Assentados querem licença ambiental para obter
empréstimos
A demora na liberação de licenciamentos ambientais
está impedindo que produtores rurais do Projeto de Assentamento
Betinho, em Bocaiúva (Norte de Minas), tenham acesso a recursos e
financiamentos do Governo Federal. Esta foi a principal constatação
da audiência pública realizada nesta terça-feira (20/9/09) pela
Comissão de Política Agropecuária e Agroindustrial da Assembleia
Legislativa de Minas Gerais, que contou com representantes de
comunidades pertencentes ao projeto, prefeitos da região e órgãos
públicos federais e estaduais.
Os assentados reclamaram que não conseguem acessar
verbas disponíveis para melhorar as propriedades rurais porque o
Instituto Estadual de Florestas (IEF) não libera as licenças.
Técnicos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
(Incra) revelaram que já solicitaram ao órgão licenciador a
liberação, em caráter excepcional, para a construção de 156 moradias
que já têm recursos retidos para a obra. Deputados presentes à
reunião aprovaram requerimento solicitando ao instituto urgência no
pedido.
O representante do IEF, Célio Lessa Couto Júnior,
afirmou que o processo de licenciamento do projeto está paralisado
desde 2007 porque o Incra não enviou toda a documentação exigida
pela legislação ambiental. Ele disse que numa visita que fez ao
assentamento há quatro anos constatou que havia ocupação irregular
da área de reserva legal (parte que deve ser preservada) e extração
ilegal de madeira, mas admitiu que não sabe como está a situação
atualmente. O autor do requerimento da reunião, deputado Carlos
Pimenta (PDT), rebateu as argumentações. "As 766 famílias do
assentamento não podem pagar essa conta", disse, ao denunciar que há
recursos disponíveis e os produtores passam por dificuldades
financeiras por causa da burocracia.
O superintendente do Incra, Gilson de Souza,
explicou que o órgão não tem poder de polícia para retirar do local
pessoas que ocupam área de reserva legal. "Temos que seguir o
processo legal", afirmou. Segundo o técnico Gustavo Malafia, 188
assentados apresentam situações irregulares, algumas de fácil
solução e outras mais complexas.
Já foi concedido crédito para o início das
atividades a 661 produtores e construídas 300 moradias. Gustavo
Malafia explicou que as habitações são consideradas pré-requisito
para solicitar recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar (Pronaf), que já beneficiou 210 produtores,
segundo o delegado do Ministério do Desenvolvimento Agrário em Minas
Gerais, Rogério Correia.
Falta de infraestrutura é principal reclamação de
assentados
Maior projeto de assentamento de reforma agrária de
Minas Gerais, o PA Betinho é considerado exemplo para o Estado e
para o País. O prefeito de Bocaiúva, Ricardo Afonso Veloso, afirmou
que a terra é produtiva, com grande potencial hídrico e
geograficamente bem localizada, às margens da BR-135. O prefeito de
Engenheiro Navarro, Sileno Dias Lopes Silva, acrescentou que os
assentados são "ordeiros, trabalhadores e dedicados à vida no
campo", o que contribui para impedir o êxodo rural na região.
As vantagens naturais, confirmadas pelos
representantes dos assentados que participaram da audiência pública,
não suplantam, no entanto, problemas de infraestrutura que impedem
um desenvolvimento mais acelerado do projeto. O líder da comunidade
de Angico, Adir Martins, reclamou que faltam água e luz no
assentamento, além de muitas famílias ainda viverem em barracas de
lona. Segundo ele, o serviço de energia elétrica é mal executado:
lotes vazios contam com luz, enquanto algumas casas continuam às
escuras. Ele também lamentou que os recursos hídricos são
abundantes, mas não há serviço de irrigação nas propriedades. "É
preciso distribuir melhor", sugeriu. Melchior Augusto Melo, do
Incra, disse que 324 famílias contam com energia elétrica.
Marcos Antônio Gonçalves, da comunidade de
Taboquinha, completou que também faltam estradas para escoar a
produção. Afreu Godinho, da comunidade Barragem de Bambu, reclamou
sobretudo da omissão do Incra em solucionar os problemas do
assentamento. "Tem muita gente passando dificuldades e algumas
desistindo", avisou.
O presidente da Comunidade Reta Grande, José Cosme
da Silva, cobrou das autoridades presentes uma definição para
transmitir aos assentados. Segundo ele, os produtores têm dúvidas
até mesmo quanto à propriedade da terra pelo Incra. Os deputados
tranquilizaram o produtor quanto a isso, lembrando que a área foi
doada à União para que o Incra criasse o assentamento.
Para dar a dimensão da falta de estrutura no PA
Betinho, o agrônomo Túlio Lenti Trubbiano, diretor da Cooperativa de
Trabalho de Engenheiros Agrônomos - que atua no assentamento -
afirmou que cada 200 hectares de terras agricultáveis demandam um
trator. "O PA Betinho tem 16 mil hectares e nenhum trator", afirmou.
Ele sugeriu a formação de um grupo de trabalho para acompanhar as
ações no assentamento.
Deputados criticam e exigem mais atitude do
governo
O deputado Paulo Guedes lembrou que os problemas do
PA Betinho são os mesmos de outros assentamentos em Minas, fruto
sobretudo da burocracia dos órgãos ambientais, que, em sua opinião,
"têm agilidade apenas para multar".
Carlos Pimenta, que conhece o projeto, reconheceu
todos os problemas citados pelos assentados e exigiu mais
compromisso dos órgãos públicos para encontrar uma solução. A fala
do deputado veio após os representantes da Emater, Ruralminas e
Secretaria de Estado Extraordinária para o Desenvolvimento dos Vales
do Jequitinhonha e Mucuri e do Norte de Minas (Sedvan) afirmarem que
possuem projetos e programas que podem beneficiar os produtores do
PA Betinho. "Fico angustiado diante dessa situação. Precisamos ser
mais objetivos", disse o parlamentar. Ele foi endossado pelo
presidente da comissão, deputado Vanderlei Jangrossi (PP). "É
preciso apresentar soluções para os assentados", sugeriu.
Já o deputado Antônio Carlos Arantes (PSC) afirmou
que, dos 950 mil assentados no Brasil nos últimos 12 anos, mais de
500 mil perderam suas propriedades. Para ele, os dados provam que a
reforma agrária avançou no País apenas em quantidade, e não em
qualidade. "A dívida dos produtores rurais é de R$ 140 bilhões. Ele
é escravizado, porque trabalha demais e fecha no vermelho", disse.
Requerimentos - Sete
requerimentos de ofício, de autoria coletiva, foram aprovados
durante a reunião:
- à Ruralminas, solicitando a execução de obras de
melhorias das estradas;
- à Fundação Nacional de Saúde (Funasa), pedindo
rapidez na implantação do projeto de distribuição de água e
construção e perfuração de poços artesianos;
- à Sedvan, sugerindo que inclua o projeto de
assentamento para receber recursos do programa de combate à pobreza
rural do Governo do Estado;
- à Cemig, pedindo o recadastramento dos assentados
que ainda não foram atendidos pelo programa Luz para Todos, para
garantir o acesso ao benefício;
- ao IEF, pedindo empenho para solucionar as
pendências e liberar a licença para a construção das 156 casas;
- ao Incra, para que celebre convênio com a
prefeitura de Engenheiro Navarro para atender o assentamento de
Pipiri com água e outras demandas;
- à Secretaria de Meio Ambiente, para que recursos
de multas ambientais sejam investidos preferencialmente em projetos
de recuperação ambiental, sobretudo em áreas de interesse social de
municípios com menor IDH.
Presenças - Deputados
Vanderlei Jangrossi (PP), presidente; Antônio Carlos Arantes (PSC),
vice; Carlos Gomes (PT), Carlos Pimenta (PDT), Padre João (PT) e
Paulo Guedes (PT).
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