cobrar do governador e do comando da polícia a expulsão dos maus policiais de suas corporações.

A deputada Maria Tereza Lara (PT) frisou que não é possível fazer segurança pública sem a atuação dos três Poderes. Ela frisou que é importante dar estrutura aos órgãos de combate à violência e criticou os erros primários cometidos pelos órgãos que investigaram os homicídios cometidos pelo maníaco sexual. A deputada disse também ser imprescindível que os profissionais dos órgãos da segurança pública sejam treinados e estejam gabaritados desde o princípio da denúncia até o final dos trabalhos de investigação. Para o deputado Durval Ângelo (PT), o caso das mulheres vítimas do maníaco sexual deve ser analisado sem perder de vista os outros casos de desaparecimento, seja de mulheres, seja de crianças e adolescentes.

Investigações adiantadas - O procurador de Justiça André Estevão Ubaldino Pereira acredita que a Polícia Civil e o Ministério Público terão em breve uma resposta a dar à sociedade sobre os assassinatos em série. De acordo com ele, ocorreram falhas administrativas nas investigações, mas não há indícios de que tenham sido criminosas.

Reforço de pessoal - Para o deputado Carlin Moura (PCdoB), a audiência demonstrou a necessidade de urgente reforço dos quadros da Polícia Civil, como a nomeação dos candidatos excedentes do concurso realizado em 2008. Foi aprovado requerimento do deputado Sávio Souza Cruz (PMDB) nesse sentido. "O poder público precisa dar condições de trabalho para seus servidores, porque não há Estado sem servidores públicos", concluiu.

Durante a audiência foram apresentadas várias sugestões de aperfeiçoamento do atendimento de denúncias e das investigações, como a implantação de juizados e delegacias especializados nos crimes contra a mulher, e a realização de um mutirão para analisar os processos acumulados na Delegacia de Mulheres e de debates sobre aplicação da Lei Maria da Penha em cada município. Além disso, foi sugerida a adoção de sistema de digitalização das carteiras de identidade para criação de um banco de dados de impressões digitais. Várias dessas sugestões foram transformadas em requerimentos, aprovados pela comissão.

Dentre os 16 requerimentos, estão dois de audiência pública. Um deles, dos deputados João Leite, Carlin Moura e Ruy Muniz e da deputada Maria Tereza Lara, é para debater, em Prudente de Morais, a precariedade do imóvel ocupado pela Polícia Militar e a possível transferência da corporação para outro município. O segundo requerimento, dos deputados João Leite, Rômulo Veneroso (PV), Carlin Moura, Ruy Muniz e Célio Moreira e da deputada Maria Tereza Lara, é para discutir a situação do credenciamento, pelo Detran-MG, de clínicas autorizadas a realizar exames psicotécnicos e de centros de formação de condutores no Estado.

Presenças - Deputados João Leite (PSDB), presidente; deputadas Maria Tereza Lara (PT), vice; e Gláucia Brandão (PPS); e os deputados Rômulo Veneroso (PV), Tenente Lúcio (PDT), Durval Ângelo (PT), Carlin Moura (PCdoB), Ruy Muniz (PSDB), Célio Moreira (PSDB) e Weliton Prado (PT). Também participaram da audiência o chefe da Divisão de Crimes contra a Vida, delegado Wagner Pinto de Souza; o diretor de Inteligência da PM, coronel Wilson Chagas Cardoso; a chefe da Divisão Especializada da Mulher, Idoso e Deficiente da Polícia Civil, Silvana Fiorillo Rocha Resende; o diretor do Instituto de Criminalística de Belo Horizonte, Sérgio Márcio Costa Ribeiro; a presidente do Conselho Estadual da Mulher, Carmen Rocha Dias; a coordenadora municipal dos Direitos da Mulher, Márcia de Cássia Gomes; a presidente do Movimento Popular da Mulher, Maria Izabel Ramos de Siqueira; e a coordenadora de Políticas para as Mulheres de Minas Gerais, Eliana Piôla.

 

 

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