Mudanças na Receita Estadual opõem governo e
fiscais
Divergências entre fiscais e governo quanto à
constitucionalidade de mudanças feitas na estrutura da Secretaria de
Estado da Fazenda, por meio dos decretos 45.203/09 e 45.205/09,
marcaram a audiência pública sobre o assunto realizada na manhã
desta quarta-feira (2/12/09) pela Comissão de Fiscalização
Financeira e Orçamentária da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
Autor do requerimento da reunião, o deputado Antônio Júlio (PMDB)
defendeu o diálogo entre as partes ao informar ter sido procurado
por representantes dos fiscais questionando prejuízos que as novas
medidas gerariam ao Estado. Entre elas, o fechamento de postos
fiscais fixos em rodovias, com a priorização da fiscalização on
line e móvel nas rodovias, e o aumento da sonegação fiscal.
Segundo o presidente do Sindicato dos Fiscais e
Agentes Fiscais de Tributos do Estado de Minas Gerais (Sindifisco),
Matias Bakir Faria, o artigo 90 da Constituição Estadual determina
que alterações na estrutura do Estado devem ser feitas por meio de
lei, o que levou a entidade a impetrar na Justiça dois mandados de
segurança contra os decretos.
Por sua vez, o assessor especial da Subsecretaria
da Receita Estadual, Antônio Eduardo Leite, disse não ter dúvidas
quanto à legalidade dos decretos e que os mesmos passaram pelo crivo
da Advocacia Geral do Estado. O decreto 45.203/09 altera decreto
anterior, de 2003, que dispõe sobre a organização da SEF, enquanto o
decreto 45.205/09 trata da localização das superintendências
regionais da Fazenda e da classificação, abrangência e subordinação
das unidades que integram a sua estrutura orgânica complementar.
Esse decreto cria a Diretoria de Trânsito.
Fiscais temem aumento da sonegação
Além de questionar a legalidade das mudanças, o
presidente do Sindifisco apresentou documento do sindicato colocando
que medidas como a criação do Projeto Trânsito resultariam no
fechamento de 22 unidades de controle fiscal do Estado. No
entendimento do sindicato, essa nova estrutura centraliza o poder e
enfraquece a fiscalização, separando os fiscais de trânsito dos
auditores.
"Este ano a queda da arrecadação do Estado está
perto dos 2 bilhões de reais em comparação com 2008, o que não se
deve só à crise econômica, mas também ao desmonte da Secretaria da
Fazenda", criticou Matias Bakir. Ele apresentou um histórico das
mudanças feitas no sistema nos últimos anos e disse que as medidas
definidas por meio dos decretos recentes reduzem a capacidade do
Estado de combater a sonegação fiscal.
Entidades querem suspensão das medidas
O presidente eleito do Sindifisco, Lindolfo
Fernandes de Castro, defendeu a suspensão dos efeitos do decreto
para que seja um debate amplo sobre a questão. "Se o projeto for
bom, não haverá resistência". O sindicato exibiu, também, um vídeo
com imagens de postos de fiscalização que estariam desativados em
diversos municípios mineiros e de reportagem veiculada por emissora
de televisão sobre ausência de fiscais em rodovias do Estado.
A diretora administrativa da Associação dos
Funcionários Fiscais do Estado de Minas Gerais, Maria Aparecida Neto
e Meloni, acrescentou que devem ser desativados todos os postos
fiscais do Anel Rodoviário em Belo Horizonte, e destacou que o
governo está agindo de forma arbitrária na questão, sem ter
consultado as entidades.
"Dezenas de agentes fiscais foram deslocados de
suas funções a partir de um estudo superficial de quem acha que o
desenvolvimento tecnológico substitui o controle real de trânsito",
alegou ela. Já o diretor da Federação Nacional do Fisco Estadual e
Distrital, Antônio Mendes Patriota, defendeu uma administração
tributária autônoma e a necessidade de fiscais em trânsito.
Já o presidente do Sindicato dos Técnicos em
Tributação, Fiscalização e Arrecadação do Estado de Minas Gerais
(Sinffaz), Paulo César Maques da Silva, destacou que serão abertas
12 delegacias de trânsito e fechados 15 postos fixos, e muitos dos
servidores que hoje trabalham em regime de plantão serão remanejados
para jornada de 40 horas semanais. Ele sugeriu, como forma de
economia, o aproveitamento da estrutura das unidades desativadas
para abrigar centrais de carga que seriam construídas pelo
Estado.
Representante da Receita rebate críticas
O diretor de Fiscalização da Subsecretaria da
Receita Estadual, Gilberto Silva Ramos, argumentou que as mudanças
em curso na Secretaria da Fazenda estão em sintonia com um movimento
nacional de revisão de procedimentos de fiscalização visando à
adoção de postos virtuais e à padronização do fluxo de informações.
Segundo ele, a administração tributária é um processo complexo,
sendo a modernização da Receita um dos projetos estruturadores do
governo. Atender bem o contribuinte e coibir a sonegação são os
objetivos maiores e, segundo ele, Minas é referência nacional desde
1975, quando implantou o 1º Plano Global de Fiscalização. "Desde
então buscamos alternativas para a autonomia e melhoria da Receita
Estadual".
Gilberto Ramos fez uma exposição do controle fiscal
do trânsito de mercadorias idealizado em Minas, destacando se tratar
de um novo conceito em implantação no Estado, a partir do Auditor
Web, um sistema criado pela Fazenda de Minas e segundo ele
referência para outros 24 Estados. Ao contrário dos representantes
dos fiscais, segundo os quais a ampliação da malha rodoviária exige
postos fixos, o representante da Fazenda frisou que a malha extensa
exige quebrar a rigidez tradicional para que sejam desenvolvidas
operações estratégicas hoje dificultadas em função de um modelo
estático.
O diretor da Subsecretaria da Receita argumentou
ainda que outros Estados agiram na mesma direção, tendo São Paulo
desativado postos há 15 anos, medida adotada pelo Paraná desde o
início do ano e pelo Espírito Santo desde o início deste semestre.
No caso de Minas, ele informou que serão investidos R$ 18 milhões na
reestruturação do setor, a serem usados na compra de 115 veículos,
dez empilhadeiras e mil notebooks, além de mobiliário, equipamentos
de segurança e outros.
Segundo Gilberto Ramos, a prioridade é o controle
da circulação nas divisas do Estado, onde será criado um cinturão de
vigilância por meio da criação de 12 delegacias fiscais de trânsito
com mobilidade de ação, com 40 unidades e 14 pontos de apoio
exclusivamente voltados para essa finalidade. Como exemplo, citou a
delegacia de Guaxupé, onde há seis postos de fiscalização que
passarão a atuar com uma estrutura menor, mas com fiscalização
volante garantida num raio de 50 quilômetros.
O representante da Receita negou que os fiscais
tenham sido excluídos do processo de mudança. Segundo ele, os dois
decretos materializam estudos que vinham sendo realizados desde
1998. "Houve uma discussão profunda nesse processo e infelizmente a
administração tem que tomar uma decisão, como fez agora e de forma
corajosa", argumentou.
As entidades insistiram no contrário, tendo o
presidente do Sindifisco informado que os cinco fiscais indicados
para representar a categoria numa comissão sobre o assunto nunca
conseguiram se reunir com representantes da SEF. Gilberto Ramos, por
sua vez, argumentou que os representantes da categoria estariam em
movimento de greve e que por isso não discutiram o assunto ao longo
deste ano. "Mas conversamos com muitos auditores, e essas mudanças
fazem parte de um projeto nacional".
Deputados defendem convergência de interesses
Após as explicações de todos os participantes da
audiência, o vice-presidente da comissão, deputado Jayro Lessa
(DEM), elogiou "a gestão inteligente do Estado no sentido de
valorizar os servidores e melhorar a arrecadação do Estado". O
deputado Lafayette de Andrada (PSDB) disse que não interessa a
ninguém diminuir a arrecadação do Estado, como citado pelos fiscais.
"Transformações que visam melhorar o sistema devem ser
experimentadas para avaliação, e a priori não podemos ser
contra", disse ele.
"Estamos todos de acordo com a modernização, mas é
preciso ter tempo para o diálogo para que essas mudanças não se
transformem numa ação experimentalista", rebateu o deputado Adelmo
Carneiro Leão (PT). Já o deputado Neider Moreira (PPS) ponderou que
toda mudança inicialmente gera uma resistência natural, mas ao final
deve prevalecer o interesse público.
Para o deputado Domingos Sávio (PSDB), o debate
revelou que a função da Assembleia, além de legislar, é também
fiscalizar a ação do Executivo. Após pedir esclarecimentos aos
representantes da Fazenda sobre a legalidade ou não dos decretos,
ele ponderou que os servidores de carreira devem ter uma transição
adequada aos novos procedimentos, de forma a equilibrar os
interesses pessoais com o interesse público. "O mundo está mudando e
exige novas metodologias", defendeu.
Presenças - Deputados Zé
Maia (PSDB), presidente; Jayro Lessa (DEM), vice; Adelmo Carneiro
Leão (PT), Antônio Júlio (PMDB), Inácio Franco (PV), Juarez Távora
(PV), Lafayette de Andrada (PSDB), Wander Borges (PSB), Domingos
Sávio (PSDB), Padre João (PT), Neider Moreira (PPS) e Weliton Prado
(PT). Também participaram da reunião Stela Maria Faria, da
Secretaria de Estado da Fazenda; Rose Laura Lopes Fagundes,
assessora da Subsecretaria da Receita Estadual; e Ângelo Márcio
Minardi de Oliveira, da Secretaria de Estado de Planejamento e
Gestão.
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