Denúncia de abuso de autoridade deixa deputados
indignados
"Hoje a sociedade está indefesa diante do arbítrio
de certos policiais". A afirmação em tom indignado foi feita nesta
quinta-feira (29/10/09) pelo presidente da Comissão de Direitos
Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, deputado Durval
Ângelo (PT), durante audiência pública para apurar a denúncia de
abuso de autoridade por parte de uma guarnição da Polícia Militar
contra um trabalhador de Contagem. A reunião foi realizada a partir
de requerimento do deputado Vanderlei Miranda (PMDB), que se disse
preocupado "com o fato de a população estar com medo daqueles que a
deveriam proteger".
A audiência contou com a presença do denunciante e
dos denunciados. O metalúrgico Paulo César Ferreira afirmou que no
dia 2/9/09, três policiais militares - o 3º sargento Wemerson Barros
Geremias, o 2º tenente Cláudio Lopes Miguel e o soldado Berlinque
Antônio Monteiro Cantelmo - invadiram sua residência às 22h40, sem
mandado de busca e apreensão, quebrando o vidro da porta da sala e
apontando uma arma de fogo contra sua cabeça. Ainda segundo
Ferreira, o soldado Cantelmo, além de fazer fortes intimidações, não
portava sua tarja de identificação, sendo chamado pelos demais de
"Pedrão".
O motivo para a invasão, segundo o metalúrgico,
teria sido uma série de denúncias anônimas, entre elas as de que ele
seria um traficante foragido e que seu veículo era roubado. Mesmo
após apresentar toda a sua documentação e a do carro, os policiais
não se convenceram e o encaminharam à delegacia em Betim, juntamente
com o veículo. Lá, ficou constatado que as denúncias eram falsas e
Ferreira foi liberado.
O metalúrgico afirmou, porém, que por vários dias
policiais militares rondaram sua casa e chegaram a invadi-la de novo
no dia 18/9, às 2 horas da madrugada. Após pularem o muro e
espantarem o cachorro, os militares o teriam ameaçado, dizendo:
"Você é o rapaz que está falando demais". Muito emocionado, Ferreira
contou que está morando de favor em outro local, que está com medo
de voltar para casa e que sua filha, de três anos, está
traumatizada, pois presenciou a primeira invasão, juntamente com a
esposa do trabalhador.
Policiais dizem que agiram dentro da
legalidade
Os policiais acusados negaram que agiram com
truculência e que houvesse alguém sem identificação na operação.
Eles alegaram que atuaram a partir de informações passadas pelo
Sistema Integrado de Defesa Social (Sids), e que, na rua, não têm
condições de verificar se essas informações são equivocadas.
O advogado dos PMs, Sílvio Carlos Monteiro,
confirmou que a guarnição policial recebeu a informação de que Paulo
César Ferreira seria estuprador, traficante de drogas e ladrão de
veículos. Mesmo reconhecendo que o trabalhador foi agredido
moralmente, Monteiro questionou: "Como exigir dos policiais uma ação
diferente naquele momento?". Para ele, a continuidade das visitas à
residência do metalúrgico é uma conduta que, caso tenha caráter
intimidatório, deve ser punida.
Quanto ao fato de o veículo de Paulo César estar
registrado no sistema do Detran como "roubado ou furtado", o tenente
coronel, PM Antônio Leandro Bettoni, comandante do 33º Batalhão da
PMMG/Betim, alegou uma possível falha no sistema para justificar a
informação equivocada que chegou aos policiais. O deputado Sargento
Rodrigues (PDT) concordou com essa versão.
Bettoni informou ainda que, após a primeira invasão
à casa de Paulo César, chegaram outras denúncias anônimas o acusando
de estar envolvido em esquemas de aborto clandestino, estupro,
tráfico de drogas e porte ilegal de armas. A autoria das denúncias
falsas já foi identificada. O metalúrgico inclusive disse que já
tomou as providências judiciais cabíveis.
O deputado Vanderlei Miranda cobrou a prevalência
do bom senso, principalmente diante de denúncias anônimas. "Tenho
muito respeito pela Polícia Militar, mas não posso admitir que seus
agentes atuem como máquinas. Que ladrão seria tão burro a ponto de
guardar o carro roubado dentro de sua própria garagem? O bom senso
seria suficiente para evitar todo o constrangimento causado a Paulo
César e à sua família", argumentou.
Diante das informações obtidas na reunião, o
corregedor da PMMG, coronel Cezar Romero Machado Santos, garantiu
que todos os fatos serão apurados. Ele pediu que a comissão forneça
cópia das notas taquigráficas da reunião e solicitou ainda que Paulo
César lhe entregue reproduções das fotos tiradas pela sua esposa no
dia da invasão, que mostram a porta destruída e cortes no corpo do
metalúrgico provocados pelos estilhaços.
No final da reunião, o deputado Durval Ângelo
avisou que vai acompanhar de perto esse caso. Ele vai à casa de
Paulo César no próximo final de semana para conversar com vizinhos e
verificar se continua havendo intimidação ao metalúrgico. E alertou
que qualquer coisa que acontecer com Paulo César será atribuída aos
policiais que invadiram sua casa no dia 2/9. "É um absurdo um
trabalhador estar numa situação dessas", criticou.
Requerimentos - A comissão
aprovou sete requerimentos do deputado Durval Ângelo,
solicitando:
* que seja encaminhada ao presidente da Usiminas,
Marco Antônio Castello Branco, cópia das notas taquigráficas da
reunião realizada em 28/10/09, para tomada de providências com
vistas à liberação dos arquivos da Usiminas à comissão e ao
professor e jornalista Marcelo de Freitas Assis Rocha;
* que seja encaminhado ao presidente da Usiminas
pedido de providências para que encaminhe cópia da nota fiscal de
compra de 32 caixões da Santa Casa em Belo Horizonte, no dia 8 de
outubro de 1963, bem como relação detalhada com os nomes e dados
pessoais dos 59 trabalhadores que teriam abandonado seus empregos,
conforme comunicado da Usiminas ao Sindicato, um mês após o massacre
em Ipatinga;
* que seja encaminhada ao secretário Nacional de
Direitos Humanos cópia das notas taquigráficas da reunião realizada
em 28/10/09, para tomada de providências no sentido de incluir uma
vinheta na campanha nacional sobre desaparecidos políticos com os
nomes de Gesulino França de Souza e Fábio Rodrigues de Souza, ambos
operários baianos, desaparecidos desde o massacre de Ipatinga;
* que seja encaminhado ao ministro da Justiça
pedido de providências para a inclusão dos mortos desaparecidos no
massacre de Ipatinga na lista dos mortos e desaparecidos vitimados
pelos atos preparatórios do golpe militar de 1º de abril de
1964;
* que seja encaminhada ao presidente da Comissão
Nacional de Anistia, Paulo Abraão, exemplar do livro "Não foi por
acaso", do jornalista Marcelo de Freitas Assis Rocha, solicitando
apoio aos herdeiros de Gesulino França de Souza e Fábio Rodrigues de
Souza, desaparecidos após o massacre de Ipatinga;
* que seja encaminhada aos familiares de Gesulino
França de Souza e Fábio Rodrigues de Souza manifestação de apoio
para a inclusão dos herdeiros na lista de indenizações da Comissão
Nacional da Anistia;
* que seja realizada audiência pública com
convidados para debater a situação das religiões de matriz africana
em Minas Gerais.
Foi aprovado ainda requerimento dos deputados
Weliton Prado (PT) e Carlin Moura (PCdoB), em que solicitam a
realização de audiência pública para debater o assédio moral e a
violação dos direitos dos agentes de segurança penitenciários e
socioeducativos do Estado de Minas Gerais, contratados e
concursados, que se encontram em greve.
Presenças - Deputados
Durval Ângelo (PT), presidente; Vanderlei Miranda (PMDB), Delvito
Alves (PTB) e Sargento Rodrigues (PDT).
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